No vocabulário do INSS, o fato de a pessoa voltar a trabalhar é sinônimo de que já está boa. E, portanto, se ocorrer esta circunstância, é indevido o pagamento do auxílio-doença. Na maioria dos casos, eu até diria que o INSS pode estar com a razão. Mas não todos. Muitas vezes o segurado volta, mesmo doente, ao seu emprego em razão da necessidade de sobrevivência e não propriamente por ter resgatado totalmente a força laboral. Não é raro encontrar casos em que o empregado trabalha avariado. Afinal, não é fácil driblar os obstáculos colocados pelo Instituto, em razão de alta médica precipitada e, como consequência, conseguir desfazer essa opinião e restabelecer o auxílio-doença. A Turma Nacional de Uniformização teve a sensibilidade necessária para endossar seu posicionamento de que é possível o segurado, merecedor de auxílio-doença, voltar a trabalhar e receber o pagamento sem fazer qualquer compensação financeira ou mesmo abater o salário da empresa.
A sensibilidade que a Justiça teve para enfrentar esse tema praticamente não se encontra na estrutura administrativa do INSS. Aliás, quando o assunto é benefício por incapacidade (auxílio-doença, auxílio-acidente e aposentadoria por invalidez), o que menos tem ocorrido na Previdência é a sensibilidade de protrair o pagamento, mesmo sem retorno ao trabalho. Portanto, não adianta tentar tal caminho nos postos previdenciários, mas diretamente na Justiça.
Para quem é pai de família e se encontra sem condições de trabalhar por motivo de doença, carecendo da proteção social do Instituto, não é fácil ver todo final de mês as contas e despesas se acumulando sem conseguir pagar. Como a Justiça brasileira não é um primor de perfeição, o trabalhador fica numa “sinuca de bico” ao tomar decisão de não insistir administrativamente, mas levar o caso aos tribunais. Mesmo assim, o pedido judicial para restabelecer o benefício pode consumir meses. Não são todos que conseguem passar, inertes, por situação de fome e provação financeira. Portanto, o retorno ao trabalho – mesmo sem ter ocorrido a convalescença total – é medida que muitos tomam por necessidade.
A decisão da Turma Nacional no julgamento do processo n.º 0501960-49.2012.4.05.8402 é importante para acobertar situações em que o retorno ao posto de trabalho se deve por imperiosa necessidade financeira. É verdade que já existia a Súmula n.º 72 da própria Turma (é possível o recebimento de benefício por incapacidade durante período em que houve exercício de atividade remunerada quando comprovado que o segurado estava incapaz para as atividades habituais na época em que trabalhou). A decisão, embora redundante, foi necessária porque muitos juízes não acatam o conteúdo da mencionada Súmula.
Apesar de a decisão da TNU aparentar o favorecimento do enriquecimento ilícito, pois o segurado receberia cumulativamente o salário do empregador e o salário do INSS por afastamento de incapacidade (mesmo não tendo se afastado), entendo que a decisão se revela justa. Não se pode fazer vista grossa de que os médicos peritos do INSS, cada vez mais, mandam pessoas voltar a trabalhar, mesmo doentes. Muitos aparentam assim procederem para bater uma “meta” sombria de cortar benefícios todos os meses. Se ficar configurado que o retorno foi ilegal e que o trabalhador estava de fato doente, o INSS não pode se beneficiar da própria torpeza e deixar de pagar por algo que deu causa. Até a próxima.