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O fato mais importante de 1954 para os brasileiros foi o suicídio de Getulio Vargas, no dia 24 de agosto. Há sessenta anos, o presidente saía da vida para entrar na história com um tiro no peito às 5h, deixando uma carta-testamento não escrita por ele, mas que representava bem o seu legado político. Cercado por inimigos e pressionado a licenciar-se, o velho gaúcho preferiu sair do Palácio do Catete em um caixão. Mesmo morto, saiu vitorioso. A população, a mesma que lhe virou as costas, agora tratava-o como um santo. O Diario de Pernambuco publicou, na mesmo data do suicídio, uma edição extra com os detalhes da crise política que terminou de forma trágica.

“Logo que chegaram ao Recife, enviados pela Agencia Meridional, os primeiros telegramas acerca da situação política do Rio de Janeiro, agravada com o suicídio do presidente Getulio Vargas, uma multidão de curiosos reuniu-se defronte do edifício do Diario de Pernambuco, para ler as notícias afixadas no quadro informativo do jornal. O comercio começou a cerrar suas portas cerca das 10 horas, quando já eram conhecidos pormenores da tragedia do Palacio do Catete, verificada cerca das 8.30 da manhã. Durante todo o dia a situação na cidade permaneceu calma. Os comandos militares sediados no Recife, bem como a Secretaria de Segurança Publica, comprometeram-se a manter a ordem interna. O patrulhamento das avenidas Guararapes e Dantas Barreto, onde se formavam constantemente grupos de populares, foi reforçado por dois contingentes da PM”.

Se a situação no Recife foi considerada calma nas primeiras horas após o anúncio da morte de Vargas, não tardaram a surgir manifestações contra os adversários do ex-ditador, considerados os responsáveis diretos pelo suicídio. “Vinte minutos após os primeiros distúrbios no Bar Brahma, populares gritando ‘abaixo Carlos Lacerda’ dirigiram-se para a esquina da rua Nova com a avenida Guararapes, onde se encontravam faixas alusivas ao diretor da Tribuna de Imprensa. As faixas foram dilaceradas. Uma patrulha do Exercito conseguiu impedir a ação dos populares efetuando a prisão de um deles, quando tentava alcançar uma outra faixa de propaganda”.

O governador Etelvino Lins decretou luto oficial de oito dias. Na Assembleia Legislativa, na abertura da sessão, às 14h10, após a leitura da ata, o deputado Nilo Pereira solicitou ao presidente da casa, Paulo Germano, a realização de uma homenagem ao presidente morto. O deputado Vieira de Menezes levantou uma questão de ordem. “Não queremos que a iniciativa do levantamento da sessão parta da bancada pessedista”, afirmou. De acordo com a matéria publicada no Diario, Vieira de Menezes “foi aplaudido pelas galerias quando asseverou que os membros desse Partido dias antes pediam a renuncia do presidente da Republica”.

Ouvidos pela reportagem do jornal, os presidentes dos principais clubes de futebol garantiram que os jogos programados para o dia seguinte seriam cancelados por motivo de luto. “Medida justa e simpaticamente recebida pela população desportiva da cidade, pois o presidente Vargas sempre foi um sincero e leal amigo dos desportos brasileiros, como atesta a própria criação do Conselho Nacional dos Desportos”.

Na edição do dia 26 de agosto, o Diario trazia a imagem de Vargas no caixão. Foi no início do mês que Vargas começou a enfrentar o seu inferno astral. No dia 5, Carlos Lacerda, que atacava o presidente através de seu jornal, sofreu um atentado quando chegava em casa, na Rua Tonelero, em Copacabana. Dois pistoleiros dispararam contra ele. Lacerda ficou ferido no pé, mas seu segurança, o major da Aeronáutica Rubens Vaz, morreu. O jornalista culpou Vargas diretamente e os militares aproveitaram para exigir sua renúncia.