Marcelo, o primeiro homem trans da Polícia Militar de Pernambuco

O soldado Marcelo Viana dos Santos, 30 anos, é o único homem trans da Polícia Militar de Pernambuco (PMPE). Quando entrou na corporação, em 2010, identificou-se como mulher. Apesar de estar em processo de transformação amadurecido, temia não ser aceito nos quadros da PM. Deu uma pausa na própria história como homem trans.

A preocupação de Marcelo tinha sentido. Na época, o edital do concurso previa eliminação do candidato transexual com base nas patologias constantes no CID 10 (Classificação Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde), publicada pela Organização Mundial de Saúde (OMS).

Marcelo hoje é casado com Jaqueline. Foto: Rafael Martins/ Esp. DP
Marcelo hoje é casado com Jaqueline. Foto: Rafael Martins/ Esp. DP

Marcelo está com a transição completa. Fez mastectomia. Usa barba e hormônio diariamente. É casado com a servidora pública Jaqueline Martins, 40, mãe de quatro filhos. Na PM, trabalha na Diretoria de Articulação Social e Direitos Humanos. Hoje tem garantido o direito de usar o banheiro masculino e ser tratado com dignidade, conta.

A conquista aconteceu após um processo sofrido, do qual não gosta de falar. Por determinação da Secretaria de Defesa Social, na época, foi removido de um batalhão para o Quartel do Derby. A vaga de soldado na PM sempre foi um sonho. Alimentado por um tio querido, que costumava lhe entregar o quepe de policial rodoviário federal nos encontros ainda na infância.

A passagem de Marcelo pela PM tem um sentido único para ele. A necessidade de pessoas trans ocuparem vagas de trabalho de importância primordial no combate à transfobia, como Justiça e polícias. “A sociedade está acostumada a marginalizar as pessoas trans, ofertando trabalhos secundários. O que mais vemos são homens e mulheres trans sendo violados e com medo de serem ridicularizados e tratados mal quando procuram a polícia. Se ocuparmos esses espaços, o tratamento com as pessoas trans será diferente”, reflete.

A história de Marcelo é simbólica porque ele não teme contá-la. Com isso, ajuda outras pessoas a enfrentarem o problema. Em um processo particular que envolveu muita tristeza, dúvidas, embates com a família e consigo próprio, ele parece ter vencido a parte mais difícil. Hoje se diz feliz. É um soldado trans da Polícia Militar de Pernambuco.

Concurso da Polícia Militar mantido pela Justiça

O pedido de liminar que solicitava a suspensão do concurso público da Polícia Militar de Pernambuco, marcado para o domingo, não foi acatado pela Justiça. A decisão foi proferida pelo juiz da 2ª Vara da Fazenda Pública da Capital, Évio Marques da Silva.

A ação havia sido interposta contra o estado e o instituto organizador do certame, o Iaupe, e solicitava a anulação do item prescrito no edital que previa a eliminação de candidato identificado como transexual durante a etapa do exame médico. Como consequência, pleiteava a reabertura das inscrições com essa modificação no edital.

Foto: Jaqueline Maia/DP
Provas para candidatos que querem entrar na PM acontecem neste domingo. Foto: Jaqueline Maia/DP/Arquivo

O juiz considerou que a suspensão do concurso prejudicaria os inscritos, o estado e a empresa organizadora. O magistrado justificou que o edital do concurso da PM não impedia a inscrição das pessoas transgêneros. “Como se vê, mesmo existindo uma disposição (no edital) que em tese vedaria transexuais no âmbito da corporação militar, a realidade fática se apresenta diferente, posto que os ditos trans ocupam cargos na PMPE, conforme relatado pelas matérias jornalísticas acostadas pela demandante”, afirmou.

“Apesar de o edital ter sido deflagrado no dia 25 de março de 2016, apenas na semana que antecede a primeira fase do certame seu teor é questionado. Ora, se a demandante desde o início se sentiu prejudicada com as disposições colocadas pela administração, conforme deixou transparecer na exordial, de logo deveria ter se insurgido, evitando, portanto, dispêndio financeiro significativo por parte dos réus para garantir toda logística necessária para executar um concurso público com tantos inscritos”, justificou.

Em 17 de maio, a Secretaria de Defesa Social (SDS) decidiu rever o item do edital, após a polêmica provocada pelo assunto, atendendo a uma demanda do Ministério Público de Pernambuco.