Hoje celebrada como um símbolo da gastronomia nacional, a feijoada encontrou feroz resistência para figurar nos cardápios de lugares mais requintados. No Recife, a inclusão do prato de feijão com partes menos nobres do porco e do boi causou um verdadeiro horror ao Padre Carapuceiro, colunista do Diario de Pernambuco. Ele dedicou o seu artigo de 3 de março de 1840, intitulado “Os pagodes, rega-bofes, comezainas etc”, a combater este “prato assassino”, que era preparado convertendo-se os fragmentos do jantar da véspera em uma “graxa”.
Famoso por suas críticas, Miguel do Sacramento Lopes Gama (nome de batismo do religioso de língua afiada, cuja história pode ser conhecida clicando aqui) alertou para o risco do consumo de tão insalubre prato pelos “homens de luxo com vida sedentária” e pelas “mulheres delicadas com vida agradável e tranquila”. Desde aquela época, considerava a feijoada apenas para os fortes, trabalhadores braçais e marinheiros.
A peleja do Padre Carapuceiro com a feijoada figura como a 52ª história entre as 100 curiosidades recolhidas por William Sitwell no livro “A história da culinária em 100 receitas – Uma incrível viagem pelos hábitos alimentares ao longo do tempo”, lançado no Brasil em 2013 pela Publifolha. Editor e crítico gastronômico, William Sitwell esbarrou no religioso reclamão para mostrar como a comida – que ao contrário do que se comumente pensa, não era de escravos – entrou para o panteão da culinária mundial. Desta vez, o Carapuceiro perdeu.
A primeira menção à feijoada no Diario de Pernambuco data de 2 de março de 1827. Trata-se de um anúncio da Locanda da Águia D’Ouro, localizada na Rua das Cruzes. Uma “excelente feijoada à brasileira” seria servida às quintas-feiras por um preço cômodo.
No dia 14 de agosto de 1833, André Tubino, proprietário de uma casa de pasto, hospedaria e botequim batizada de Hotel Theatre, comunicava aos seus clientes, através do Diario de Pernambuco, que estava à disposição dos comensais a “feijoada de orelheiras”.
Com o passar dos anos, os leitores do jornal tinham acesso a anúncios de onde comprar os pertences para fazer a feijoada em casa. Só não era aconselhável chamar o padre.