25.04

 

Paralelo entre eleição francesa e situação no Brasil mostra semelhanças na política dos dois países.

Vandeck Santiago (texto)
Boris Horvat/ AFP

É possível fazer um paralelo entre as eleições presidenciais francesas e o Brasil? Sim, o resultado do primeiro turno lá mostra o avanço da candidatura de extrema-direita (que ficou em segundo lugar) e de um candidato que nunca havia disputado uma eleição, não faz parte da política tradicional francesa e que diz “não ser de esquerda nem de direita” (este ficou em primeiro lugar). O paralelo pode ser feito não só com o Brasil, mas também com outros países, porque estamos todos vivenciando fenômenos sociais e políticos que parecem movidos por uma mesma mão invisível. Os exemplos mais ostensivos são a eleição de Donald Trump nos EUA, a vitória do Brexit no Reino Unido e agora o avanço da candidata de extrema-direita Marine Le Pen para o segundo turno na França. Além de fatores de caráter local, temos uma onda de descrédito na política tradicional e um cenário em que antigas lideranças são desafiadas por novatos (não necessariamente jovens, como vimos no caso de Trump) que empunham discursos extremistas.
Os dois candidatos mais votados no primeiro turno da França foram Emmanuel Macron (foto), de centro, com 23,75% dos votos, e Marine Le Pen, de extrema-direita, com 21,53%. Em terceiro lugar ficou o candidato da direita, François Fillon, com 19,91%, seguido de perto por Jean-Luc Melénchon, da extrema-esquerda, com 19,62%. O candidato do tradicional Partido Socialista, Benoît Hamon, teve a pior votação da legenda nos últimos 48 anos, apenas 6,35%. O segundo turno será disputado em 7 de maio.
Vejamos as características dos paralelos que podem ser estabelecidos com a situação atual no Brasil:

1 – A força do novato: O candidato mais votado, Emmanuel Macron, nunca disputou uma eleição. Seu nome só começou a ser conhecido amplamente pelos franceses a partir de 2014, quando se tornou ministro da Economia do atual presidente, François Hollande (cujo governo está tão desgastado que ele nem quis concorrer à reeleição). Pediu demissão do cargo em agosto de 2016, quatro meses depois de ter criado o partido/movimento En Marche (Em Marcha). Tem 39 anos. É o favorito para o segundo turno; as primeiras pesquisas o colocam com 60% das intenções de voto. Macron se define como alguém que “não faz parte do sistema político” e que “não é de esquerda nem de direita” (soa familiar com alguém no Brasil?…). “Se Macron vencer, será uma ruptura na história política da França. Será a vitória de alguém que não pertence a nenhum partido institucionalizado e a nenhuma organização”, disse em entrevista à BBC o cientista político Martial Foucault, diretor do Centro de Pesquisas Políticas da Universidade SciencesPo de Paris. “Ele está encarnando o sentimento da mudança sem o medo do novo”, disse outro cientista político, da mesma universidade, Gaspar Estrada.

2 – Quebra da polarização entre os partidos tradicionais: a disputa presidencial francesa sempre se dava entre o partido Socialista e os Republicanos. Desta vez nenhum dos dois elegerá o presidente. O candidato dos republicanos, François Fillon, ficou em terceiro, e o dos socialistas, Benoît Hamon, ficou em um distante quinto lugar, com menos de 7% dos votos.
3 – O voto de protesto: Quando somados os votos dos dois candidatos mais à esquerda (Mélenchon) e mais à direita (Marine), o total passa de 41%. Dito de outra forma: quatro em cada dez eleitores franceses que foram às urnas optaram por alternativas radicais. Analistas citados pela BBC dizem que parte significativa dos votos de ambos foram “de protesto”.

4 – A derrocada do partido que estava no poder: Durante 36 anos os socialistas disputaram o poder na França com os conservadores. Agoram, saem como os maiores derrotado, com percentual de partido periférico e em quinto lugar. “Estamos em fase de decomposição, demolição, descontrução”, disse ontem o ex-primeiro ministro socialista Manuel Valls, afirmando que o partido precisa “se reconstruir”.

A França não é o Brasil, lá não tem palmeiras onde canta o sabiá. Mas as aves que aqui gorjeiam estão gorjeando como lá…