Nas últimas 11 eleições diretas para presidente, de 1945 até hoje, a direita só foi vitoriosa em uma delas.
Vandeck Santiago (texto)
J. Duran Machfee/ Futura Press/ FolhaPress (foto)
Primeiro foi o sociólogo e cientista político Antonio Lavareda. Agora, é o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad. Semana passada Lavareda disse que, se a centro-direita lançar uma candidatura única, entra como grande favorita para vencer as eleições presidenciais de 2018. Ontem, em entrevista à Folha de S. Paulo, Haddad afirmou que em 2018 a disputa será entre direita e extrema-direita. “O desafio da esquerda é maior do que nunca. A gente nunca conviveu com uma situação tão adversa”, disse o prefeito.
São avaliações de dois destacados profissionais do ramo, que têm o trunfo de acompanhar a política por dentro e por fora. Tratei do assunto no Em Foco de 15 de novembro passado (“2018: qual o perfil do próximo presidente?”), e torno a abordá-lo agora. Creio haver aí pelo menos três incógnitas a serem levadas em consideração: a primeira é o fator Temer – o governo dele trará a recuperação econômica ou insatisfação popular, com medidas como a anunciada este fim de semana, de fechamento de agências do Banco do Brasil? Se o governo dele chegar impopular em 2018, que força será a beneficiária da insatisfação?
A segunda incógnita é o efeito de uma eventual candidatura de Lula. Já a terceira é de natureza histórica – a direita é historicamente frágil nas disputas presidenciais no Brasil. E carrega a pecha de ser mau perdedora: inconformada com a derrota nas urnas, às vezes descamba para o golpismo. Dois exemplos consensuais na história: agiu assim contra Juscelino Kubitschek, em 1955, e contra João Goulart – contra este, acabou obtendo sucesso, com o golpe civil-militar de 1964.
Juscelino venceu as eleições, porém logo após o resultado a UDN (partido que representava a direita) ingressou na Justiça para tentar anular o pleito. Os argumentos iam desde a prática de corrupção até o fato de que JK recebera “votos dos comunistas” e que não obtivera a maioria absoluta dos votos (na época não havia segundo turno). Contra Goulart, os fatos são conhecidos. Em relação à fragilidade eleitoral, destaque-se que na votação do plebiscito, em 1963, para decidir entre presidencialismo (que daria plenos poderes a Goulart) e parlamentarismo (que praticamente encerraria seu governo), o presidencialismo pró-Goulart saiu vitorioso com 82% dos votos – apesar de o país estar sob forte crise econômica.
O que a história mostra é que nas últimas 11 eleições diretas para presidente, de 1945 até hoje, a direita venceu apenas uma – em 1960, com Jânio Quadros. A disputa de 1945 foi atípica porque ocorreu no clima do pós-guerra. Tivemos então dois militares de alta patente concorrendo: o brigadeiro Eduardo Gomes e o general Eurico Gaspar Dutra (este foi o vitorioso). E Fernando Collor, em 1989, foi uma bala perdida.
A leitura desses dados permite a interpretação de que, neste período mencionado, a direita não teve agenda nem candidatos para seduzir a maioria do povo brasileiro. Em um país como o Brasil, qualquer discurso que minimize (ou não enfatize) a necessidade de medidas sociais e de combate às desigualdades, enfrenta grandes dificuldades para ser aceito pela maioria do povo. Discurso aqui entendido não apenas como a retórica, mas como a prática – qualquer pessoa sempre pode dizer que é contrária às desigualdades e que pretende combatê-las, mas para dar respaldo a essa afirmação é preciso que ela tenha uma prática demonstrando isso.
O melhor ambiente para uma vitória da direita é quando o debate sobre igualdade e justiça social é sobrepujado por outros como a corrupção (que deu a vitória a Jânio Quadros e catapultou a candidatura da “bala perdida” Fernando Collor) e a moral. Nos dias atuais, creio que calam fundo sobre a alma do brasileiro as discussões sobre determinados temas ligados à religião e à sexualidade – um terreno fértil para a disseminação de notícias falsas, como a de que o partido X ou Y tem projeto para tornar as crianças gays.
Esse quadro histórico que apresentamos aqui não demonstra que a vitória da direita em 2018 seja improvável. A tendência do momento mostra o contrário: que é provável. Porém, como “provável” não é sinônimo de “garantido”, é prudente aguardar a nitidez que só a proximidade das eleições é capaz de oferecer.