A Delegacia de Serra Talhada estava lotada ontem. Pelo menos oito pessoas prestaram depoimento ao delegado Isaías Novaes, designado especialmente para apurar os crimes. Enquanto as mortes não são esclarecidas, a população segue com medo.
José Adelmo da Silva, 50, tem um pequeno comércio no bairro de Bom Jesus e contou que a violência aumentou muito nos últimos meses. “Cheguei aqui no mês de outubro e estava tudo calmo. Do começo do ano para cá, estão acontecendo muitas mortes e assaltos. Ainda bem que a polícia agora está pelas ruas”.
Na semana passada, o secretário de Defesa Social, Alessandro Carvalho, o comandante da PM, coronel Carlos Pereira, e o chefe da Polícia Civil, Osvaldo Morais, estiveram na cidade e disseram que todos os esforços serão feitos para trazer a tranquilidade de volta. Um reforço no policiamento, feito pelos policiais do 14º Batalhão da Polícia Militar, com o apoio da Companhia Independente de Operações em Área de Caatinga e do Gati está em curso.
O delegado Osvaldo Morais alertou que a preocupação com a cidade já estava na agenda da Polícia Civil antes das mortes acontecerem. “O delegado Isaías Novaes, que vem do DHPP do Recife, vai somar esforços com todos que estão na cidade para solucionar esses crimes e evitar que ocorram outros”, destacou Osvaldo.
Por determinação da SDS, as investigações são sigilosas. Segundo o prefeito Luciano Duque (PT), o Conselho de Segurança decidiu não adotar toque de recolher visto que as viaturas policiais estão circulando por todas as áreas.
Uma briga de famílias é a principal hipótese investigada pelos cinco delegados que apuram os 18 homicídios ocorridos nos três primeiros meses deste ano em Serra Talhada, a 415 km do Recife, no Sertão. O número de assassinatos, que já é igual ao do ano de 2013 todo, acendeu a luz de alerta da cúpula da segurança pública estadual.
Um ex-policial militar, de identidade preservada, está sendo investigado como suspeito por duas mortes no último dia 22 de março, quando foram baleados, perto de um bar no Centro, João Carlos Epaminondas, 44, e o primo dele, o policial militar Geovane Alves Pereira, 37, que era lotado no Rio Grande do Norte. Naquele mesmo fim de semana, outras três pessoas foram mortas em locais públicos e houve duas tentativas de assassinato.
Viatura da Polícia Militar faz rondas pela cidade. Foto: Annaclarice Almeida/DP/D.A.Press
Dos cinco mortos, três são da família Pereira, incluindo Olímpio Pereira Júnior, 39, que chegou a ser socorrido e levado para um hospital, mas não resistiu. A polícia investiga se há uma guerra com outra família ou se trata-se de um conflito interno, envolvendo diferentes clãs. As outras duas pessoas que morreram no violento fim de semana, um casal identificado como Antônio Ferreira da Silva, 33, e Eliene Pereira Lima, 27, não seriam a princípio, ligadas à família, mas tudo ainda está sendo investigado. Após a onda de homicídios, uma força-tarefa foi montada na cidade para tentar esclarecer os casos e prender os suspeitos. A população está assustada com o aumento da violência e o clima é tenso.
Conhecido da polícia e dos moradores da cidade pelo histórico do envolvimento em crimes de execução, João Carlos Epaminondas chegou a passar vários anos preso. Recentemente estava cumprindo prisão domiciliar, mas acabou ganhando a liberdade no fim do mês de janeiro. Isso porque no dia do seu julgamento as testemunhas não comparecerem ao Fórum, pois não haviam sido notificadas. A Justiça, então, acabou concedendo a liberdade ao acusado.
Fontes da polícia acreditam que a morte de João Carlos, conhecido como Galeguinho de João de Tonhé, foi uma forma de vingança relacionada às muitas mortes que ele teria praticado nos anos de 1990 em Serra Talhada. O cidadão, que já chegou a trocar tiros com PMs e confessou a morte de um homem que teria matado seu pai num assalto, estava com novo julgamento marcado para junho deste ano. “Acreditamos que só estavam esperando ele aparecer na rua para matá-lo. Esse homem já assassinou muita gente e as famílias estão se vingando”, contou um policial em reserva.
Memória
Brigas de família no interior do estado
Exu
A terra de Luiz Gonzaga, no Sertão, foi palco por mais de 30 anos de uma guerra política entre famílias. Os moradores viveram décadas de medo devido às lutas entre as famílias Alencar e Sampaio. Mais de 40 mortes foram registradas durante o conflito, que só acabou depois de muitos acordos de paz frustrados. O alvo da briga entre os clãs era o poder político da cidade.
Cabrobó
Numa guerra que durou 14 anos no Sertão, um total de 150 pessoas foram assassinadas entre as cidades de Cabrobó e Belém de São Francisco. Cinco famílias disputavam o poder na região e os membros acabaram pedindo ajuda da Justiça para encerrar com a matança.
Floresta
Outro caso no Sertão do estado é a guerra entre as famílias Ferraz e Novaes, em Floresta. A rixa teve início em 1913 pela disputa do poder. Depois de alguns anos de paz, os assassinatos voltaram nos anos 1990. Em 1992, o prefeito Francisco Ferraz Novaes foi morto.
Itaíba
O município do Agreste, onde em outubro de 2013 foi morto o promotor de Justiça Thiago Faria Soares, ganhou fama nos anos 2000 por ter um Triângulo da Pistolagem, motivado por disputas de terra. O fazendeiro José Maria Pedro Rosendo Barbosa, apontado como o mandante da morte do promotor, também foi acusado de mandar matar, em 1990, o prefeito de Águas Belas, Hildebrando Lima.