24.01Pesquisa feita com 77 adultos entre 18 e 44 anos, testados por universidade dos EUA, mostra que o ato de ajudar produz emoção positiva e melhora saúde mental.

Luce Pereira (texto)
Samuca (arte)

A Universidade de Yale (EUA) já desconfiava que a farmácia pode não ser o único caminho para a cura dos males provocados pelo estresse e passou a ter ainda mais certeza depois de uma pesquisa. O estudo, publicado na revista especializada Psychological Clinic Science, mostrou que a gentileza é capaz de trazer benefícios enormes ao organismo, promovendo bem-estar a partir da repercussão positiva de gestos simples no estado emocional e na saúde mental. São geralmente pequenas atitudes como abrir a porta para um desconhecido, oferecer carona, buscar um café para o colega de trabalho, sorrir e dizer “obrigada” que ajudam a atenuar a sobrecarga produzida pela irritação, o cansaço, a ansiedade, o nervosismo. E custam tão pouco, talvez não mais do que razoável nível de educação doméstica e uma boa dose de predisposição para se colocar no lugar do outro. Quem já não teve o semblante e o espírito desanuviados depois de receber algum tipo de ajuda, geralmente emoldurada por uma simpatia própria das pessoas solidárias?
Nesta última semana, tive mais um exemplo desta transformação. Sabe-se que a vida em edifícios não favorece as relações de amizade. Quando muito, um “bom dia” daqui, outro dali, ainda mais se não há tempo nem para frequentar as reuniões de condomínio. Há quase 30 anos no mesmo endereço, mal conheço os moradores e alguns, pela rotatividade de ocupação dos apartamentos, não passam de rostos estranhos. Atravessando dias sobrecarregados, exatamente neste eu ia apanhar o elevador – cheia de bolsas, expressão tensa – quando uma senhora de meia-idade, parecendo supor minha jornada extenuante, tomou todas as providências para eu me sentir mais confortável: segurou a porta, ajudou a colocar os pertences para dentro, apertou o número correspondente ao meu andar e lá chegando repetiu o gesto, ajudando a descarregar a bagagem. Fiquei sem palavras com a solidariedade. Despediu-se dizendo que “se cada um olhasse para quem precisa, o mundo seria outro”. Evidentemente, eu já estava mais relaxada quando entrei em casa. Senti vontade não apenas de retribuir a ajuda como de conhecer melhor a pessoa. Bem, para o estudo de Emily Ansell, da Escola de Medicina da Universidade de Yale, indivíduos com atitudes semelhantes à de Valquíria – chama-se assim, disse-me ela – tendem a ser menos estressados. Na pesquisa, o comportamento solidário foi associado a níveis mais altos de emoção positiva e de melhor saúde mental, embora os pesquisadores ainda não tenham encontrado explicação definitiva para o fenômeno. Possivelmente não haja uma, mas várias, de acordo com eles. “Talvez, ajudar outras pessoas nos distraia dos nossos próprios problemas e reduza os efeitos negativos do estresse. Pode ser, também, que funcione como uma porta aberta convidando os outros a serem gentis e essas respostas nos façam sentir melhores”, arrisca Ansell. Ela lembra que estudos em laboratórios já demonstraram a existência de reações biológicas produzidas a partir de uma relação harmoniosa com os demais.
A conclusão do estudo de Emily Ansell me fez voltar no tempo, até o dia da prova de redação do vestibular. Eu era o nervosismo em pessoa, torcia por um tema subjetivo, que me permitisse o uso de uma linguagem mais suave e pessoal. Só sei que ao abrir o envelope lá estava: “Como é bom ser bom”. O universo conspirava a favor.