28.11

Luciano Huck desiste de candidatura à Presidência, mas pede “participação política” de sua geração.

Vandeck Santiago (texto)
Alcione Ferreira/DP (foto)

Se a gente for falar de eleição para deputado, eu direi que prefiro mil vezes alguém como Luciano Huck querendo entrar na política do que alguém como ele negando ou condenando a participação política. Claro que a candidatura dele a presidente da República, surgida do nada, seria um despropósito. Mas o seu engajamento é algo, ao meu ver, positivo.
Huck poderia aproveitar o embalo e candidatar-se a deputado (ele já disse que não o fará). Seria ótimo que, além dele, entrassem na disputa — estou falando da eleição para deputado — outros nomes, como Guilherme Boulos, do MTST; Deltan Dallagnol, procurador, o juiz Sérgio Moro… Quem acreditar que eles vão renovar alguma coisa, vota neles. Quem não acreditar, não vota. O importante é que tenhamos opções de nos sentirmos representados.
Vez por outra culpa-se o povo quando se critica esta ou aquela legislatura, mas o que os resultados mostram é que o povo está sempre buscando alternativas. Quando você pega as últimas sete eleições parlamentares, de 1990 a 2014, vê que a cada disputa o eleitor renova pela metade a câmara federal. Ou seja, de cada dois deputados, o eleitor só renova o mandato de um. Vejam estes dados, do Diap (Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar), com o índice de renovação da Câmara (em percentual) em cada eleição:
1990: 60%
1994: 54%
1998: 43%
2002: 46%
2006: 47%
2010: 44%
2014: 47%
Mesmo havendo cartéis nos partidos, que favorecem seus principais nomes e dificultam renovações, o fato é que o eleitor encontra suas brechas para operar as mudanças que estão ao seu alcance na hora de escolher seu deputado. Às vezes, passada a eleição, nem se lembra em quem votou. E, às vezes, candidatos folclóricos são eleitos por serem conhecidos da televisão ou de atividade onde conseguiram fama popular. Se você olhar do outro lado da lente, porém, verá que muitos se lembram em quem votaram e que houve outros folclóricos/famosos que se candidataram achando que iriam ganhar fácil e não foram eleitos.
Luciano Huck não se enquadra nessa categoria de “folclórico”, nem é um “famoso” em busca de uma aposentadoria no Congresso – ele tem outras aspirações, e aparentemente mais consistência (dentro da linha de raciocínio do que ele considera justo). Pessoas com uma linha ideológica que parece ser também a dele, a do centro, tornaram-se ativistas a partir das Jornadas de 2013, e almejam exercer influência na política. “Tenho dito sempre algo que me parece muito evidente, quase óbvio, mas assim mesmo um alerta necessário: se não nos aproximarmos de fato da política, se seguirmos negando esse universo e refratários ao seu ambiente, ele definitivamente não se reinventará por um passe de mágica”, afirmou ele no seu artigo publicado ontem na Folha de S. Paulo, no qual anuncia que não concorrerà à Presidência da República.
Em outro trecho, ele (que tem 46 anos) diz: “Minha geração está trabalhando e inovando com vigor em muitas frentes. Há milhares de notáveis empreendedores, profissionais liberais, atletas, executivos, artistas, intelectuais, pensadores e por aí vai. Mas pela política, ela tem feito pouco”. Na eleição de 2014, Huck e amigos dele da mesma geração engajaram-se na campanha de Aécio Neves, mas o desfecho não foi, digamos, satisfatório. “Levante a mão quem nunca se decepcionou com um amigo. Óbvio que fiquei decepcionado”, disse ele ontem, em entrevista, ao falar sobre Aécio, que foi seu amigo pessoal e a quem não vê desde o escândalo em que o senador mineiro foi pego numa gravação pedindo dinheiro ao empresário Joesley Batista.
Podemos supor que o pensamento político dele tem espinha dorsal, mas ainda não está completamente construído (o que não é nenhum demérito; pode até ser mérito, dependendo das circunstâncias). Pode agregar este ou aquele item, dependendo de sua sensibilidade, de sua sabedoria e das pessoas e grupos com os quais se relacione.
Huck leva uma vantagem, em relação a quem só vê a realidade do gabinete: viaja muito pelo país e tem contato direto com os pobres. Que efeito tudo isso terá sobre ele, ninguém sabe. Mas é aí que está a chave que irá definir se, no futuro que pretende trilhar, ele será mais do mesmo ou alguém genuinamente interessado em renovar a política.