Medindo 14 centímetros de largura por 9 centímetros de altura – o “formato americano”, apesar de sua origem europeia – cartões-postais com imagens do Recife tornaram-se uma febre entre as famílias pernambucanas de posse no início do século passado.

Produzidas na Suíça sob encomenda pela Miranda Souza e Cia, uma empresa de importação e exportação de artigos diversos com sede na Rua da Imperatriz, no bairro da Boa Vista, as cartolinas fotográficas são hoje artigos de colecionadores, disputadas até na internet.

A idade de ouro da cartofilia se deu entre as décadas de 1900 a 1930. Toda família que se prezasse tinha um álbum de postais em casa, para mostrar às visitas. Além de vistas de cidades, como das peças oferecidas pela Miranda Souza e Cia, havia de coleções de profissões, eventos, catástrofes, monumentos e paisagens.

Os cartões-postais da Miranda Souza e Cia não tinham indicação da autoria da imagem. Os fotógrafos poderiam ser da cidade ou apenas de passagem, especializados neste tipo de obra. Vale lembrar que nas primeiras décadas do século 20 os jornais e revistas não eram ilustrados por fotos.

Os cartões ajudaram, com isso, a popularizar a fotografia, antes de acesso restrito aos ricos. Abaixo, diretamente dos arquivos do Diario de Pernambuco, 12 postais da Miranda Souza e Cia. Clique neles para ver a imagem em detalhes. Confira também a descrição mais detalhada de cada lugar.

 

1) Vista da Avenida Rio Branco, que surgiu a partir da remodelação da zona portuária, com a demolição de pelo menos 480 imóveis no Bairro do Recife para a abertura de grandes vias que abrigariam prédios com influência francesa. Atualmente ela tem 300 metros de extensão e 20 metros de largura, sendo fechada para veículos.

2) Vista da Matriz da Boa Vista. O templo teve sua construção iniciada em 1784, mas demorou 105 anos para ser finalizado, o que ocorreu em 1889. Foi erguido pela Irmandade do Santíssimo Sacramento da Boa Vista no final da Rua da Imperatriz, ao lado da Praça Maciel Pinheiro.

3) Vista da Avenida Conde da Boa Vista. A via teve o traçado estabelecido na primeira metade do século 19, depois que foi feito um aterro numa área de mangue que a população chamava de Rua Formosa. Em 1840, o presidente da província Francisco do Rego Barros, o Conde da Boa Vista, iniciou a construção do Caminho Novo, que ligaria o Centro do Recife ao então bairro de Camaragibe.   Em 1870, com a morte de Rego Barros, tornou-se oficialmente Rua Conde da Boa Vista. Ao longo das décadas, abrigou residências e casas de comércio até a chegada dos primeiros arranha-céus da capital. Em 1946, com seu alargamento na administração de Pelópidas da Silveira, passou a se chamar Avenida Conde da Boa Vista.

4) Vista do prédio que abrigou a Biblioteca Pública de Pernambuco e o Tribunal da Relação, na Rua do Imperador. No mesmo local já havia funcionado antes a Cadeia Nova – a segunda prisão do Recife – e o Senado da Câmara.

5) Vista do jardim da Rua do Hospício. A via no bairro da Boa Vista ganhou esse nome porque, na primeira metade do século 18, era o acesso para um hospício (estabelecimento que hospeda pessoas pobres ou doentes) dos frades dos Santos Lugares (Jerusalém). Depois foi chamada de Caminho de Jerusalém e resumida simplesmente para Jerusalém. Em 1877, o poder público mudou o nome oficialmente para Rua Visconde de Camaragibe, mas o povo preferiu ficar chamando-a do Hospício mesmo. É importante destacar na imagem a maxambomba (corruptela de machine pump) indo em direção à Estação da Encruzilhada, cortando a Rua do Hospício vindo da Rua da Aurora, seu ponto inicial.

6) Vista da Praça Maciel Pinheiro, inaugurada no dia 7 de setembro de 1876, no bairro da Boa Vista, em comemoração à vitória das tropas brasileiras na guerra do Paraguai (1864-1870). O nome é uma homenagem ao abolicionista e republicano Luís Ferreira Maciel Pinheiro (1839 – 1889), nascido na Paraíba mas com sua história vinculada a Pernambuco. Jornalista e advogado, envolveu-se em debates a respeito da libertação dos escravos e partiu como voluntário para a guerra do Paraguai, onde contraiu a malária que lhe afetou pelo resto da vida. O entorno da praça tornou-se reduto da colônia judaica antes mesmo da Segunda Guerra mundial. Na esquina da Travessa do Veras, por exemplo, morou Clarice Lispector (1920 -1977), nascida na Ucrânia mas naturalizada brasileira, uma das maiores escritoras do nosso país.

