A comoção pela morte do ator Domingos Montagner tomou não só a classe artística, mas o país.
Silvia Bessa (texto)
Divulgação/TV Globo (foto)
Artistas populares são como líderes políticos. Mesmo que com eles não se tenha qualquer proximidade, a sensação é de que são figuras próximas, quase da família. Por eles e com eles, a gente torce e sofre com o rumo das histórias pessoais e reais. Foi assim há pouco com um lamento massivo em torno da separação do casal de jornalistas Willian Bonner e Fátima Bernardes, depois de 26 anos de casados. Repetiu-se ontem. A comoção começou a se instalar no meio da tarde desde quando surgiram as primeiras notícias do desaparecimento e se espalhou até a confirmação da morte do ator Domingos Montagner, vítima de afogamento nas águas do Rio São Francisco, em Canindé do São Francisco, município localizado a 213 km de Aracaju (SE).
Espectadores ou não da novela Velho Chico, veiculada em horário nobre na TV Globo, toda espécie de gente tinha algo a expressar sobre a fatalidade que acabou com a vida de um ator no auge do sucesso. “Eu não consigo acreditar. De tanto assistir à novela, parece que é alguém que vivia comigo (…)”, disse Tayna Melo, na página do Facebook do Diario sobre a postagem do anúncio. Domingos só tinha 54 anos. Era pai de três filhos. Depois de finalizar as “derradeiras” gravações (como se referiu ele em vídeo de bastidores), tomava banho de rio em local pouco recomendado.
“Que tristeza. Estou tão chocada que não vou conseguir nem voltar a trabalhar”, suspirava a advogada Daniela Nascimento, 25 anos, em um salão de beleza no bairro de Casa Forte, no Recife. Em poucos minutos, mandou pelo menos cinco mensagens de celular. Nem a irmã, que está em viagem de lua-de-mel, foi poupada. “Fico pensando na mulher e nos filhos”, emendou um guardador de carros.
O roteiro da morte do ator foi trágico, o que sensibiliza ainda mais. Domingos havia acabado de almoçar com a colega Camila Pitanga. Por volta das 14h30, os dois resolveram dar um mergulho. Ele afundou após resistir às correntezas e redemoinhos típicos da área em função do encontro de águas e não retornou à superfície, para o desespero de Camila. Com ela, fazia par romântico em Velho Chico. Ela interpretando a personagem de Tereza; ele, de Santo. O corpo foi localizado preso a pedras no fundo do rio, a trinta metros de profundidade, próximo à Usina de Xingó – segundo informações preliminares. O intervalo de tempo entre o desaparecimento e a confirmação da morte lembrava episódios vividos na trama televisiva, quando Santo havia sido vítima de um atentado e desaparecido por alguns dias até que Tereza o encontrou e o levou para casa.
Em contextos diferentes, comoção grande se deu com a morte da atriz Daniela Perez, 22 anos. Sucesso nos anos 90, Daniela foi assassinada com 18 punhaladas pelo ex-ator e então colega de novela Guilherme de Pádua e da esposa da época, Paula Nogueira Thomaz. Daniela morreu enquanto a novela De Corpo e Alma era gravada.
Ontem muito brasileiro fez orações, torceu para que a história de Domingos fosse apenas mais uma lenda do velho Chico. Hoje, milhares amanheceram entristecidos, sentindo parte do luto pela morte prematura de Domingos. Como Genilson Aragão, turismólogo que entrou em uma embarcação em busca do corpo perdido. Como Lourival, pescador de Canindé, que ontem concedia entrevistas para emissoras de televisão de São Paulo relatando a relação de amizade construída durante a permanência do ator na cidade e dizendo que “estava à espera de um milagre”. Como muitos conhecidos nossos que suspiram pela vida que nesta quinta-feira imitou e tragicamente piorou a cena da arte.