Em Foco 03.06

Museu romeno retrata subornos com humor, enquanto Suécia e Holanda dão show em segurança.

Luce Pereira (texto)
Arte/DP (ilustração)

Os maltratados ouvidos da população brasileira já não aguentam mais tanta notícia sobre casos de corrupção envolvendo políticos e gente ligada a eles, porque nunca foi tão largo o mar de lama que a Operação Lava-Jato revolve todos os dias. No entanto, reagimos a esta “enfermidade” de maneira completamente diferente dos romenos, que elegeram o humor como forma de reflexão e criaram um museu onde pinturas sobre paredes digitais mostram episódios escandalosos envolvendo o dinheiro público. Um dos mais rumorosos que visitantes podem ver traduzido em quadro é o que ficou conhecido como “propinas do cemitério” e refere-se à acusação feita ao ex-ministro das Finanças Darius Valvoc de haver recebido malas de dinheiro num lugar assim. Até agora, a Justiça não se pronunciou a respeito. Se algum canal de tv do país acompanhar a situação política do Brasil, há alguns anos, os romenos podem até considerar que merecemos museu muito mais amplo, porque, inclusive, já protagonizamos cenas de criatividade explícita quanto à escolha do local para esconder propinas rechonchudas. Cuecas, entre eles.
Imaginando que diante de tamanha inventividade dos corruptores o visitante pudesse ficar confuso sobre se o fato seria verdadeiro ou não, os donos da ideia sugerem engraçado teste onde o candidato tem que buscar descobrir a resposta. Ela é sim, por exemplo, para a pergunta “policiais romenos já foram subornados com itens como peixe,whisky e ovelhas?”. O pequeno e cômico quiz, criado com o objetivo de fortalecer a interatividade com o público, só não é mais espirituoso do que a resposta dos donos do projeto – a agência de marketing digital Kinecto Isobar – para justificar a criação dele: a classe política romena conseguiu “elevar a corrupção ao nível de arte”. Eles dizem que as propinas, embora pareçam saídas da cabeça de publicitários, são parte da vida pública na Romênia, que no ranking da ONG Transparência Internacional ocupa a 58ª posição entre os 168 países pesquisados, enquanto o Brasil, a 76ª.
Se por esta via nos identificamos de cima a baixo com os romenos, com suecos e holandeses, nem de longe, sobretudo no tratamento dispensado pelas duas nações à questão da segurança. Sonho distante do lado de baixo do Equador, ela vem funcionando como uma propaganda e tanto do nível de organização e progresso nos dois países. Até 2009, a Holanda se via necessitando de mais celas, porém, depois disso, passou a investir em políticas para o sistema prisional e, em 2012, já estava fechando oito prisões por falta de clientela suficiente. Uma delas, inclusive, já se transformou em hotel de luxo. Agora é a vez da Suécia, que está caminhando para dar adeus a quatro – dois imóveis serão vendidos e dois, emprestados. Neste caso, além da diminuição da criminalidade pesou uma revisão judicial com ênfase nas penas alternativas.
Na contramão da feliz realidade vivida pelos dois países europeus, o Brasil enfrenta perspectivas ainda mais sombrias, num cenário de sete anos à frente. No fim de 2015, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) lançou o seu estudo Violência e segurança pública em 2023: cenários exploratórios e planejamento prospectivo, onde concluiu que a criminalidade vai continuar crescendo e com ela, a população carcerária e o tráfico de drogas. Falta estímulo à reforma das polícias e do sistema penal. Além do mais, com os barcos da política e da economia navegando em mares tão turbulentos, as desigualdades se acentuam e os ânimos se exaltam. Ruim é saber que temos material suficiente para abrir um museu nos moldes daquele que faz sucesso entre os romenos e nem mesmo entradas para o show dado por suecos e holandeses.