Casal afastado ainda na adolescência se reencontrou e, em fevereiro, completa oito anos de união
Marcionila Teixeira (texto)
Arquivo pessoal (foto)
Um hiato amoroso de 37 anos afastou Ana Carmen de seu ex-namorado, Pedro Jorge. Um dia, ele, separado, e ela, viúva, reencontraram-se. Beijaram-se na boca pela primeira vez. E, desde aquele dia, nunca mais se separaram. Juntos, nos primeiros anos da terceira idade, refletem sobre o tempo e as oportunidades a serem vividas. No próximo mês, completam oito anos dessa nova relação. “Acho que estava escrito nas estrelas”, pensa ela. Era a última fala da entrevista. E uma estrela cadente risca o céu de Ana.
A história de amor de Pedro Jorge Farias Souto Maior, 67 anos, e Ana Carmen Agra, 60, começou quando ela tinha 14 anos. Diz muito dos namoros do passado, das vigilâncias paternas sobre as filhas e da prisão na qual as mulheres terminavam encerradas. Ana morava na Paraíba e Pedro, no Recife, onde estudava. A distância entre eles era o problema instalado. Sem o namorado por perto, a liberdade escorria pelos dedos de Ana. O pai, que nem sequer permitia que o casal ficasse sozinho ou trocasse beijos, também não autorizava as saídas da filha. E ela sentia tristeza. Um dia, largou do namorado através de uma carta. Quatro anos depois, casou. Com outro. Assim ficou por 27 anos, até tornar-se viúva. No Recife, Pedro também construiu sua história. Estudou e permaneceu em um casamento por 34 anos.
Pergunto se pensaram um no outro durante os quarenta anos distantes. Ele, vez por outra, perguntava pela ex-namorada a parentes. Ela, bem, ela tinha uma tal carta com um poema enviada por um anônimo. Até perto de morrer, o marido pedia para ela recitar o tal texto. “Ele achava que Pedro tinha me enviado a carta, mas nunca confirmei isso, e eu já sabia o poema decorado de tanto ler”, lembra.
Uns tais olhos verdes pairavam nas memórias de Pedro. No dia do reencontro – marcado pelo Orkut quando ele estava com 57 anos e ela com 50 – achou a ex diferente. Era algo na estatura. Ana pensou o mesmo. No seu caso, era algo no peso. “Eu não sou ficante, sou namorante”, disparou, ansiosa, depois do beijo inesperado. “Pois eu quero você pelo resto de minha vida”, ouviu como resposta.
Desde o tal dia, Pedro procura proporcionar à companheira tudo o que gostaria de ter vivido junto a ela ainda na juventude. Escolheram, então, viajar mundo afora. Tem dado certo. “Logo depois da separação, me envolvi com muitas mulheres, mas essa vida cansa. Acho que o que mais vale na mulher não é a parte física, é a cabeça. E as ações dela são nota dez. Ela é uma criatura muito fácil de conviver”, pontua Pedro, engenheiro e piloto de avião.
Em breve, pretendem casar oficialmente. Ele agora mora na Paraíba. Anda resolvendo pendências de herança da família. Ela está no Recife, onde passou a vida de casada. “Logo quando fiquei viúva, me senti com muita liberdade e comecei a viajar. Mas depois me senti só. Como nunca fiz universidade e nem trabalhei fora porque o marido não permitia, meus amigos eram os dele, que se afastaram depois de sua morte. Hoje estou novamente feliz”, reflete.
Autora do estudo Velhice, violência e sexualidade, Guita Grin Debert, aponta que, nessa faixa etária, os encontros tendem a ser mais livres e afetuosos. Além disso, defende ela, a sexualidade não se esgota com o passar dos anos. Surge, sim, uma maior qualidade das relações. Ana e Pedro parecem ser complementares. São como um grito de “nunca é tarde”. São um símbolo das possibilidades de amor na terceira idade em uma população cada vez mais longeva. São um não ao tabu de uma velhice solitária.