06-11

 

Urariano Mota (texto)
Paulo Paiva/DP (foto)

Como sempre, a televisão, a grande mídia, fala dos danos causados pelos protestos à sociedade. Essa informação é conhecida: em todo movimento ou greve, mostra-se o quanto a vida ficou ruim depois dos baderneiros e agitadores. Jamais se mencionam as razões que levam à desordem. Minto, mencionam, no cumprimento do papel de “mostrar o outro lado”. Mas pelo tempo exibido, pela ênfase e eloquência, o outro lado é mínimo frente aos estragos causados. Ensinava Brecht: “Do rio que tudo arrasta, diz-se que é violento. Mas ninguém chama violentas as margens que o comprimem”.
Por que os estudantes ocupam escolas e universidades? Em busca de respostas, ouço depoimentos como o de uma jovem na UFPE:
“Estamos aqui em defesa da educação pública, gratuita e de qualidade, bandeira sob a qual já se unificam milhares de institutos, universidades e escolas secundaristas, das redes federal, estadual e municipal, nos tornando um único movimento de ocupação na educação pública nacional. A PEC 241 – agora PEC 55 – ataca os direitos sociais duramente conquistados, desmonta o já precário estado de bem-estar social, impondo um regime de congelamento orçamentário da União por 20 anos”.

Ao que outros estudantes continuam:
“Estamos ocupando a universidade hoje para que amanhã ela não fique esvaziada, para que ela se encha de mais cor e que essa cor seja o povo. Sabemos que a PEC é mais um ataque à classe trabalhadora, porém cada dia de PEC vai ser um dia de barulho. Não tem arrego, ousar lutar e ousar vencer é a única alternativa aceitável.
– M., sexo masculino, 28, História

“Acho que as ocupações são um movimento não tão grande quanto o necessário diante dos cortes que a gente vem sofrendo, mas se crescer em rede, a gente consegue parar o Brasil. Com relação à organização, acho que a divisão em comissões é bastante prática e atrelado às atividades da programação, deixam a ocupação praticável.
– P., sexo feminino, 22, Geografia

“Acho que as ocupações têm contribuído bastante para a formação das e dos estudantes envolvidos por meio das discussões e principalmente do convívio diário, com as divisões de comissões, que permitem cada pessoa contribuir com seu ritmo. Estamos construindo vivências que certamente influenciarão bastante em nossas dinâmicas na universidade e na vida.
– C., pessoa trans, 21, Pedagogia

“Construir as ocupações tem sido uma experiência incrível, em todos os sentidos: político, coletivo, de formação e pessoal. Além de reunirmos forças e vermos as e os estudantes despertando mais e mais pro fazer político, vendo estudantes que até então estavam distantes e apáticas se aproximando, participando, assumindo tarefas. Uma experiência real de coisas que a gente estuda, experiência de democracia real, de construção coletiva e de luta em defesa da classe trabalhadora e dos nossos direitos.
– A., travesti, 28, Serviço Social

“Eu trabalho durante o dia e só tenho a noite livre, que é meu horário de estudo, e sempre venho para as ocupações pois acredito que não é o fato de não haver aulas que a universidade está parada. Pelo contrário, ela está mais viva do que antes. Vejo muitos debates, palestras, exibição de filmes, sempre com a construção coletiva e o entendimento que a universidade é nossa, esse espaço é nosso e a luta também é nossa. Creio que essa PEC seja algo mais nefasto dos últimos tempos para a nossa educação.
– O., sexo masculino, 31, Pedagogia”

Creio que talvez os estudantes não saibam o quanto são fundamentais à juventude que viveu sob mais feroz ditadura. Eles retomam o lugar de gerações anteriores. E o que se foi continua em nova vida pelo fio histórico da indignação. Eles nos falam que somos agentes da duração do tempo, que a nossa vida é a resistência do fugaz. Nós só vivemos enquanto resistimos. Então me vem à lembrança o poeta John Donne, citado por Hemingway na frase “por quem os sinos dobram”. Agora, podemos reinterpretá-lo: “Por quem os jovens ocupam escolas? Ocupam por todos nós, enfim”.