Essa é a história do como crianças com câncer têm sido abraçadas por projetos de incentivo à leitura
Silvia Bessa (texto)
Brenda Alcantara/Esp.DP (foto)
Sempre é de se surpreender como a força de um conjunto de pessoas unidas, guiadas por uma boa ideia, pode ajudar na transformação da realidade do outro. Assim, do nada, como se fosse parte de uma contação, crianças frágeis, combalidas pelo tratamento de um câncer, são cercadas por mais de mil e duzentos livros de literatura infantil. Correm para aqui e acolá num corredor de um ambulatório hospitalar, enquanto dão uma olhadela em ilustrações fantasticamente coloridas. Vão sonhando por frações de minutos antes da próxima injeção…Aqui a história real:
Alunos dos cursos de Administração e Ciências Contábeis da Universidade Federal de Pernambuco precisavam realizar um trabalho acadêmico. Pensaram em fundar uma biblioteca para atender pequenos pacientes do Grupo de Ajuda à Criança com Câncer (GAC-PE) vinculado ao Centro de Oncohematologia Pediátrica do Oswaldro Cruz. Em um mês, buscaram editoras e amigos e reuniram centenas de títulos. “Queríamos estimular o hábito pela leitura”. explicou Paulo Ricardo Ferreira, um dos mentores do projeto “Era uma vez”. Os estudantes encontraram respaldo de uma instituição que é focada na humanização do atendimento.
Simples assim: desde o dia 13 deste mês, a biblioteca está aberta. Cerca de 80 crianças que circulam pelo ambulatório podem usar o conteúdo disposto em caixotes modestos perto do balcão de entrada do ambulatório, localizado dentro do hospital, no bairro de Santo Amaro, Recife. E para que pompa? Dentro de mais alguns dias, também como parte do projeto, os meninos contarão ainda com voluntários que se capacitaram e se tornarão contadores de histórias e que animarão manhãs lúdicas. Iniciativa barata, articulada e produtiva. “Queremos agora ampliar e fazer a biblioteca itinerante para atender também as crianças que ficam internadas”, avisa a gerente de desenvolvimento institucional do GAC-PE, Carolina de Paiva.
Lá no mesmo ambiente se observa outro exemplo de projetos funcionais, nesse caso implementado pelo poder público. Há um ano, funciona a primeira classe hospitalar do Estado de Pernambuco, a Semear – Dra. Vera Morais. É uma sala pequena, mas bem equipada com materiais de artes plásticas e muitos livros para suprir as necessidades de quem precisa abandonar temporariamente a escola para fazer um tratamento, muitas vezes a milhares de quilômetros de casa.
A Prefeitura do Recife disponibilizou uma profissional para lecionar in loco. Cristiane Pedrosa, capacitada em pedagogia hospitalar, foi a professora eleita. Atende seis, oito, dez crianças por expediente, a depender das condições de saúde de cada um. “Fazemos contato com a escola. Se quiserem mandar os livros, usamos. Aplicamos provas, caso necessário. Do contrário, seguimos o currículo do Recife e depois mandamos relatório”, explica ela, atual professora de Anderson Alves dos Santos, de sete anos. Morador de Arcoverde, Sertão de Pernambuco, está no Recife há cinco meses em tratamento, acompanhado pelo pai, Clécio da Silva dos Santos. “É bom porque ocupa o tempo dele e ajuda nos estudos”, comemora.
As notícias que circulam nos corredores do Grupo de Apoio à Criança com Câncer são de que há crianças que, após os encontros casuais e cheios de carinho dentro dos ambulatórios, voltam à sala de aula. Outros que conseguiram concluir o ano letivo. Bastaria. Ao meu ver, tanto a biblioteca infantil quanto a classe escolar dentro do hospital representam mais: são um ponto e vírgula, uma página nova para meninos e meninas que são vistos como personagens de histórias com fim precoce.