Por EuEstudante
A aplicação do primeiro dia da versão impressa do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) é alvo de críticas por estudantes, entidades e políticos. O primeiro dia de provas ocorreu nesse domingo (17). O teste foi marcado por registros de aglomeração, denúncias por descumprimentos de protocolos de segurança e impedimento de estudantes de realizar a prova por lotação das salas.
Regis Costa, 20 anos, morador de Porto Alegre (RS), estava no grupo de estudantes impedidos de fazer a prova por superlotação. Ele foi informado da impossibilidade de realizar o exame enquanto entrava no ambiente. O estudante narra que o grupo foi informado por um diretor de que a prova seria adiada.
“(Foi) caótico pelo fato de que ninguém sabia ao certo o que estava acontecendo e frustrante por ver pessoas que, assim como eu, se esforçaram e deram tudo de si durante o ano para, no fim, não serem respeitadas e serem lesadas”, lamenta. Os estudantes permaneceram no local e exigiam um documento que comprovasse a permanência. Para isso, foi necessária a mediação da Polícia Militar.
A prova também foi marcada por um recorde de faltas. Segundo o Ministério da Educação (MEC), 2.842.332 estudantes não compareceram, o que representa mais da metade dos inscritos (51,5%). Em 2019, o número registrado foi de 1.160.151, ou seja, 22,77% dos 5.095.388 inscritos.
No Distrito Federal, dos 113.177 inscritos, 57.921 não compareceram aos locais de prova, o que representa 51,2% do total. João Lucas de Moraes, 31, foi até o Centro de Ensino Fundamental (CEF) 1 do Núcleo Bandeirante para realizar a primeira prova do certame. Ele relata que o distanciamento entre os inscritos não foi respeitado. “Eu estava a menos de um metro das pessoas ao meu redor”, afirma.
“Eu não me senti seguro, isso inclusive me prejudicou durante a prova porque me deixou em estado de alerta e de extrema ansiedade porque o único protocolo de segurança seguido ali era o de uso de máscaras”, conta. Segundo ele, não foi solicitado aos inscritos que baixassem a máscara para se identificar. “A meu ver, isso é uma grave falha e compromete a lisura do processo”, afirma.
A estudante Larissa Costa, 25, afirma que o Centro Universitário do Distrito Federal (UDF), onde fez a prova, registrou grande aglomeração de estudantes desde a entrada no local. Ela também sentiu falta do respeito aos protocolos de segurança dentro da sala. “Não havia nada sobre distanciamento e orientações sobre cuidados na hora que fosse comer ou beber água”, ressalta.
“Assim que eu cheguei, deu para perceber a entrada extremamente lotada. Na sala, não teve também distanciamento social. As cadeiras estavam todas juntas. Na minha sala umas cinco pessoas faltaram então tinha mais da capacidade que o Inep tinha orientado”, conta.
O deputado distrital Fábio Félix (PSOL-DF) avalia que as medidas prometidas pelo MEC não foram cumpridas no dia da avaliação. “A gente viu muitas aglomerações nas entradas das escolas, a gente teve notícia de estudantes excluídos do processo por causa da superlotação em sala de aula”.
O deputado havia entrado com ação que solicitava que a prova fosse adiada, no entanto, o pedido foi negado. Ele ressalta que a alta abstenção é sinal de uma falta de compromisso do governo federal com a educação. “O mínimo que o MEC deve fazer é tomar conhecimento de todos os equívocos no Brasil para tentar corrigir na próxima semana”, afirma.
Uma ação de diversas secretarias e órgãos locais guiou a logística da prova no DF. A Operação Enem 2020 teve apoio de polícias Militar (PMDF), Civil (PCDF) e Federal (PF), Corpo de Bombeiros (CBMDF) e Departamento de Trânsito (Detran), Samu, as secretarias de Educação (SEE) e de Mobilidade (Semob), CEB, Novacap, Brasília Ambiental, Departamento de Estradas de Rodagem do DF (DER), Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) e Fundação Getulio Vargas (FGV).
Entidades estudantis consideram a prova um desastre
A presidente da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes), Rozana Barroso, avalia que as medidas não foram cumpridas e lembra que, mesmo com uma abstenção histórica, estudantes não conseguiram fazer a prova pela falta de sala. Ela, que também participou desta edição do exame, ressalta que só foi possível espaçamento entre os estudantes no local onde fez prova por parte dos inscritos não ter comparecido.
Rozana considera que o Inep e o MEC já contavam com o alto número de abstenções e ressalta que a alta nos números pode significar um retrocesso para o acesso ao ensino superior. “O resultado foi um desastre”, afirma. “É a concretização de um projeto de destruição de sonhos, principalmente para a juventude negra.”
O presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), Iago Montalvão, ressalta que o Inep falhou justamente nos pontos que justificaram os pedidos de adiamento das provas. Iago considera que o MEC deveria ter garantido mais salas de aula, além das 205 mil anunciadas. “O MEC mentiu, inclusive para a Justiça, quando disse que as medidas estavam garantidas, quando na prática não estavam”.
A UNE e Ubes planejam continuar com a pressão pela segurança no Enem nas redes sociais, além de lançar um site, em que estudantes poderão fazer denúncias que serão anexadas a um processo que será levado pelas entidades à Justiça. O lançamento está previsto para esta terça-feira (19/1).
Batalha na Justiça marcou os dias que antecederam a prova
Em 58 municípios, o Enem não foi aplicado. Em Rondônia, Espigão D’Oeste, com 969 inscritos, e Rolim de Moura, com 2.863, ficaram de fora. Das cidades fora do Enem, 56 estão no Amazonas. No estado, as provas foram suspensas por determinação da Justiça em razão do atual cenário de pandemia.
No Amazonas, a aplicação deve ocorrer em 23 e 24 de fevereiro. No entanto, outras ações pelo país questionavam a realização das provas. Até sexta-feira (15/1) a Advocacia-Geral da União (AGU) já havia atuado em 58 ações individuais movidas na Justiça questionando o Enem.
A Defensoria Pública da União (DPU) também contestava na Justiça a aplicação das provas e chegou a afirmar que o Inep mentiu sobre a ocupação das salas. Planos de sala de aula esperavam mais alunos que 50% da capacidade das salas, o que contrariava a promessa do Inep.
Contatado pelo Eu, Estudante, o Inep não se manifestou.
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