7) Vista da Ponte Buarque de Macedo que, com 288 metros de comprimento, é a mais extensa do Centro do Recife. Liga os bairros do Recife e Santo Antônio e era inicialmente uma estrutura de madeira, erguida em 1845. Seu nome nessa época? Ponte provisória. Em 1882, a construção da estrutura definitiva foi iniciada na administração do engenheiro Alfredo Lisboa. A autorização havia sido dada dois anos antes pelo ministro dos Transportes, Buarque de Macedo, que acabou batizando o empreendimento. Foi aberta ao público em 20 de outubro de 1890. Como curiosidade adicional, no cartão-postal a grafia da ponte está errada. Foi impressa como “Ponte Parque Macedo”.

8) Vista da Praça da Independência, conhecida também como Pracinha do Diario, por ter sido o endereço do Diario de Pernambuco por pouco mais de cem anos. Nos esboços da Cidade Maurícia, era ali que funcionaria um mercado público idealizado por Maurício de Nassau. Depois da expulsão dos flamengos em 1654, construíram-se algumas casas, mas o seu quadrado serviu para a abertura de um poço e, principalmente, para palco de suplício de criminosos. Em 1757, o governador Luis Diogo Lobo da Silva instala um mercado até o meio-dia. Após esse horário, a praça se transformava no paraíso dos ambulantes. Depois de várias reformas urbanas, o espaço vai ganhando importância comercial. Em 1831, o Diario de Pernambuco inicia campanha para mudar o nome de Praça da União para Praça da Independência, sua designação até hoje. Em parênteses, o postal destaca a Casa Louvre, famosa joalharia da primeira metade do século passado, que funcionava no edifício ao centro da foto.

9) Vista da Cadeia Pública, prédio que hoje abriga a Casa da Cultura, no bairro de Santo Antônio. Foi erguido em formato de cruz em 1855 e serviu de penitenciária por 119 anos. Além de projetar o presídio, com 8.400 metros quadrados de área construída e 6.000 m² de pátio externo, o engenheiro Mamede Alves Ferreira também foi responsável por mais dois prédios históricos tombados no Recife: o Ginásio Pernambuco e o Hospital Pedro II, recentemente reformados. A ideia de uma Casa da Cultura foi defendida em 1963 pelo artista plástico Francisco Brennand, quando ocupava a chefia da Casa Civil do governo estadual. O projeto de restauração do colosso neoclássico ficou a cargo dos arquitetos Lina Bo Bardi e Jorge Martins Júnior. Em 14 de abril de 1976, o prédio reabriu suas portas. Para não fechar jamais.

10) Vista da parte histórica do Recife, com suas igrejas e casario, tendo ao fundo como destaque a cúpula e as torres da Basílica da Penha, no bairro de São José. Em estilo coríntio, pertencente à Ordem dos Frades Menores Capuchinhos, o prédio teve seu acesso liberado em 1882, após 12 anos de construção. Seu arquiteto foi frei Vicente de Vicenzia, que projetou o templo inspirando-se na Basílica de Santa Maria Maior, de Roma. A basílica estava fechada desde setembro de 2007 por causa do risco de desmoronamento em vários pontos. Foi reaberta em julho deste ano depois de uma reforma que custou R$ 6 milhões.

11)  Vista da Praça Rio Branco, no Bairro do Recife. Antes batizado com outros nomes (do Comércio, Santos Dumont, Afonso Pena e Alfredo Lisboa), o logradouro abriga desde o dia 19 de agosto de 1917 uma estátua em bronze do barão diplomata José Maria da Silva Paranhos Júnior, de 2,5 metros de altura, feita pelo escultor francês Felix Charpentier. Sobre um pedestal em pedra de 4,2 metros, esculpido por Corbiniano Vilaça, Rio Branco mirava do alto o Atlântico. Em 1938, o Automóvel Clube de Pernambuco instalou lá uma base de onde são feitas as medidas oficiais de distâncias rodoviárias, tornando-se o Marco Zero do Recife. Em 1999, o local passou por ampla reforma, que derrubou árvores e abriu a visão para o oceano e o monumento de Francisco Brennand. Projetada pelo pintor pernambucano Cícero Dias, uma Rosa dos Ventos com dez metros de raio ficou bem no centro do grande espaço livre. A estátua do barão foi meio deixada de lado. Literalmente.

12) Vista dos bairros de Santo Antônio e de São José, destacando em primeiro plano duas igrejas localizadas em pátios: a do Livramento (à esquerda) e a de São Pedro (à direita). A Igreja de Nossa Senhora do Livramento foi aberta ao culto religioso no dia 9 de dezembro de 1882, mas há registros de que, em 1694, havia no local um pequeno templo dedicado a Nossa Senhora do Livramento dos Homens Pardos. Já a Concatedral São Pedro dos Clérigos teve sua construção iniciada em 1728, mas só pôde ser sagrada no dia 30 de janeiro de 1782. O conjunto de 29 casas que circundam o templo foi tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) em 1938.