Montadoras deixarão de vender carros para vender mobilidade. Essa é boa!

Diretor da PwC afirma que automóvel é solução de transporte para parcela da população, e que trânsito caótico das grandes cidades se deve mais à infraestrutura deficiente do que à quantidade de veículos

Fabricantes de veículos se reuniram na capital paulista na segunda-feira (28) para discutir a sustentabilidade do automóvel. Representantes da Fiat, Volkswagen, Honda e GM, entre outras, demonstraram em números e slides como as montadoras estão se esforçando para aumentar a eficiência dos motores, reduzir emissões de gases estufa, melhorar processos industriais, minimizar resíduos e ampliar a reciclagem dos veículos.

No entanto, o impacto do carro sobre o trânsito das grandes cidades não fez parte do debate. Por isso, a Rede Brasil Atual conversou com Ernesto Cavasin, diretor da empresa de consultoria PwC, que abriu o seminário da indústria automobilística lembrando a importância da sustentabilidade e apontando tendências do mercado. “No futuro, as montadoras deixarão de vender veículos para vender mobilidade”, diz o analista. “Há limites no quanto você pode crescer.” Só que no curto prazo, segundo ele, dificilmente as empresas deixarão de mirar o volume de vendas como objetivo a ser alcançado.

Ernesto Cavasin acredita que combater o trânsito caótico das metrópoles brasileiras dificultando a produção de automóveis é “tampar o sol com a peneira”. Por isso, elogia a recente desoneração fiscal concedida pelo governo federal à compra de veículos. O problema da mobilidade descansa sobre a infraestrutura e o sistema de transportes públicos, que devem ser melhorados independentemente do desempenho da indústria automobilística. “A mobilidade é uma necessidade das pessoas”, lembra. “Elas devem ter o direito e condições de escolher como satisfazê-la, individual ou coletivamente.”

Você propõe que, no futuro, as montadoras deixem de vender veículos para vender mobilidade. Na prática, o que você quer dizer?

A indústria do automóvel passará por mudanças. Uma das soluções de transporte que pode ser um bom negócio é a mobilidade. Há limites no quanto você pode vender e crescer. Esse limite está longe de ser alcançado, mas existe. Não acredito que vamos deixar de vender carros, até porque o carro, em diversas sociedades, é um símbolo de status. Mas soluções diferenciadas e serviços serão agregados ao negócio. Um dos nichos que está surgindo é o que se chama de zipcar: você pega o carro num ponto da cidade, deixa em outro ponto duas horas depois e, ali, outra pessoa vai pegar o carro, levar pra outro canto e assim por diante. O próprio carro tem uma mobilidade e você buscará o mais próximo de você.

Isso supõe uma mudança no modelo de negócios das montadoras? Deixar de pautar-se por vendas cada vez maiores?

Não acredito que no curto prazo migraremos para um modelo diferenciado, mas parte do crescimento das montadoras e da indústria virá de soluções diferenciadas. As montadoras continuarão produzindo e vendendo e tendo seus consumidores fiéis. O que vai agregar valor são novos tipos de serviços que façam crescer o negócio. Isso vai depender da estratégia de cada empresa.

As montadoras têm se dedicado a reduzir o impacto ambiental de seus veículos, mas evitam discutir o impacto da venda cada vez maior de carros no trânsito das cidades.

Você não vai resolver o problema do engarrafamento tentando não vender mais carros. Pode até ajudar, mas não é a melhor maneira. A mobilidade é uma necessidade do ser humano, e o usuário irá buscá-la de uma maneira ou de outra. Daí que o problema esteja na falta de políticas públicas para sanar os problemas de mobilidade, e não na venda de carros. Há dez anos, Londres teve de restringir o acesso de veículos e cobrar taxas altas de pedágio. Em Berlim e Munique, se reduziu a oferta de estacionamentos no centro. Mas, ao mesmo tempo, elaboraram políticas eficientes de transporte público.

A redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para a venda de carros não acabará piorando o trânsito?

Com mais carros, há mais problemas. Mas a questão principal é a infraestrutura. O que o governo está fazendo ao reduzir o IPI é estimular a economia, e com a economia estimulada você consegue recursos para melhor executar políticas públicas. A mobilidade urbana é resultado de melhores estrutura viária e transporte público. Não adianta achar que a solução é diminuir ou restringir o acesso da população ao carro. Isso é tampar o sol com a pereira. O que se tem de fazer é dar condições para a população ter acesso a bens de consumo e a uma melhor qualidade de vida, ao mesmo tempo criando infraestrutura para que o bem comum seja preservado.

Como a indústria encara o desinteresse dos jovens pelo carro, que já é realidade em alguns países desenvolvidos?

O gosto vai de cada pessoa. Já o transporte e a mobilidade são necessidades básicas da sociedades, em qualquer lugar do mundo. Quando você traz um sistema público eficiente, você resolve parte do problema da mobilidade. Quando o transporte público não é eficiente, a pessoa tem de buscar soluções para sua mobilidade. É o caso do Brasil. Em São Paulo, temos uma malha de transporte público razoável, mas que necessita melhorias. Enquanto elas não vêm, as pessoas buscam alternativas. As motos, por exemplo. É um veículo automotor mais barato, mais acessível e que atende às necessidades de muita gente. Para algumas pessoas, o veículo acaba se tornando uma necessidade. A indústria automobilística acaba exercendo um papel importante ao viabilizar a mobilidade. E o governo facilita reduzindo impostos.

