Esta é a história da busca de uma mulher de 56 anos que é do Piauí e quer achar o elo perdido no Recife.
Silvia Bessa (texto)
Arquivo Pessoal (foto)
Alexandra nasceu gêmea de uma outra menina. Elas são filhas de uma jovem funcionária doméstica que trabalhava na residência de uma família do bairro do Espinheiro no início da década de 1960. Também netas de um avô rigoroso, que bifurcou a vida de uma família, segundo relatam: “Ou você dá as crianças para adoção ou você vai seguir a sua vida sem a minha ajuda”, teria determinado. A mãe cedeu à pressão. Doou Alexandra com apenas 10 dias de vida, sem nome, para que fosse acalentada por outros braços. Coube à patroa da mãe das gêmeas, diretora de uma escola pelo que contam, a tarefa de entregar Alexandra à dona Dulce Costa Santos – aquela que acabou por criá-la. A irmã seguiu para outro berço. Outro colo.
Alexandra Lúcia Santos tem 56 anos, reside em Teresina no Piauí, é divorciada, tem dois filhos e está prestes a ser avó. Continua pensando na sua gêmea. E na mãe e no pai de sangue. “Eu sei que a tristeza que eu sinto hoje é sinal de um vazio em mim que precisa ser preenchido”, disse ontem em entrevista por telefone. Da mãe e do pai biológicos, a única informação precisa que guarda é o nome grafado na certidão de nascimento: Antônio Paulo Santos, natural de Palmeirais (PI), e Maria José Trajano Santos. “Nunca soube nada. O que me lembro é que funcionários da mamãe Dulce me diziam que ela passava às vezes defronte ao lugar onde eu morava quando ia comprar pão para a família do trabalho dela. Só isso”. Alexandra viveu até os 12 anos no Recife. “A mamãe sempre me criou falando que eu tinha essa irmã. Que ela era grandona, maior que eu. Sabia da existência da minha irmã. Eu não sofria mas ficava guardando a esperança de vê-la um dia”.
Dona de uma boa memória, Alexandra lembra de sua infância e tem apego aos detalhes que fazem relação com a sua história familiar. Recorda de ter estudado na Escola Regina Félix, na Pequeno Príncipe e depois no Colégio Rosa Gatorno, localizado na Zona Norte do Recife, até que dona Dulce e o marido, João, se mudaram com ela, uma outra menina adotada e o filho que tiveram. “Meus pais adotivos eram maravilhosos. Ela era dona de lojas de roupas e ele comerciante aposentado. Do Recife o que lembro muito bem é que foi uma época em que eu tinha muitas boas amizades. Hoje em dia, com a internet, tenho encontrado algumas delas no Facebook e gosto muito”.
Não teve sucesso ao procurar na internet a irmã, Carmem Lúcia Nunes Lins. Já cascavilhou de todas as maneiras e nada. O nome da gêmea Alexandra descobriu quando elas tinham 26 anos – ou seja, há trinta anos. Carmem teria descoberto sua adoção nesta época. Ela tinha uma amiga para quem contou seu passado. A amiga da amiga conhecia a história parecida de Alexandra, já adulta e morando no Piauí. Um dia, Carmem ligou para Alexandra. “Foi esquisito porque eu não tinha intimidade, mas foi maravilhoso”. Ao chegarem à conclusão de que eram irmãs, veio a euforia. “Passávamos quatro horas falando ao telefone”. Alexandra estava grávida do primeiro filho, Artur, e as duas queriam muito se ver. Carmem mandou recursos financeiros para a passagem e lá veio Alexandra ao encontro do Recife e de suas lembranças. “O que recordo é que iria passar meses e passei cerca de 15 dias na casa de Carmem Lúcia, mas meu pai estava doente e eu tive de voltar para o Piauí”, diz Alexandra.
Alexandra lembra que Carmem morava em Bairro Novo, em Olinda, e então com 26 anos era professora de aulas particulares.“Acho que o nome da mãe adotiva dela era Elisa e fiquei muito feliz porque achei que ela estava bem”, diz Alexandra. Lamenta porque do encontro não ficou registro fotográfico.
O nome de Carmem Lúcia soa de forma diferente quando Alexandra o expressa. Percebe-se inclusive certa intimidade na fala, como se convivesse com a gêmea no pensamento por muitas horas na semana. Curioso. As duas gêmeas se falaram ao telefone espaçadamente até o ano de 2002. Até que um dia Alexandra ligou e o telefone da gêmea havia mudado de dono. Faz quinze anos. Mesmo apreensiva sobre o que Carmem acha de sua busca e de um reencontro duradouro, Alexandra diz que não perde a esperança. “Meu sonho é saber dela novamente. Para mim, é importante conhecer mais sobre a história de minha vida e me reaproximar de minhas raízes”.