Tolerância zero

 

Mesmo sem fazer teste do bafômetro ou exame de sangue para comprovar a embriaguez, os motoristas que dirigirem após consumir bebida alcoólica podem responder criminalmente pelo ato.

Isso porque a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou ontem o Projeto de Lei do Senado (PLS) nº 48, que impõe tolerância zero e punição a todos os condutores que guiarem sob o efeito de qualquer concentração de álcool no organismo — a lei atual prevê que a pessoa flagrada com até 0,29 miligrama de álcool por litro de ar expelido pelos pulmões seja punida apenas administrativamente.

O PLS foi apreciado pela comissão em caráter terminativo, ou seja, sem necessidade de ir ao plenário, e segue agora para avaliação na Câmara dos Deputados.A adição de novos parágrafos ao artigo 306 da Lei Federal nº 9.503/1997 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) aumenta também o rigor para motoristas que, ao dirigirem sob o efeito de álcool, causarem mortes no trânsito.

A penalidade pode chegar a 16 anos, conforme emenda do senador Demóstenes Torres (DEM-GO). Na redação original, de autoria de Ricardo Ferraço (PMDB-ES), a punição em caso de morte chegava a 12 anos de reclusão.

Se o acidente provocar lesão gravíssima, os condutores estarão sujeitos a penas de seis anos a 12 anos, enquanto para lesão corporal grave, a sanção varia de três anos a oito anos. Já as consideradas leves, de um ano a quatros anos de detenção.

A proposta ainda sugere que a comprovação da embriaguez seja feita não apenas por meio do teste do bafômetro ou de exame de sangue, mas também por “meios que permitam certificar o estado do condutor, inclusive prova testemunhal, imagens, vídeos ou outras provas em direito admitidas”.

Para o senador Ricardo Ferraço, o projeto vai penalizar com rigor os motoristas que insistirem em dirigir embriagados. “É tolerância zero. A pessoa tem que ser punida gerando, ou não, qualquer tipo de lesão no trânsito. Beber e dirigir é como andar com uma arma sem ter porte. Não precisa utilizá-la para ser criminoso”, ressalta o autor da proposta.

Durante a leitura do relatório, na manhã de ontem, o senador Pedro Taques (PDT-MT) acatou a emenda do senador Demóstenes Torres (DEM-GO) que propôs aumentar as penalidades para 12 e 16 anos de reclusão em casos de lesões gravíssimas ou morte, consecutivamente. O texto inicial previa a pena máxima de 12 anos.

“O entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre ninguém ser obrigado a produzir provas contra si, desmoralizou o bafômetro e deixou de comprovar a embriaguez dos motoristas. Se o projeto for aprovado, vamos resgatar essência da lei seca, que produziu resultados importantes e registrou redução no número de acidentes fatais no Brasil”, afirma Ferraço.

Na Câmara, a proposta vai passar por comissões e seguir para votação em plenário. Se a redação for alterada, volta para o Senado, onde as sugestões serão analisadas e corrigidas, caso seja esse o entendimento dos senadores.

Para o advogado criminalista Antônio Alberto do Vale, o projeto é bom no que diz respeito a punir criminalmente a embriaguez ao volante. Entretanto, ele diz que os critérios usados pelos agentes de fiscalização para determinar se a pessoa consumiu ou não álcool podem ser alvo de contestação. (Kelly Almeida e Mara Puljiz)

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Mais rigor
O Projeto de Lei nº 48 acrescenta parágrafos ao art. 306 da Lei Federal nº 9.503/1997, do (CTB) e torna mais rigorosa a punição aos motoristas que dirigem sob o efeito de qualquer concentração de álcool. Veja as mudanças:

Lei atual:
É considerado crime dirigir estando com concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a seis decigramas, ou sob a influência de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência. Atualmente, a pena para quem dirige embriagado é de seis meses a três anos de detenção, além de multa. O motorista pode ainda ter suspenso o direito de dirigir.

