Soldado que matou colega de farda vai ser expulso da Polícia Militar

O soldado da Polícia Militar Flávio Oliveira da Silva, 32 anos, será expulso da Polícia Militar de Pernambuco. A informação foi repassada pelo secretário de Defesa Social, Alessandro Carvalho, na manhã desta segunda-feira, durante a formatura de uma turma de 1.117 novos policiais militares, no Quartel do Derby. Flávio foi autuado em flagrante nesse domingo após ter assassinado o cabo Adriano Batista da Silva, 42, depois de uma dicussão sobre cotas raciais dentro de uma viatura do 11º Batalhão, na qual trabalhavam no bairro de Apipucos.

Flávio Oliveira está detido no Creed, em Abreu e Lima. Foto: Divulgação
Flávio Oliveira está detido no Creed, em Abreu e Lima. Foto: Divulgação

O Cabo Adriano levou um tiro na cabeça enquanto dirigia a viatura da Patrulha do Bairro Guabiraba/Pau Ferro. O disparo foi efetuado pelo colega de plantão que estava no banco de trás do carro. O crime ocorreu por volta das 8h na Rua João Batista de Rego Barros. Adriano Batista chegou a ser socorrido para o Hospital da Restauração, mas não resistiu ao ferimento. Era o último plantão dele antes de entrar de férias. O corpo do militar será sepultado na tarde desta segunda-feira, no Cemitério Parque das Flores, no Sancho.

Cabo Adriano Batista foi morto dentro da viatura policial. Foto: Dilvulgação
Cabo Adriano Batista foi morto dentro da viatura policial. Foto: Dilvulgação

“Ele já foi punido criminalmente com a autuação em flagrante, encaminhado ao Creed (Centro de Reeducação da Polícia Militar) e o inquérito militar deve ser concluído de forma rápida. Além disso, existe o processo de licenciamento, como ele tem menos de dez anos de serviço, então, o processo de expulsão vai ser rápido. Eu não vejo outra alternativa a não ser a expulsão dele diante do crime bárbaro que ele cometeu”, destacou Alessandro Carvalho, secretário da SDS.

Anúncio da expulsão foi feito durante formatura de novos PMs. Foto: Wagner Oliveira/DP/D. A Press
Anúncio da expulsão foi feito durante formatura de novos PMs. Foto: Wagner Oliveira/DP/D. A Press

Dentro da viatura também se encontrava a policial Thaena de Lima Lemos Santos, que não ficou ferida, mas ficou  em estado de choque. De acordo com informações da PM, a confusão começou logo após o trio sair para o plantão. O cabo Adriano decidiu voltar à sede do batalhão para deixar o soldado, por seu comportamento exaltado durante um debate sobre cotas raciais. As primeiras informações repassadas por Thaena indicam que a vítima era contra o projeto das cotas e o colega, a favor.

A polícia que precisa de polícia

Do Diario de Pernambuco

Em um mesmo fim de semana, três policiais foram vítimas da violência. Na noite da sexta-feira, o delegado da Polícia Civil Joel Venâncio foi assaltado no bairro de Porta Larga, em Jaboatão dos Guararapes. No sábado, a policial civil de Porto de Galinhas Tatiana Ribeiro de Melo reagiu a um assalto e acabou baleada e morta, em Abreu e Lima. Ontem, em Apipucos, no Recife, outra morte. Desta vez, um policial militar, do banco de trás da viatura, matou um colega de trabalho, o cabo Adriano Batista.

Crime aconteceu na manhã do domingo. Foto: João Velozo/ Esp. DP/ D. A Press
Crime aconteceu na manhã do domingo. Foto: João Velozo/ Esp. DP/ D. A Press

O PM Adriano Batista da Silva, 41 anos, tirava o seu quarto plantão com o soldado Flávio Oliveira, descrito por ex-companheiros de batalhão como “problemático”. O soldado passou mais de um ano em reabilitação por abuso de álcool e já havia passado por intervenção cirúrgica neurológica. Foi considerado apto a oferecer seus serviços à população pelo setor de psiquiatria da corporação. Ele puxou o gatilho por conta de uma suposta discussão iniciada minutos antes sobre cotas raciais.

“O que prevalece na instituição não é transferir, mas tratar o problema. A PM está pautada nos princípios de direitos humanos para lidar com a sociedade e também com o quadro interno”, afirmou o diretor-adjunto de articulação social e direitos humanos, major Cláudio dos Santos Silva, do grupo de trabalho criado em 2013, que promove palestras, inclusive, sobre questões étnico-raciais “a exemplo do atual curso de formação de soldados, com 1.117 policiais militares, que estudaram a disciplina de diversidade étnico-sociocultural”, como frisa a nota emitida pela corporação.

