Há 40 anos, a escritora Clarice Lispector retornava ao Recife para um compromisso profissional de dois dias: uma série de conferências nos dias 20 e 21 de maio de 1976 sobre “Caminhos e descaminhos da ficção brasileira”, no auditório do Bandepe. Nascida em Tchetchelnik, na Ucrânia, acabou se tornando a última vez que ela esteve na capital pernambucana, seu lar dos dois meses aos doze anos de idade. Pouco mais de um ano depois, no dia 9 de setembro de 1977, Clarice falecia no Rio de Janeiro, vítima de câncer. Desaparecia a mulher que disse um “não”, quando consultada se entraria na Academia Brasileira de Letras: “Jamais aceitaria, pois sou pouco gregária. E mortal”.
Apesar de sua importância na literatura nacional, o Diario de Pernambuco não deu destaque à presença de Clarice Lispector no Recife. A matéria do seminário nem abria página e não havia foto da visitante ilustre. Também não havia nenhuma imagem de Clarice na edição que anunciou a sua morte. Dois anos depois em 24 de junho de 1979, é que a mulher de feições fortes encararia o leitor do jornal, em um artigo sobre o imaginário da sua obra.
O registro breve da passagem de Clarice pelo Recife traz um pequeno depoimento da escritora em relação à cidade. Reportando-se ao ambiente em que viveu, principalmente quando aluna do Ginásio Pernambucano, ela disse que disse que o Recife perdeu muito do seu encanto natural, paisagístico.
Em outra ocasião, ela já havia destacado que a memória deste período era nebulosa. Recordações da infância? “Tudo em mim é muito vago em matéria de memória”. Não sei separar os fatos de mim, e daí a dificuldade de qualquer precisão, quando penso no passado”. Aos dois ou três anos de idade? “Lembro-me da presença de um gato na sala, e de meu pai, diante da mesa – uma porta atrás”.
Aos seis anos de idade, Clarice Lispector foi matriculada no Grupo Escolar João Barbalho, ao lado da irmã Tânia, para a escola primária. A irmã mais velha, Elise, já cursava a Escola Normal. Depois de se transferir para o Ginásio Pernambucano, parte com a família definitivamente para o Rio de Janeiro, aos 12 anos de idade.
O imóvel onde a família Lispector morou no Recife, na esquina da Rua do Aragão com a Travessa do Veras, em frente à Praça Maciel Maciel Pinheiro, pertence à Santa Casa de Misericórdia. Sem recursos para reforma, encontra-se fechada.
Na praça, uma estátua de Clarice já mulher, não a menina que circulava por um Recife de pontes e casarões que tanto lhe encantavam. Imagens que ficaram na memória da escritora e também nos cartões-postais que pertencem atualmente à Fundação Joaquim Nabuco, dentro da coleção Josebias Bandeira. Um Recife que ficou no imaginário.