Esta é a história de uma mulher que não espera; faz pequenas transformações no seu entorno.
Silvia Bessa (texto)
Thalyta Tavares (foto)
Avó cuidadosa que é, há uma semana a manicure Josinete ficou louca de preocupação. Soube que a neta Nayane, de apenas 13 anos, reclamava de uma dor no seio. “Foi pancada, Nayane?”. A menina respondeu que não. No toque, notou-se que havia algo diferente palpável. Jô, como Josinete é conhecida, recomendou logo, ainda que contasse com a pouca idade como atenuante: “Corram para marcar uma mastologista para ela. É urgente”. Na última quarta-feira, menos de oito dias, a médica diagnosticou: “é um nódulo”. Avaliou e pediu exames de ultrassonografia e punção. Inteirada sobre o tema, Jô – que não estava na consulta – contava aos conhecidos o seu entendimento sobre a solicitação: “a ultrassonografia servirá para medir o tamanho, a espessura e tal e a punção para ver o que tem dentro”.
O conselho pertinente dado em sua própria casa é rotina para ela. Jô é fiscal e conselheira contumaz quando se trata de dúvidas que circundam mulheres e questões relacionadas à mama. Pode-se dizer que Josinete Pereira, 50 anos, é espécie de ativista sem diploma na luta contra o câncer de mama, essa que no mês de outubro mobiliza o Brasil inteiro e veste gente e prédios institucionais de rosa. Não tem uma mulher que passe com ela meia hora e não seja envolvida pelo tema. No vai e vem de Jô, entre uma lixada de unha e a pintura de outra, ela faz soar o alerta para os cuidados femininos para com as mamas. Algumas, é preciso ressaltar, tiveram a sorte de encontrá-la e aceleraram tratamentos necessários para combater malignidade.
Aconteceu assim com Jaqueline Pimentel, cliente da manicure-ativista e que enfrentou um câncer de mama no ano passado. “Eu estava totalmente displicente. Acho que tive medo de viver o que minha irmã passou e o medo me fez reticente, então ela me fez prosseguir com o alerta”, diz a bancária Jaqueline. “Jô foi fundamental e me fez um favor”. A manicure lembra com satisfação que atendia Jaqueline pela segunda vez quando falava de sua experiência pessoal. Jaqueline comentou que havia feito exames mas há quatro meses e não teria entregue à médica para análise. “O quê? é grave. Corra para ver isso”, recomendou.
É comum para Jô incentivar, orientar e apressar as mais descansadas. Não satisfeita com a conversa durante o atendimento de manicure, manda mensagens de whatsapp quando quer ter notícias sobre as providências. “Bom dia, flor. E aí? O que o médico disse?”, pergunta para uma. “Você está bem? não esqueça da data do novo exame”, insiste. Capaz de ela lembrar mais da data do que a própria paciente, dizem as amigas.
Para recordar datas ela é boa. A comemoração afetiva e intimista com a cliente Márcia faz Jô se emocionar. Conheceu Márcia quando a cliente estava recuperando-se de um pós-operatório em função de um câncer de mama. “Ela ficou cinco anos depois tomando comprimido após a cirurgia. No dia que engoliu o último e foi considerada de alta médica, eu estava lá”, conta com certa satisfação, assim como demonstra tristeza por ter presenciado tamanha dor quando Fátima, outra de suas clientes, abriu o envelope e viu a repetição do diagnóstico maligno que atingira a mãe. Jô gosta do que faz: não apenas a manicure mas também o ativismo a que se impôs como trabalho complementar ao de manicure.
Para Jô, o que realiza é a continuação da sua própria experiência. Em 2015, Jô viu-se diante de um diagnóstico de uma classificação agrupada de nódulos suspeita de câncer de mama. “Era um pré-câncer”, afirmou a médica”. A manicure correu muito pelo Hospital do Câncer, pagou alguns exames com ajuda de clientes e já fez duas cirurgias para retirada de nódulos. Estava no nível de alerta 4 na escala médica dos temidos Bi Rads, sistema internacional para a avaliação mamária que vai de 0 a 6. A experiência de Jô com o diagnóstico de “pré-câncer” foi o suficiente para fazer dela a ativista do cotidiano que é. Uma manicure, mulher comum que usa seu ofício diário e simples para fazer pequenas transformações na vida de outras pessoas. Em sua casa e em residências alheias.