Quase 22 anos após sua morte, Pablo Escobar voltou a ficar em evidência, pelo lançamento de livros, filmes e seriados que abordam o seu reinado como um dos maiores narcotraficantes do planeta. É um personagem que, na Colômbia, ainda divide opiniões. Mesmo reconhecendo que foi um bandido, ainda há quem considere que ele ajudou os pobres e só fez o mal para quem o perseguia. Alguma semelhança com algum personagem brasileiro?
Localizado no centro histórico de Bogotá, no bairro da Candelária, o Museu da Polícia Nacional é o exemplo desta contradição em se repudiar e, ao mesmo tempo, cultuar a memória de um inimigo público número um. O prédio de quatro andares, em estilo neoclássico da década de 1920, apresenta cerca de mil objetos em 26 salas. Mas o roteiro guiado deixa, para o final, justamente o que os visitantes querem realmente ver: os objetos relativos a Pablo Escobar e companhia.
No segundo andar pode-se ver armas e uma galeria de fotos com os principais traficantes capturados e/ou mortos. Em tamanho real, um manequim representando Pablo Escobar com a mesma indumentária que usava quando foi assassinado no dia 2 de dezembro de 1993, em Medellín. Pelo casaco que também está exposto, dá para perceber que o chefão era realmente um monstro.
Além dos equipamentos de segurança, como uma curiosa maleta com um telefone vermelho, o destaque maior vai para uma Harley-Davidson folheada a prata. A motocicleta, ano 1990, foi dada pelo narcotraficante a um primo que terminou preso em uma discoteca de Medellín.
O livro Matando Pablo, lançado em 2002, narra em 261 páginas a ascensão de queda de Pablo Escobar, o líder do Cartel de Medellín que promoveu uma escalada de violência, inclusive mandando explodir um avião comercial, depois que perdeu o status de cidadão de bem. De suplente de deputado e empresário, passou a ser considerado um criminoso, responsável pelo envio das maiores cargas de cocaína para os Estados Unidos.
Após um breve período em que se entregou e passou a viver em uma confortável prisão construída por ele mesmo, Pablo continuou mandando eliminar os adversários, mas não ficaria mais impune. O governo colombiano ficou refém do dinheiro e da tecnologia ianque. Abriu mão de sua autonomia para conseguir um mínimo de estabilidade social.
Mark Bowden, que faz parte do primeiro time dos jornalistas investigativos dos Estados Unidos, merecia uma sorte melhor na edição do seu livro no Brasil. O trabalho de tradução (Maria Cristina Vida Borba) e de revisão (Walter Corrêa) é um atentado. Erros de concordância e grafias diversas de uma mesma palavra atrapalham a narrativa.
TRECHOS DO LIVRO
Pablo tinha um potente telescópio instalado na sacada que dava para Medellín, que se abria sob seus pés como um feudo pessoal, de modo que pudesse ver a esposa e os filhos em suas várias residências lá embaixo. Eles os visitavam com frequência na prisão. Uma pequena área de recreação foi construída para Manuela, com uma grande casa de brinquedo, cheia de bonecas. Em seu 42° aniversário, 1 de dezembro de 1991, fizeram uma festa. A mãe lhe deu dois chapéus de pele russos; Pablo anunciou que dali por diante seriam sua marca registrada. Assim como Che Guevara usava uma boina e conhecia-se Fidel Castro por causa de sua barba e charutos, Pablo seria reconhecido pelos grandes chapéus russos. A família e os amigos jantaram peru recheado, caviar, salmão fresco, truta defumada e salada de batata. Pablo posou para fotografias na mesa com Maria Victoria e os dois filhos, com a mãe orgulhosa em pé atrás deles.
Não era uma prisão normal em outros sentidos, também. Pablo, por exemplo, não se sentia obrigado a permanecer lá de fato. Raramente perdia um jogo importante de futebol em Medellín; a própria polícia bloqueava o trânsito para facilitar o acesso da comitiva de Pablo na ida e volta do estádio que ele havia construído anos antes. Também foi visto fazendo compras de Natal em um shopping center da moda em Bogotá. Em junho de 1992, festejou o primeiro aniversário de sua prisão com seus amigos e com a família em um clube noturno de Envigado. Para Pablo, essas excursões eram uma trivialidade… afinal, ele sempre voltava. Havia feito um acordo com o governo e pretendia honrá-lo, mesmo pregando peças em seus carcereiros, de vez em quando.
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Uma semana depois da fuga de Pablo, uma corte colombiana rejeitou o apelo de seus advogados para considerar a fuga como uma ação legítima, tomada por ele temer por sua vida. Não havia como consertar as coisas. O confortável acordo de Pablo havia ruído por completo.
Pablo estava novamente em fuga, mas desta vez a caçada seria feita com total cooperação dos Estados Unidos. Durante os seis meses seguintes, a equipe da operação americana secreta na Colômbia iria crescer para quase cem pessoas, fazendo da embaixada de Bogotá o maior escritório da CIA no mundo.
Os homens envolvidos nessa caçada sabiam que havia só um fim possível. Ele próprio já sabia. Era algo que todos compreendiam, mas não ousavam falar. O esforço não era mais no sentido de prender Pablo. Os colombianos não tinham mais paciência para tentar levá-lo a julgamento e depois trancafiá-lo; ele já havia mostrado como tudo isso era inútil. Não podiam extraditá-lo e julgá-lo nos Estados Unidos; as balas e subornos haviam tornado a extradição legalmente impossível. Não, desta vez a caçada seria definitiva.
Quando se encontrassem, iriam executá-lo. Prática comum na América do Sul, tinha até uma expressão para denominá-la:”La Ley de Fuga”.
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