No dia 2 de setembro de 1972, o Diario de Pernambuco trouxe na sua capa a foto de um rei, mas não se tratava de um monarca qualquer. Tanto que a coroa era uma cortesia da agência de notícias United Press International (UPI), que usou os recursos gráficos da época para destacar o feito de um norte-americano de 29 anos de idade. Robert James Fischer acabava de se tornar o campeão mundial de xadrez ao vencer o soviético e ex-detentor do título Boris Spassky, de 35 anos. Em plena Guerra Fria, o tabuleiro com 64 quadrados era palco de confronto entre as duas grandes potências. tanto que houve enorme discussão a respeito das câmeras cinematográficas que gravariam os jogos. Tudo poderia ser motivo de espionagem. Com a vitória de Fischer, os Estados Unidos interrompiam 34 anos de hegemonia comunista no xadrez.
A batalha foi longa. Começou no dia 11 de julho no Palácio dos Esportes de Reykjavík, capital da Islândia, e durou 20 partidas. Spassky telefonou para avisar que não compareceria à continuação da 21ª. Com o ponto alcançado pela desistência, Fischer alcançou os 12 pontos necessários para ganhar os US$ 250 mil em disputa. O norte-americano estava dormindo quando foram dar a notícia.
O Diario informou que os observadores consideravam Fischer um gênio do xadrez, por “sua concepção de estratégia, a claridade dos planos e o estilo racional, preciso e harmonioso”. O jornal ainda resgatou o depoimento de um mestre pernambucano que conheceu o novo campeão mundial quando ele tinha 13 anos de idade. “Conheci Fischer em 1957, no Clube de Xadrez de Manhattan, Nova York. Já prometia ser um grande mestre”, lembrava Luís Tavares.
O jornal deu grande destaque ao embate entre Fischer e Spassky, considerado o “encontro do século” no xadrez. No dia 31 de agosto de 1972, o terceiro caderno do Diario, o de cultura, abriu sua capa explicando melhor aos leitores os movimentos do jogo e quem eram os dois protagonistas, ambos coincidentemente judeus. O texto de Jeannette Lima, da editoria de pesquisa, destacava que Spassky, o “preguiçoso urso branco”, gostava de se divertir com uma boa companhia feminina. Já Fischer só pensava em xadrez. Perguntado sobre sua vida amorosa, respondeu: “Garotas não fazem sentido. Os rapazes perdem um bocado de tempo com elas e gastam dinheiro. Xadrez é a única coisa que me dá prazer e me proporciona inclusive dinheiro”.
O especial também trazia curiosidades sobre a origem e evolução do jogo/esporte. Uma lenda conta que o xadrez foi inventado por Sissa, um brâmane, para seu aluno, um príncipe hindu. Em gratidão, o príncipe quis recompensar o mestre e ficou admirado quando soube que Sissa queria apenas um grão de ouro pelo primeiro quadrado do tabuleiro, dois pelo segundo, quatro pelo terceiro, e assim sucessivamente. Ao consultar os matemáticos da corte, o príncipe ficou sabendo que toda a produção de trigo da terra não seria suficiente para pagar o brâmane.