Setor imobiliário dá pulos de alegria ao ver investidor brasileiro, depois da crise econômica, trocar Miami por Lisboa.
Luce Pereira (texto)
Jarbas (arte)
Pode não ser a gastronomia, a poesia de Fernando Pessoa e o rio da paixão dele, o Tejo, tampouco o fado ou o fascínio pelas compras. Pode ser apenas o desejo de fazer um investimento mais rentável e seguro, comprando um imóvel, ou simplesmente estar com os dois pés no continente europeu, mas a verdade é que Portugal nunca esteve tão próximo dos brasileiros. Transformou-se em opção por qualidade de vida, motivo que figura na cabeça da lista de justificativas para uma aproximação maior com o país, seja morando permanente ou esporadicamente. E se os habitantes ainda olham a consolidação deste cenário com alguma desconfiança – temendo, sobretudo, o aumento da violência, que segue sendo a pior propaganda sobre o Brasil -, o mercado imobiliário dá pulos de alegria. Desde 2016, Miami (EUA) deixou de ser o “amor estrangeiro” da nação, trocado sem cerimônia pela graça de cidades como Lisboa e O Porto, ambas já eleitas pela crítica especializada em turismo como melhores destinos da Europa. Nas 7 horas e 18 minutos de voo para percorrer os 5.842 quilômetros que separam os dois países, não se fala mais em cansaço, só em pernas para o ar e vida que se pediu a Deus, embora Portugal não seja exatamente o paraíso na terra e também enfrente problemas de ordem social, econômica e política. Quem não? A diferença é o grau.
Pelas ruas de Lisboa, os dois sotaques da mesma língua são tão comuns que fica fácil notar razoável equilíbrio na mistura. Significa dizer que a rede hoteleira não tem do que reclamar e menos ainda construtoras e imobiliárias. No segundo trimestre do ano passado, brasileiros já superavam chineses na aquisição de imóveis na capital do país, pelos cálculos do Gabinete de Estudos da Associação dos Profissionais e Empresas de Mediação Imobiliária de Portugal (Apemip). Hoje, franceses dominam os investimentos estrangeiros no setor com 25% do total e são seguidos de perto pelos ingleses (19%), mas os brasileiros (10%) tendem a encostar em ambos, caso a crise econômica por aqui dê sinais de não esmorecer tão cedo. Há imobiliárias na cidade, inclusive, que já têm mais clientes brasileiros do que portugueses, seduzidos por alguns argumentos irresistíveis: a valorização do euro protege o patrimônio e lá compra-se o segundo metro quadrado mais barato dos países da UE, já que a Grécia ocupa o primeiro lugar.
Naturalmente, o governo português olha com muito carinho para esta movimentação na economia, provocada pela onda de investimentos brasileiros no setor imobiliário, e se apressa a oferecer um visto de cinco anos para quem empregar 500 mil euros na compra de imóveis. Se a preferência do investidor for por uma construção em bairro antigo, que precise ser reabilitada, o valor cai para 300 mil euros. Não só isso: neste caso, é concedida isenção de impostos no ato da escritura, algo equivalente a 6% do valor da propriedade, e de cobrança, por cinco ou seis anos, do que seria aqui o IPTU. Ao lado de tanta empolgação caminha, claro, a procura pela nacionalidade portuguesa. O Ministério da Justiça, lá, diz que foram concedidas 87.033 cidadanias a brasileiros no período de seis anos (2010-2016) e o governo estuda a flexibilização das regras para ampliar este número. Entre as vantagens de se ter um passaporte luso estão livre acesso aos países que fazem parte da UE e dispensa de visto para ir a 170 outros, incluindo Japão e EUA.
O mundo de vantagens, no entanto, se resume essencialmente a uma: poder viver sem o fantasma da violência comprometendo a qualidade de vida. Afora isso, Lisboa e arredores estão cheios de bons motivos para celebrar a vida, com o bônus de isso poder ser feito na língua-mãe. É o máximo. Se não bastasse, a Estação Oriente – belíssimo projeto do arquiteto espanhol Santiago Calatrava – leva à Espanha e de lá a todos os países da Europa, um continente que se diferencia pela arte, cultura, modernidade e exuberância natural. O que sei, particularmente, é que a cada ida a Portugal me sinto cada vez mais em casa. E isso não tem preço.