Casos recentes em Pernambuco reforçam o mês de setembro, destinado à conscientização e prevenção.
Silvia Bessa (texto)
Greg (arte)
Estava com 13 anos apenas a menina. Na sexta-feira à tarde, teria colocado em sua própria boca uma porção de veneno. Enfraquecida, teria caído sobre o chão. Diante da cena, ainda atônitos, familiares a levaram para uma unidade de saúde pública. Menos de 12 horas depois, ao mesmo tempo em que chegavam os primeiros raios de sol do último sábado no Recife, a adolescente se foi. Deixou um vácuo de amor, dor e muitos questionamentos entre os que a amavam. Entre os conhecidos da igreja evangélica que frequentava, no colégio ou na rua onde morava. A família busca sobreviver à quase inacreditável realidade. A sociedade evita falar de suicídio sempre. Na Imprensa, o tabu se mantém. É frequente, mas falar em suicídios – sobretudo entre crianças e adolescentes – é o único caminho para a prevenção, uma vez que o conjunto deles virou questão de saúde pública.
Domingo passado, enquanto o corpo da menina do Recife era velado, uma mãe do município de Limoeiro (87 quilômetros do Recife) pedia ajuda de amigos e desconhecidos para encontrar seu filho desaparecido. O rapaz, de 16 anos, saiu de casa quando os pais estavam dormindo. Não levou consigo o celular, contou-nos pelo telefone. A porta de casa ficou aberta. Antes das 8h do domingo, a Polícia foi informada sobre o sumiço do adolescente. Procurado até 1h da manhã, uma vizinha lembrou da subestação de energia da proximidade. O pai quebrou o cadeado e então encontrou o corpo do filho. A família não acredita que ele atentou contra sua própria vida. O caso está sendo investigado. A perícia deve desvendar o mistério: se o adolescente teria sido vítima de choque elétrico ou de queda. Há dois anos ele convivia com a diabetes e não gostava de deixar que o vissem aplicando insulinas, contou o pai. Se foi suicídio, não se saberá, a menos que haja fatos novos.
No dia 13 de agosto foi um garoto de de 14 anos do município de São Bento do Una, 180 quilômetros do Recife, que se jogou do 22º andar de um prédio da capital, onde estava a passeio. Teria deixado a cidade do interior do estado onde morava e aproveitou para por um fim ao que lhe atormentava. No bolso, um bilhete recomendava que dividissem seus pertences com amigos. São Bento do Una ficou chocada com a perda do menino tido como calmo e estudioso. Setembro, vale frisar, é mês de conscientização para prevenção de suicídio. De todos, o tipo de morte mais intrigante.
Os índices sobre suicídios de jovens no Brasil são preocupantes, mostram pesquisas recentes. As taxas, apesar de baixas comparadas a outros países, estão crescendo. Os suicídios no país estão aumentando em todas as faixas, a começar com a idade de 9 anos, quando já há registro. É o que diz o relatório da pesquisa Violência letal contra crianças e adolescentes no Brasil, divulgada em 2015, assinada pelo Julio Jacobo Waiselfisz numa parceria da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República e Programa de Estudos sobre a Violência da Faculdade Latino Americana de Ciências Sociais. Segundo série histórica de José Manoel Bartolote (autor de “Suicídio e prevenção”, Ed. Unesp), nos últimos 25 anos, houve um crescimento de 30%. Em 2003, foram 763 casos, contra 788 casos em 2013. Para cada caso fatal, diz a Organização Mundial da Saúde, há pelo menos vinte tentativas fracassadas.
Somam-se esses aos subnotificados. O próprio relatório da pesquisa aponta a excessiva incidência em algumas unidades federativas que usam o termo “morte por causa indeterminada”. Seria este um recurso a ser usado apenas em estados com menor cobertura de saúde, o que na prática não acontece. É assim em Pernambuco. “Vemos que, de forma pouco explicável, Bahia, Rio de Janeiro, Pernambuco, Minas Gerais, dentre outros, apresentam taxas muito elevadas de mortalidade por causas indeterminadas, tanto para toda a população, quanto na faixa das crianças e adolescentes”, diz o texto do estudo.
Alguns especialistas consideram que suicídios na infância e juventude têm contornos epidêmicos. Para a prevenção, recomenda-se atenção aos sinais iniciais. Dificuldades em dormir, perda de apetite ou excesso, alteração na personalidade, tristeza, apatia, irritabilidade ou ansiedade, perdas recentes (de mortes ou fim de relacionamentos), desesperança. Mudanças sutis de vida, como de escola ou descoberta de sexualidade, podem gerar “gatilhos” extras para pensamentos que maquinam o fim da vida quando se ainda está no começo dela.