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Berlim, 1936. O corredor norte-americano Marty Glickman é informado que não disputará a prova do revezamento de 4 por 100 metros. Seu colega Sam Stoller recebe a mesma notícia. Por coincidência, os dois são os únicos judeus da delegação norte-americana na Olimpíada que os nazistas organizaram com tanto esmero. A alegação oficial do chefe da delegação Avery Brundage é de que os alemães iriam com tudo em busca do ouro. Jesse Owens e Ralph Metcalfe entraram no lugar de Glickman e Stoller. Foram campeões e os alemães chegaram apenas em quarto lugar. O comitê olímpico dos Estados Unidos nunca admitiu que a saída dos judeus – os únicos atletas que não competiram na Alemanha – tenha sido uma “cortesia” com os anfitriões.

De volta aos Estados Unidos, Marty Glickman percebeu que não iria longe como atleta de provas de pista, beisebol e futebol americano. Para ganhar a vida, tornou-se locutor de rádio esportivo. Começava uma lenda norte-americana. Ao longo de 50 anos de carreira, Glickman migrou para a TV e transmitiu cerca de três mil jogos de basquete, mil jogos de futebol americano, corridas de cavalo e competições inusitadas.

A história de Marty Glickman e, principalmente, a criação de seus bordões que influenciariam até profissionais brasileiros – o “chuá” no basquete é um deles – é tema de um documentário lançado em 2013 pela HBO, disponível nos serviços de demanda de TV por assinatura.

Escrito, dirigido e produzido por James L. Freedman, com o apoio de Martin Scorcese, “Glickman” traça um bom panorama do cenário esportivo norte-americano – tão próximo agora de nós graças às transmissões ao vivo de cadeias como a ESPN e a Fox. Para quem gosta de jornalismo esportivo, é uma amostra de como profissionais como ele transformaram competições em entretenimento. O sucesso da NBA, da NFL e até mesmo de Wimbledon tem o tom da voz do ex-corredor que não competiu em Berlim-1936.

Quando percebeu que não conseguia mais manter a verve e nem enxergar direito os jogadores, Glickman resolveu se aposentar do microfone em 1992. Morreu em janeiro de 2001, aos 83 anos. O rapaz de 17 anos que viu Hitler de perto – um “Carlitos sem graça”, segundo ele – foi um vencedor.