11.05

Patacoadas e crimes agudizam crise política e ajudam a desconstruir autoestima dos brasileiros

Luce Pereira (texto)
Jarbas (arte)

Em meio à lama na qual foi jogada a imagem das instituições brasileiras, depois dos sucessivos escândalos políticos envolvendo os poderes Executivo e Legislativo (com respingos no Judiciário), difícil seria encontrar, intacto, um termo que faria a maior diferença nestes tempos olímpicos – orgulho nacional. Este ilustre senhor desapareceu de tal modo da vida da população que, uma vez acesa, nem mesmo a chama dos jogos terá força para trazê-lo de volta. Afinal, quando todos acreditavam já haver visto tudo, surgiram as patacoadas do presidente interino da Câmara dos Deputados, Waldir Maranhão (PP), que surpreendeu o mundo ao decidir, segunda-feira, anular o processo de impeachment de Dilma Rousseff na Casa e revogar a decisão, no início da madrugada de ontem, depois de o presidente do Senado, Renan Calheiros, fazer vistas grossas à medida. Dizendo que o gesto de Maranhão foi uma “brincadeira com a democracia”, Calheiros prosseguiu com o rito do impedimento, mantendo hoje como o dia em que os senadores vão decidir se referendam ou não o resultado da votação na Câmara, de onde o governo saiu derrotado, no dia 17 de abril.
Naturalmente, após o ato do aliado de Eduardo Cunha e representante maranhense na bancada do baixo clero, avançamos muitas posições na escala mundial de países que transformaram a política em circo e as instituições em edifícios capazes de balançar com a força de um sopro. A atabalhoada atuação somou-se às acusações de corrupção investigadas pela Operação Lava-Jato e então tornou-se praticamente impossível não lembrar que em 2005 a presidência da Mesa Diretora da Casa já havia se tornado “prato cheio” para a imprensa em função do perfil, do despreparo para o cargo e das mesmas acusações, naquela época, enfrentadas por Severino Cavalcanti. O pernambucano, também representante do baixo clero, ficou à frente dos destinos da Câmara por 217 dias e acabou renunciando depois de se ver sob suspeita de envolvimento no chamado “mensalinho”, acusado de receber propina e enriquecer de forma ilícita.
No entanto, se a passagem de Cavalcanti e Maranhão pela Mesa Diretora da Câmara deverá ser lembrada mais pelo risível das medidas do que pelas improbridades administrativas, a de Eduardo Cunha será inesquecível sob todos os pontos de vista (da pior maneira possível, claro). Então, a partir de crônica política tão recheada de tolices e de atentados contra o dinheiro e o interesse público, está na hora de o eleitor se reinventar. Ele precisa sentir que as escolhas devem acontecer a partir de reflexões e critérios rigorosos, não apenas em relação a presidentes, governadores, prefeitos e vereadores. Historicamente, deputados e senadores têm sido responsáveis por alterar sobremaneira a vida da população – e não raramente, de forma preocupante. Os reflexos das péssimas escolhas para o parlamento estão sendo, agora, sentidos por todos os brasileiros. Elas nunca foram tão abaixo da crítica e têm respondido sistemática e decisivamente pela imagem desastrosa que o país passou a ter lá fora.
Reinventar-se como brasileiro significa, também, independentemente do resultado da votação desta quarta-feira, no Senado (previsível demais, diga-se), contribuir de forma decisiva para que as instituições nacionais se recomponham no menor espaço de tempo possível. A quem interessa vê-las submersas no lamaçal em que se transformou a política? Sem credibilidade, nunca poderão defender e refletir os anseios/ necessidades do povo. O bom senso aconselha que não acreditemos nesta quarta-feira como marco de um novo tempo, pois qualquer engrenagem movida por velhos componentes o máximo que pode é produzir barulho. Mas ao menos deveríamos começar a pensar melhor sobre a quem confiamos o nosso voto.