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Com a crise, viajantes poderiam escolher destinos próximos, porém lugares não oferecem infraestrutura

Luce Pereira (texto)
Karina Morais (foto)

Belo relevo, água, tranquilidade, ar puro – receita que qualquer viajante farto das agruras das grandes cidades gostaria de encontrar, ainda mais se combinada com preços de comida, bebida e hospedagem baratos. Poderia ser este o cenário em vários pequenos recantos do Brasil, se a atividade turística não tivesse sido transformada pelo poder público em assunto de fim de pauta. Com a trajetória de alta do dólar funcionando como um adeus às ilusões, a classe média se volta para o próprio território tentando descobrir nele encantos que justifiquem cada real investido numa viagem, mas só vê motivos para deixar as malas no armário. Eu pensava sobre isto durante o São João, olhando para a natureza exuberante de Serra dos Ventos, um distrito de Belo Jardim (Agreste), a 22 quilômetros do centro da cidade, que tem clima fresco, além de todas as belezas naturais que atraem muitos visitantes a destinos já consolidados, com as mesmas características.

Enquanto o carro percorria a precária PE 166, cheia de buracos e sem acostamento -, a paisagem formada por montanhas e verde a perder de vista lembrava que o distrito reúne todas as condições para cair nas graças de apaixonados por esportes radicais (rapel, parapente), canoagem, ciclismo e trilha, por exemplo, além de apreciadores de boa comida. Não por acaso, o pequeno povoado já sediou festival de gastronomia e poderia abrigar ateliês de artistas plásticos, pequenos empórios e unidades de artesanato, atividade que garante o sustento de muitas famílias no entorno de Belo Jardim. Bares e restaurantes bem estruturados e com vista para a Barragem de Tabocas reforçariam a vocação do distrito para se transformar em polo turístico.

Com ideias, investimentos e parcerias, Serra dos Ventos poderia seguir os passos de Serra Negra (Bezerros), que já entrou para o mapa dos destinos mais procurados do estado, sobretudo durante o inverno. No entanto, o abandono em que se encontra a estrada de acesso, a infraestrutura deficiente e o silêncio do poder público não sinalizam senão para a permanência do atraso a que lugares com paisagens de rara beleza estão condenados no Brasil. Isto num país com potencial inequívoco para transformar o turismo em seu produto mais vendável e de maior visibilidade.

O resultado é que, chegado o período de férias, a conta não fecha quando os planos incluem viagem. Ainda mais porque a crise não derrubou os preços de passagens aéreas, hospedagem, comida e bebida – muito pelo contrário. A perspectiva de viver o dolce far niente (a doçura de não fazer nada), em um pedaço qualquer de paraíso, acaba se transformando em frustração. No entanto, se o aperto não conseguiu transformar em condenação a ameaça de ficar em casa nas férias, o velho conselho segue valendo, independentemente do sobe e desce do dólar: destinos da América do Sul podem oferecer melhor relação custo/benefício do que destinos no Sul e Sudeste do Brasil, especialmente porque multiplicam-se os sites com excelentes apartamentos para locação, em todas as partes do mundo e a preços capazes de fazer o cliente nunca mais pensar em hotel.

Na última semana do ciclo junino, estive durante quatro dias em São Paulo. Poluição, frio intenso, insegurança e comércio em queda livre não foram os únicos aspectos a desaconselhar uma visita durante as férias de meio de ano. No caminho havia ainda os altos preços no setor de serviços, com direito a queixo caído na hora da conta, depois das refeições. Num restaurante apenas razoável do bairro de Pinheiros, almoçar não custa menos do que R$ 250. Situação um pouco piorada no Rio de Janeiro, onde o clima de Olimpíada faz aumentar o apetite pelo dinheiro dos turistas. Moral da história, como seria bom se os governos enxergassem o turismo como um segmento ligado à qualidade de vida da população. Lugares como Serra dos Ventos se tornariam paraísos absolutamente acessíveis e não uma prova a mais da ineficiência deles.