Quem circula hoje pelas ruas em torno do mercado de São José pode pensar que o histórico bairro do Recife se tornou uma espécie de Chinatown. É visível a presença cada vez maior de comerciantes vindos do país que hoje é uma potência industrial e que abastece de produtos baratos os nossos mascates. Em 24 de maio do ano passado, o repórter Wagner Oliveira traduziu esta realidade em duas páginas do Diario de Pernambuco. Pela sua localização estratégica e, mais recentemente, pelo Porto de Suape, o estado entrou de vez no mapa das tríades, as organizações criminosas asiáticas que controlam as ações de compatriotas ao redor do mundo.

A presença dos chineses em Pernambuco vem de longe. Em 1887, o jornal publicou relatório do então presidente da província, Pedro Vicente de Azevedo, defendendo a importação de colonos de outros países. Ele criticava os proprietários de terras de não querer contratar estrangeiros, entre eles os chineses, “por falsos preconceitos”.

Os chineses começaram a chegar de forma efetiva no Pernambuco no início na década de 1920, a partir da Guiana inglesa. Cinquenta anos depois, nos anos 1970, foi a vez de imigrantes de Taiwan. Nas três últimas décadas, chineses vindos da tríplice fronteira – Brasil, Argentina e Paraguai – chegaram ao Recife para expandir seus negócios, ajudados pela consolidação de Suape.

No dia 12 de fevereiro de 1936, o Diario de Pernambuco trouxe uma reportagem a respeito das atividades dos chineses no Recife. A colônia então era formada por 103 homens, que trabalhavam em lavanderias, mercearias e “mosqueiros”. O texto não é assinado, mas o repórter aparece em uma das fotos, de chapéu, conferindo as revistas apresentadas por um dono de mercearia no Pátio de São Pedro, Leon Kerrô.

Há 80 anos, a presença chinesa no Recife começou a ser notada por causa da proliferação de lavanderias, que usavam gasolina e sabão para tirar nódoas em grandes tachos. Engomadeiras pernambucanas eram contratadas para completar o serviço.

Mas os chineses também se aventuravam na área de restaurantes populares, os “mosqueiros”. O texto destaca o café Radiant e o restaurante Nankin como os mais frequentados. O último era inclusive citado com frequência nas páginas policiais.

A reportagem encontrou dois vendedores de “tistchói”, as miçangas, hoje a principal atividade dos novos patrícios. Antes cidadãos da Celeste República, agora os chineses do século 21 em Pernambuco pertencem a um país comunista que não exporta apenas produtos, mas gente para vendê-los também. Em comum entre as duas gerações, o fato de viverem em separado, com pouca prática da língua portuguesa e desconfiança em relação a quem pergunta demais. Para quem vem da terra de Confúcio, o silêncio vale ouro…