Juiz adesivou casa e carro por “voto de protesto”, esse pelo qual candidatos brigam até domingo.
Silvia Bessa (texto)
Ricardo Fernandes (foto)
Todo dia ouvia falar de uma investigação diferente relacionada à corrupção praticada por um político. Foi quando deixou de reclamar só para os mais próximos e resolveu estampar para fora de casa e para além do seu gabinete de trabalho a inquietude pessoal. Nesse dia, o juiz José de Andrade Saraiva Filho, 59 anos, foi até uma gráfica rápida e pediu para imprimir seu pensamento e sua indignação em adesivos. No para-brisa traseiro do veículo fixou algo que mais ou menos dizia: “Eleição após eleição continua a corrupção. Vote em branco”. Quando passava pelas ruas, chegou a ser aplaudido, garante. Teve quem quis saber onde encontrava adereço semelhante.
No muro da residência do juiz, outra mensagem adesivada: “Contra mentira e safadeza, vote em branco”. Está lá até hoje na esquina da rua que faz frente com a portaria da conhecida Maternidade da Encruzilhada, ou Cisam. Quem passa, estranha. Há quem apóie. “Achei o máximo. É uma boa ideia votar em branco. Nunca tinha pensado nisso. Vou pensar”, disse a dona de casa Luana da Silva, 25 anos, que transitava pela proximidade ontem e leu a mensagem em letras grandes.
“Foi o descrédito com a política que levou a isso. Para mim, o voto em branco é o voto do protesto. Essa foi a intenção ao defender o voto em branco: protestar. Quis mostrar que queremos a volta da moralidade, o fim dos vícios e uma reforma política para o país”, disse o juiz José de Andrade, autor da ideia, justificando-se.
Nascido e com atuação preponderante no interior de Pernambuco, nos município de Verdejantes e redondezas, hoje titular da 1ª Vara Criminal da Comarca de Olinda, José de Andrade diz que no próximo domingo ficará em casa. Sem o direito do voto este ano, segundo ele por não ter transferido seu título em tempo de escolher candidato no Recife (onde mora) ou em Olinda (onde trabalha), não demonstra qualquer interesse pelas disputas que se darão no país. Na escolha dos candidatos do poder Legislativo, o desânimo foi maior – assegura. “No Executivo ainda vai porque temos de escolher um gestor”. Há cinco anos, diz ele, tudo tem ficado pior.
Uma espécie de avalanche de eleitor brasileiro pensou como o juiz José de Andrade no primeiro turno das eleições municipais, dia 2 de outubro, e não votou em ninguém. Apertou a tecla “branco” na urna eletrônica e confirmou o voto, anulou ou faltou à votação. São Paulo foi o caso mais grave: no maior colégio eleitoral, quatro em cada dez eleitores não tiveram candidato porque se abstiveram, votaram nulo ou em branco. No total, 3.096,304 (38,84%) não fizeram escolha – um número de votos que está acima até daquele obtido pelo prefeito eleito, João Dória (PSDB). Em Belo Horizonte, esse somatório foi ainda mais impressionante percentualmente – 43,14%. No Recife, os brancos totalizaram 4,23%, os nulos 7,78% e as abstenções 11,31% Ou seja, 23,32% do colégio eleitoral não votaram em “ninguém”.
No próximo domingo haverá segundo turno em 56 cidades das 92 onde esse recurso seria possível. Dessas 56, 18 são capitais. O segundo turno é permitido quando nenhum dos candidatos consegue obter mais da metade dos votos válidos nominais.
Restam apenas três dias para que os candidatos que sobreviveram ao primeiro turno e disputarão o segundo turno conquistem o eleitor. Certamente, aqueles que votaram branco e nulo são ainda mais difíceis – a se tirar pelo desânimo do juiz José de Andrade que deu depoimento para este artigo. Não há dúvidas de que esses eleitores farão a grande diferença em favor daquele que ganhar cada eleição.