A sociedade muda com o tempo, mas nem sempre a legislação a acompanha na mesma rapidez. Algumas leis – ainda do século passado – são responsáveis por justificar na atualidade o pagamento de benefícios previdenciários (pensão por morte) para toda mulher que seja maior de 21 anos e solteira. É o caso, por exemplo, das pensões dos dependentes de militares (Lei n.º 3765/60) e dos ferroviários (desde que o óbito tenha ocorrido antes do Decreto-Lei n.º 956/69).

Esse tipo de tratamento diferenciado é regido por essas leis históricas e não se aplica ao caso dos dependentes da Previdência Social, cuja pensão por morte se encerra quando a filha ou filho completa impreterivelmente 21 anos de idade, desde que não seja inválido. Na realidade, essa pensão por morte vitalícia para as solteironas é o sonho de consumo de todo dependente do INSS, apesar de não ser nada saudável para o equilíbrio atuarial da balança dos cofres públicos.

Afinal, o instituidor do benefício recebe – em média – a aposentadoria em nome próprio por 15 ou 20 anos. E, quando esse vem a falecer, a viúva recebe a pensão por morte por mais uns 5 ou 10 anos. Por fim, essa mesma pensão por morte pode ser estendida para a filha do casal (maior de 21 anos e solteira) para gozar do benefício por toda a vida, cerca de 50 anos de pagamento da pensão.

É preciso esclarecer que tais pensões vitalícias foram concebidas num momento em que a sociedade era predominantemente patriarcal e machista. A mulher realmente não trabalhava e o homem era quem provia o lar. Inclusive, o antigo Estatuto dos Funcionários Públicos (Lei n.º 1.711/52) estabelecia que a filha solteira, maior de 21 anos, só perderia a pensão se ela ocupasse cargo público permanente, isto é, passasse a trabalhar.

Apesar dessa peculiaridade, nos casos das pensões militares e ferroviárias não há qualquer incompatibilidade em a filha solteira manter o seu sustento e, cumulativamente, receber o benefício. O impedimento é apenas em relação a situação conjugal, condição que realmente faz cessar o pagamento da pensão por morte.

Antigamente, se partia da premissa de que contrair núpcias era sinônimo de estabilidade financeira para a mulher. Tanto o é que bastava ocorrer o casamento para encerrar a pensão, pois se considerava que o marido iria bancar todas as despesas do lar. Hoje, a realidade é bem diferente. A partir de 1988, houve a equiparação de direitos entre homens e mulheres com a Constituição Federal. Apesar da falta de isonomia salarial, elas invadiram o mercado de trabalho e, não raro, sustentam o lar enquanto o maridão cuida das crianças. Seria o caso de se pensar na pensão por morte para filho maior e solteiro ?

Para contornar o requisito legal do estado civil de solteiro, muitas filhas passaram a viver “solteiras” e em união estável, instituto jurídico equiparável ao casamento mas de difícil comprovação. Na realidade, a situação da união estável pode ensejar a extinção do benefício, no entanto, nem sempre a Administração Pública consegue atestar tal realidade. Como o casamento é assentado no cartório, esse registro documental é mais fácil de denunciar o relacionamento estável.

As pensões das solteironas é um benefício em extinção. A legislação atual não tolera mais essas benesses, principalmente porque os tempos mudaram. O casamento não é mais garantia de renda para as mulheres, que também passaram a ir a luta para dividir as contas da casa. Quem consegue se enquadrar nos requisitos dessa antiga legislação, pode receber. No entanto, principalmente pelo déficit atuarial, as mudanças foram implementadas e, invariavelmente, as mulheres (dependentes) recebem a pensão por morte até os 21 anos de idade, quando não se trata de invalidez. Até a próxima.