17.05

 

Psicólogos dizem que quando um parceiro espia escondido o telefone do outro, está na hora do ponto final.

Luce Pereira (texto)
Greg (arte)

Quanto mais cresce o número de pessoas ao redor do mundo que não consegue fugir do fascínio pelo universo virtual, mais estudos surgem tentando alertar sobre os males decorrentes da falta de limites no relacionamento com tais tecnologias. Uma dessas consequências, em especial, preocupa por ter-se tornado comum e pela proporção dos danos – a invasão de privacidade quando um dos parceiros se sente um tanto quanto inseguro e então não resiste àquela olhada no telefone do outro, ali, tão fácil de ser acessado. Basta um ou dois comandos e é possível abrir a cortina atrás da qual dormem respostas para perguntas não feitas ou mal disfarçadas, o que, no entanto, segundo cientistas e estudiosos, está longe de parecer uma boa ideia. Entre os psicólogos, há quase uma unanimidade no sentido de que quando o verbo bisbilhotar é chamado para, em tese, socorrer a convivência de um casal, chega, na verdade, com a nefasta função de pôr fim não apenas às dúvidas, mas ao relacionamento. Isto porque, se o gesto de invadir o espaço do parceiro ocorre, significa que a construção na qual o amor se apoia balança muito mais fazendo aumentar as dúvidas sobre se ela ainda pode ser saudável e equilibrada. Naturalmente, colocar ponto final em histórias a dois nunca foi tarefa fácil, pois separação dói, reforça o estigma da perda, mas o recado dos profissionais da área dos sentimentos é curto e grosso: se a outra pessoa vive vasculhando seu celular em busca de descobrir verdades que deveriam ser colocadas na mesa, sem mais subterfúgios, diga adeus e nem pense em olhar para trás.
No meio de tantos estudos saídos de universidades sérias ao redor do planeta, um andou chamando a atenção justamente por estar ligado a usuários do Facebook, uma das redes sociais mais acessadas. A conclusão da pesquisa da Universidade de Roanoke (Virgínia, EUA) foi de que as relações são afetadas pela troca de mensagens, responsáveis por causar ciúme nas mulheres, embora os homens, também, não escapem dele na hora em que as parceiras recebem emoticons, as figurinhas que expressam sentimentos e intenções diante de uma postagem. Trocando em miúdos, usuários e usuárias reagem de formas diferentes aos conteúdos e símbolos – segundo, por exemplo, pesquisa da Universidade Metropolitana de Cardiff, no Reino Unido, que teve como alvo mensagens de textos enviadas para celulares de homens e mulheres – mas o que interessa é que reagem mal.
Nesse reino, de modo geral, curiosidade incontrolável tem preço alto e difícil de ser pago exatamente porque mexe com o terreno mais minado – o dos relacionamentos. Esse tal mundo das mensagens trocadas nos celulares ou nas redes sociais acaba funcionando como um fosso a certo momento intransponível, mas, é óbvio, para casais cuja confiança deixou de ser recíproca ou de existir em nível necessário e saudável. Porém, mesmo quando o relacionamento sugere mais desencanto do que prazer, ainda assim não é admissível a ninguém extrapolar a linha de privacidade, pois isso interfere em um direito legítimo do outro. Tanto assim que também tornou-se conhecido o caso do juiz espanhol Antonio Miralles Amoróz, determinado a punir com dois anos e meio de prisão um marido cuja intenção ao invadir o celular da esposa e baixar uma foto era acusá-la, no processo de divórcio, de infidelidade conjugal. Diante de tanta violência e às voltas com crimes graves de corrupção, a Justiça brasileira parece longe de dar exemplo semelhante de intolerância a abusos dessa natureza, o que é uma pena, porque muita gente vai seguir à vontade para violar um direito importantíssimo. Certa vez, perguntaram ao ator Marlon Brando o que pensava sobre privacidade e ele respondeu: “Não se trata de merecimento, mas de requisito absoluto”. Sem dúvida.