As áreas de psicologia e de coaching colocam o problema em pratos limpos, com explicações surpreendentes.
Luce Pereira (texto)
Samuca (arte)
É certo que vivemos um tempo de enorme intolerância, nervos à flor da pele, humor do tipo “papel de embrulhar prego”, mas não é de agora que isto acontece: logo no primeiro contato, “os santos não se batem” e as duas pessoas mal conseguem disfarçar a antipatia mútua, nascida não sabem a partir de quando nem por quê. Tudo seria extremamente fácil se cada uma se dispusesse a analisar o próprio comportamento com a devida clareza e boa vontade, consciente da existência, neste caminho, de algumas pedras que, se não afastadas a tempo, acabam por se tornar irremovíveis. Explicações para a estranha rejeição existem e são produzidas em algumas áreas que estudam os relacionamentos humanos, segundo descobri ao pesquisar o assunto, cujo interesse me foi despertado pela vivência de situações semelhantes. Não é fácil enfrentá-las nem justo com as pessoas envolvidas, se nunca mantiveram ao menos dois dedos de conversa ou mesmo involuntariamente chegaram a se envolver em algum episódio negativo.
As situações em si são desastrosas, mas ruim mesmo é não buscar meios de entendê-las, deixando que passem a fazer parte da razoável coleção de coisas que “nem Freud explica”, aquelas que simplesmente “entregamos a Deus” como se Ele fosse fiel depositário das nossas interrogações, mesmo as que podem virar ponto com apenas uma dose mínima de empenho. Em casos assim, a psicologia não doura nem um pouco a pílula e vai logo avisando que a rejeição pode vir de algo que inconscientemente abominamos em nós e enxergamos no outro. No caminho dessas constatações surgem estudos como o da Wake Forest University, dos EUA, segundo o qual os humanos tendem a projetar traços da própria personalidade como se os alvos rejeitados fosse um espelho refletindo o que rejeitam em si mesmos. Aqui, nada como sessões de terapias para ajudar a desatar o nó, embora haja quase uma unanimidade sobre que até a luz aparecer no fim destes túneis lá se vão muito tempo e dinheiro. É quanto custa, mas caminhar com mais leveza não tem preço.
No entanto, a área de coaching prefere explicar a antipatia instantânea pela ativação de uma espécie de catálogo cerebral contendo situações de ameaça, o que geraria o repúdio. Estaríamos assim na defensiva ou em alerta para evitar um dano físico ou psicológico mais à frente. Existe até mesmo explicação do ponto de vista fisiológico, em consonância com a teoria de Daniel Goleman, pioneiro nos estudos da inteligência emocional. Como a região do cerebelo é responsável, em grande parte, pela emissão dos “julgamentos”, ela poderia detonar a resposta de rejeição face a qualquer detalhe sentido como desagradável no comportamento de quem é rejeitado. Seria, portanto, uma reação espontânea e instintiva, nunca racional, e detalhe: esta parte do cérebro não funcionaria assim para quem tem o autocontrole em dia. Embora sinta uma repulsa automática, a pessoa simplesmente não se deixa afetar por qualquer tipo de sinal negativo vindo do outro.
Cheiros, posturas inadequadas, pequenas expressões faciais entram, também, no rol dos “detonadores” da antipatia que não é “gratuita”, mas instantânea e explicável. Porém, o importante não é tanto ter consciência de quantos ou quais são e sim decidir que, por todas as razões (alheias à vontade consciente) tal rejeição não deve prosperar. Fica claro aqui que pode haver algo de errado conosco, não necessariamente com o outro, e que seria bom promover as mudanças necessárias. Afinal, num tempo que suplica por mais humanidade e menos reis na barriga, é melhor ter aliados do que “inimigos sem causa”, ao menos aparente.