17.05

Levantamento mostra impacto das demissões entre categorias dos profissionais de nível superior.

Vandeck Santiago (texto)
Gabriel Jabur/ Agência Brasília

O jornalista Adeilton Che Oliveira, do Rio de Janeiro, foi um dos vencedores do Prêmio Tim Lopes de Jornalismo Investigativo em 2008. Trabalhou em praticamente todas as emissoras de televisão do país, incluindo Globo e Record, como repórter ou chefe de reportagem. Semana passada, desempregado, ele comunicou numa rede social que voltara a ser motorista de táxi, “como nos tempos de estágio”. Adeilton tem 41 anos.
A história dele é uma, entre tantas, reveladora da profundidade do desemprego no país. Não é algo específico do jornalismo. Puxem pela memória e vocês hão de lembrar-se de já ter ouvido alguma história semelhante, nos últimos meses. No ambiente em que eu convivo, majoritariamente de classe média, são numerosos os relatos sobre profissionais de diversas áreas que estão desempregados, sobretudo engenheiros. Um levantamento exclusivo divulgado pelo jornal Estado de S. Paulo mostra que a demissão de trabalhadores com curso superior tem sido maior que entre aqueles com menor nível de instrução. De março de 2015 a março de 2016, o total de demissões entre esses profissionais teve um aumento de 10,8%, conforme o estudo. O percentual equivale a pouco mais de um milhão de demitidos.
Quem lidera o ranking são os administradores de empresas, com 26.244 demissões no ano. Depois vêm os engenheiros civis, 17.623, seguidos por advogados (10.616 demitidos) e arquitetos, 3.672. Os dados foram coletados no Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho. O levantamento levou em consideração só os empregados que tiveram o contrato rescindido ou foram demitidos sem justa causa. Não entraram aí os desligamentos provocados pela migração dos trabalhadores de uma para outra empresa, que normalmente são voluntários.
“Quem está mantendo a contratação é o emprego de baixa qualificação. As demissões estão direcionadas ainda para pessoas mais qualificadas”, disse o economista responsável pelo trabalho, Fábio Bentes, da Divisão Econômica da CNC (Confederação Nacional de Comércio, Bens e Serviços). As causas dessa enxurrada de demissões são a falta de investimentos e o fechamento de várias empresas. Segundo o coordenador da Pesquisa Mensal de Serviços do IBGE, Roberto Saldanha, quem estava prevendo novos projetos, decidiu adiá-los, e os que estavam em funcionamento, foram congelados. Lá na ponta, o efeito recai sobre os engenheiros, administradores… “Os serviços técnico-profissionais, que são os mais qualificados, dependem muito das decisões de investimentos das empresas e do governo. Os serviços de engenharia têm sido os mais afetados, os que dependem de projetos, principalmente no setor de óleo e gás”, afirma Saldanha.
As informações são corroboradas por Raphael Falcão, diretor da multinacional de recrutamento Hays. “Até 2012 houve um boom na contratação de engenheiros”, afirmou ele, em entrevista à BBC Brasil (“No Brasil da recessão, aumenta desemprego entre engenheiros e sobram vagas para diaristas”, 03/03/16). Com o aumento da procura, novos cursos de engenharia foram criados ou ampliados. “Hoje, porém, você vê bons engenheiros desempregados ou novos engenheiros com uma formação sólida sem conseguir uma oportunidade. A questão é que, muitas vezes, se o projeto termina, todos acabam demitidos”, disse ele. Em relação aos engenheiros, há uma luz no fim do túnel, conforme destaca Raphael: eles estão entre os primeiros a serem atingidos quando a economia cai, mas também são os primeiros quando a economia se recupera.
Segundo o IBGE, o PIB do Brasil sofreu uma retração de 3,8% no ano passado. Hoje nós temos mais de 11 milhões de desempregados, de todos os níveis. Enquanto a economia não se recupera, o que fazem estas pessoas? Aceitam os serviços que aparecem. No caso dos profissionais mais qualificados, uma parte deles migra para outras áreas e funções, em que não se exige alto nível de instrução. Sofrem, todos, queda no nível de renda. Tornam-se parte de uma cruel realidade, que é dolorosa e incômoda principalmente para eles, mas também para seus conhecidos, amigos e familiares.