Como pode ficar:
É crime conduzir veículo automotor sob influência de qualquer concentração de álcool ou substância psicoativa que determine dependência. Se aprovado, o projeto prevê pena de até 16 anos de reclusão ao motorista que, alcoolizado, provocar acidente que resulte em morte. As penalidades para envolvimento em colisões leves, graves e gravíssimas também serão mais rigorosa, com variação de um a 12 anos de prisão ou detenção. Em caso de recusa à realização do teste do bafômetro, a proposta também permite a comprovação da embriaguez por meio de provas testemunhais, imagens ou vídeos.

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Um levantamento divulgado recentemente pelo Ministério da Saúde, com base em dados do Sistema de Informações de Mortalidade (SIM), mostra que o Brasil registrou no ano passado 40.610 vítimas de trânsito. Acredita-se que, deste total, 70% estejam relacionados ao consumo ou abuso de bebidas alcoólicas. Nos Estados Unidos, as principais causas dos acidentes de trânsito são pais tentando acabar com brigas dos filhos no banco traseiro e o uso de laptops.

Uma campanha pela melhoria da acessibilidade

O acesso ao transporte coletivo é uma das reivindicações mais presentes no mundo de hoje. Além das tarifas caras e serviços de pouca qualidade, convivemos com a falta de veículos adaptados e profissionais preparados para o transporte de pessoas com diferenças significativas.

Esse vídeo mostra uma campanha da TV Vermelho que produziu dois vídeos para a campanha “Por um transporte acessível para todos”. Os vídeos também concorrem ao 11º Prêmio de Educação no Trânsito do Denatran.

Plano de carga e descarga do Recife não faz nem cosquinha

Na coluna Diario Urbano escrevi, no último dia 25 de outubro, sobre o plano de carga e descarga apresentado pela Prefeitura do Recife. Uma reflexão que vale a pena ver de novo.

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Um dos maiores obstáculos à mobilidade urbana nas ruas do Recife tem origem nos estacionamentos realizados em vias públicas. Sendo eles regulares ou não, atrapalham o trânsito. É ruim com carro pequeno, imagine então com caminhões de carga. Talvez por isso, havia uma grande expectativa em relação às novas normas apresentadas pela Companhia de Trânsito e Transporte Urbano (CTTU) referentes à operacionalização do sistema de carga e descarga.

O modelo tem pequenos avanços em relação à limitação dos horários, das 23h às 5h, e da inclusão de 21 corredores de tráfego, a exemplo da Avenida Conselheiro Aguiar, onde o desmando é diário. Mas peca em outros aspectos, a começar pelo valor de uma multa comum de estacionamento prevista no Código de Trânsito Brasileiro de apenas R$ 53,20 e três pontos na carteira. Só para lembrar, a proibição da circulação das kombis que faziam transporte alternativo só funcionou porque o valor da multa era de R$ 2 mil e o prejuízo seria grande para os kombeiros.

Além disso, a penalidade irá apenas para o dono do caminhão e não para o proprietário do estabelecimento. E mesmo na hipótese da multa vir a ser aplicada, uma vez que não há fiscalização suficiente, para o empresário valerá a pena correr o risco, que, aliás, não é dele. Não era bem isso que a presidente da CTTU, Maria de Pompéia, tinha em mente. Ela já havia sinalizado que a penalidade deveria se estender para o dono do estabelecimento e para o fornecedor e que o valor da multa deveria pesar no bolso, mas pelo jeito não vai nem fazer cosquinha.

A medida também não se estendeu aos bairros da periferia que hoje têm comércio e onde esse tipo de operação trava as vias estreitas. A Prefeitura do Recife talvez tenha perdido uma ótima oportunidade de fazer um marco na moralização da carga e descarga que traz impactos diretos na mobilidade. No lugar disso, criou 139 vagas de Zona Azul e travestiu de legalidade um tipo de serviço que, embora importante, não tem, até agora, nenhum respeito à livre circulação. Se os próprios técnicos da companhia defendem mais rigor na legislação para não ficarem de mãos atadas, quem sabe o plano, que só entrará em vigor em janeiro de 2012, possa ser aperfeiçoado e não passe de um engodo.