Quem escreve (quem pinta, esculpe, compõe música) sempre sabe o que está fazendo e quanto isso lhe custa. Sabe que deve resolver um problema. Pode acontecer que os dados iniciais sejam obscuros, pulsionais, obsessivos, não mais que uma vontade ou uma lembrança. Mas depois o problema resolve-se na escrivaninha, interrogando a matéria sobre a qual se trabalha – matéria que possui suas próprias leis naturais, mas que ao mesmo tempo traz consigo a lembrança da cultura de que está embebida (o eco da intertextualidade).
O trecho acima poderia tratar de jornalismo, mas é literatura. É o crítico italiano Umberto Eco, no seu pequeno-grande Pós-escrito a O nome da rosa, o livro de 66 páginas que publicou em 1984 para saciar o interesse dos leitores sobre sua obra mais popular, justamente o seu primeiro romance lançado em 1980, que depois resultou numa fiel adaptação para o cinema dirigida pelo francês Jean-Jacques Annaud em 1986. Um escritor mostrando seu método de trabalho é grande valia para quem vive da palavra, como os jornalistas. Por isso que esta obra está neste blog.
O que Umberto Eco mostra é que, antes de escrever, é preciso dominar a arte de ler. Fazendo analogia a O nome da rosa, é preciso construir, com as palavras, um labirinto, e permitir que o leitor consiga sair dele. “Narrar é pensar com os dedos”, reforça Eco, defendendo que o texto deve ser uma experiência de transformação para o próprio leitor. É possível fazer isso no espaço cada vez mais limitado dos jornais? É o desafio lançado pela modernidade, que por sua vez oferece outros meios de expressão na internet. O papel sobreviverá, mas será preciso mais. Jorge de Burgos está a nos observar.