O Comando Geral também empenhou o Centro de Assistência Social, o departamento médico e representantes de todos os batalhões, a fim de compreender os motivos do que considera uma “solução fútil e covarde com que se deu o desfecho do caso”.

Para o presidente da Associação de Cabos e Soldados de Pernambuco, Alberisson Carlos, o caso não é pontual. “Há uma pressão enorme por resultados na diminuição do Crimes Violentos Letais Intencionais, de modo a chegar a obrigar-se que um policial problemático, que não deveria estar nas ruas, seja escalado. Há vários outros com problemas de saúde. Desse (Flávio), todo mundo sabia”, lamenta. Segundo ele, não há acompanhamento psicológico sistemático, os PMs não passam por uma formação continuada e as chamadas “reciclagens” acabam inviabilizadas por conta das escalas.

Não foi o primeiro caso de assassinato de um policial por um colega. Há um mês, o escrivão Luciano José Gonçalves Bezerra, 36, foi morto por um agente da Polícia Civil, em Triunfo. Em março, o PM baiano Mauro Simões foi morto a tiros em Petrolina por um policial civil de Araripina. Ambos, por desentendimentos. Os dois policiais civis assaltados no fim de semana não estavam no exercício da profissão. Fora de serviço, engrossaram as estatísticas dos quase 200 assaltos diários que somaram 33,9 mil casos (entre os registrados) apenas no primeiro semestre de 2015.

A chance de um novo começo

Aos 15 anos, Rafael* não sabe ler nem escrever. Trocou a sala de aula pelas drogas desde cedo. Começou experimentando maconha, passou pela cola e há mais de um ano foi apresentado ao crack. “Eu vendia pedras quando um homem me ensinou a fumar. Fiquei viciado na primeira vez que usei.”

Belmonte está ajudando o adolescente. Foto: João Velozo/ Esp. DP/ D. A Press
Belmonte está ajudando o adolescente. Foto: João Velozo/ Esp. DP/ D. A Press

Para sustentar a dependência, invadiu duas vezes a Casa-Museu Magdalena e Gilberto Freyre, em Apipucos, de onde levou objetos de prata e ouro. Após confessar os furtos à mãe, o garoto foi surpreendido pelo gesto de um policial federal, que se ofereceu a ajudá-lo no tratamento contra as drogas.

A mãe de Rafael, uma dona de casa de 37 anos, lutava há meses para internar o filho. Depois que o menino assumiu as infrações, ela telefonou para a Polícia Federal e contou o que aconteceu.

Vinte medalhas e uma caneta foram recuperadas. Foto: Polícia Federal/Divulgação
Vinte medalhas e uma caneta foram recuperadas. Foto: Polícia Federal/Divulgação

“Os policiais vieram à minha casa e perguntaram se meu filho havia chegado com algum objeto de ouro ou de prata. Eu disse que não vi nada. Sepois questionei meu filho e ele confessou”, disse a dona de casa.

O que a mãe não esperava era que um dos agentes da PF pudesse mostrar um caminho para acabar com o problema que tirava o sossego da família. “O policial perguntou se aceitaríamos que nos ajudasse a livrá-lo das drogas. Fiquei emocionada. Foi um anjo que apareceu na minha vida.”

O anjo a quem ela se refere é o agente Ricardo Belmonte. Policial federal há 19 anos, ficou comovido com a situação. “Faço parte de uma igreja que ajuda uma clínica de recuperação e perguntei se o garoto gostaria ser levado para lá. Ele e os familiares aceitaram na hora. Acredito nas pessoas e senti que o adolescente quer mudar de vida.”

O adolescente chegou a vender roupas e pedir dinheiro para comprar crack. “Não quero mais usar”, diz. Sem saber o valor das peças que furtou, ele vendeu tudo por R$ 2 mil.
“Paguei R$ 50 que devia a um colega e o restante gastei com drogas”, confessa. Ontem, Belmonte, o garoto e sua mãe foram ao Centro de Recuperação de Dependentes de Drogas, em Igarassu. “Fui ao Conselho Tutelar e pedi autorização para mandar meu filho à clínica. Tenho fé que ele vai se recuperar”, aposta a dona de casa.

*nome fictício