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Retiro, Joana Bezerra, Maruim, Leite, Suassuna… Todos estes lugares no Recife já foram verdadeiramente ilhas antes de perderem seu isolamento por aterros sucessivos. Se hoje o mapa da capital pernambucana apresenta uma sequência de bairros, há 141 anos a cidade era bem diferente, com sua área maior ainda dominada por descampados, mangues e alagados.

O Recife foi uma cidade tomada das águas. Dez por cento de sua área atual são o resultado dos aterros sucessivos no estuário comum dos rios Capibaribe, Beberibe e Tejipió. Em março de 1875, a Repartição de Obras elaborou uma planta cartográfica a pedido do então presidente da província, o desembargador Henrique Pereira de Lucena. Era uma atualização da carta de 1855, que já estava superada. Foi o último mapa do Recife na época do Império.

A Planta da cidade do Recife e seus arrabaldes pode ser consultada na íntegra no site da Biblioteca Nacional (Quer vê-lo? Então clique aqui). É um documento importante e também uma curiosidade para esta e futuras gerações. O seu bairro já existia naquela época?

O mapa de 1875 já apresentava como o Recife dirigia o seu crescimento para o interior, seguindo o curso dos rios Capibaribe, Beberibe e Tejipió. Subordinados a eles estava uma malha de outros rios menores (Jiquiá, Morno, Jordão, Pina) e riachos (Mirueira, Dondon), córregos (Euclides, Abacaxi) e canais (Derby-Tacaruna, Cavouco, Caiara, Setúbal), totalizando 66 canais numa extensão de 90 km. As águas foram cercadas, mas não dominadas.

É neste contexto aquático que se pode ver com clareza as ilhas que hoje têm apenas estes nomes na localização. A de Joana Bezerra foi grafada como “Anna Bizerra”. Vale lembrar que o Recife, originalmente, foi constituído por três ilhas: a do Recife, a de Santo Antônio e a da Boa Vista, interligadas por pontes e que formaram a Cidade Maurícia.

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UNIDADES GEOLÓGICAS E AMBIENTES DE DEPOSIÇÃO DO RECIFE

O início do aterro de mangues e alagados do Recife remonta à época do domínio holandês. A maior concentração urbana se localizava nas margens do Rio Capibaribe. A cidade foi crescendo incorporando mangues, alagados e o próprio leito.

As ilhas fluviais foram “engolidas” neste processo. Na “Planta da Cidade do Recife e seus Arredores” do ano de 1932, a Ilha do Retiro já havia desaparecido como acidente geográfico. A Ilha do Maruim ainda resistia, retratada como uma grande área de mangue. Mas não por muitas décadas.

Segundo o engenheiro Jaime de Azevedo Gusmão Filho, autor do livro “Fundações do conhecimento geológico à prática da engenharia” (editora da UFPE, 2002), ao longo de quase 400 anos o solo criado no Recife tomado às águas, entre mangues e alagados, atingiu 19 km2, o que representa 17,5% da área de planície e 9,1% da área da cidade. Foram mobilizados 25 milhões de metros cúbicos de aterro. A data inicial de intervenção humana na paisagem foi estipulada em 1631.

“Tão ampla foi esta intervenção no seu meio físico, que a cidade tem hoje a drenagem sufocada e em muitos pontos afunda sob o peso dos aterros”, afirma o professor. Hoje, quando chove, a população de uma cidade praticamente inteira é que fica ilhada. Quem ganhou com o progresso?