É equivocado o uso diário que se faz do carro em São Paulo?

O dono do carro tem toda a liberdade para escolher se usará seu veículo semanalmente ou diariamente. Em geral, quando a pessoa opta por um veículo próprio, ela leva em conta diversas questões. Primeiro, conforto e facilidade. É mais confortável você ir no seu carro do que, por ventura, num ônibus lotado. Depois, tem a economia de tempo e a praticidade. Mesmo com os problemas de trânsito que temos em São Paulo, ainda é mais rápido e confortável ir de carro na maioria dos casos. Porém, há pessoas que acham mais confortável ir de ônibus ou metrô, tranquilo, lendo um livro. A pessoa tem direito a optar, e deve haver infraestrutura para que ela possa exercer esse direito.

É sustentável todo mundo ter um carro em São Paulo?

Não podemos misturar sustentabilidade com praticidade. Não é prático e aplicável todo mundo ter um carro em São Paulo, porque não temos infraestrutura pra isso. Sustentabilidade é outra coisa. Pra saber se não é sustentável precisaríamos fazer análises maiores. O carro traz problemas hoje por falta de infraestrutura. Mas, o carro é um problema? Não. As decisões, a infraestrutura, o modelo de crescimento e desenvolvimento sem planejamento adequado é o que traz um problema – não o produto.

Fonte: Rede Brasil Atual

 

4 Replies to “Montadoras deixarão de vender carros para vender mobilidade. Essa é boa!”

  1. a consultoria e a industria nao tem culpa de defender essa posiçao. afinal foram pagos para isso. nunca nesse UNIVERSO vamos esbarrar com um dono de concessionaria/montadora falando bem de onibus ou discutindo ideias de como melhorar o transporte publico. eles querem melhor infraestrutura mesmo. mais pessoas andando rapido de carro entao mais clientes. logica pura e simples de mercado. O VERDADEIRO CULPADO dessa mazela na mmobilidade do brasil é o governo. nas tres esferas. esse sim tem poder parar mudar a cabeça das pessoas. encarando o metro com seriedade simplesmente conseguirao mudar a mentalidade das pessoas pra o transporte.

  2. Entrevista ridícula de uma pessoa ridícula que fala o que foi pago para falar. [2]

  3. Não encaro como matéria paga ou algo do gênero. Se você pega os EUA, as vias lá foram concebidas para facilitar a vida dos carros o que viabiliza, também, o transporte público terrestre, pois criou-se um ordenamento/planejamento. Aliás, é o que faltou e falta muito aqui.

    Aqui o que vemos são décadas sem investimento em infraestrutura capaz de atender uma demanda futura e não apenas atual, válido tanto para o transporte individual quanto o coletivo. Deixam as vias ficar saturadas com o crescimento da frota e isso impede ou dificulta a criação de corredores de transporte coletivo, pois se antes com alargamento, disciplinamento, rotas paralelas para desafogar as vias principais seriam coisas mais fáceis de serem praticas, hoje vemos apelo para elevados, túneis, além da revisão de fluxo de veículos até para minimizar o impacto dessas obras que demanda mais tempo de execução e interferem bastante num trânsito já caótico.
    Reclamam, por exemplo, de congestionamento próximo as estações do Leste-Oeste em obras e estão num ritmo lento, imagine se todas estiverem nessa situação tendo todo o tráfego de ônibus migrado para o misto?
    Outra, o carro é uma forma de mobilidade, só que povo esquece que não é o carro em si o problema, mas a forma como ele é usada – normalmente um único usuário.
    Quero ver se uma família – pais e filhos – iriam usar transporte coletivo para levar os filhos a escola e desta seguir para o trabalho tendo que depender do horário do ônibus, se vem ou não vazio, se para ou não próximo a escola, o trajeto que ele faz até ir a esses locais. É fácil defender transporte público quando muitos não são usuários ou parecem mais ambientalistas.
    Acredito que usuário de transporte público deve saber o quanto ruim é depender de um veículo que pode ou não vir, ter que ir para os ótimos TIs para tomar outros ônibus ou metrôs, fazer um verdadeiro “tour” em certos trajetos.
    Como dissera o entrevistado, o carro não é o problema, mas sim a forma como é usado. O bem de consumo garante vários empregos, aliás, se fizer uma comparação burra, se todos os brasileiros tivessem condições de ter um carro, no mínimo, popular, enquanto um ônibus que leva 80 passageiros é vendido por algo na casa dos R$ 130.000 e usa um combustível subsidiado, 80 passageiros comprando carros ao preço mínimo de 25.000, teríamos R$ 2.000.000 garantindo recolhimento de tributos maior na venda, taxas anuais idem, entre outras despesas – manutenção, combustível sem subsídio e o que é arrecadado destes serve para bancar a operacionalização do coletivo que garante uma menor quantidade de empregados na produção, postos de trabalho na operacionalização e por aí vai.
    O que seria ideal e a Europa mostra isso: cidades com infraestrutura adequada para o transporte público e particular, só que os usuários do particular usam o produto mais racionalmente, ou seja, quando se faz necessário – levar crianças a escola, ir as compras, emergência. Outras são pelo público.
    Lembrei que também se fala na questão de poluição e os carros iriam poluir bem mais. Será? Aqui se fala no Flex com uma dádiva por usar etanol que emite menos poluentes e faz parte de um ciclo renovável, só que os nossos Flex por não adotarem recursos cada vez mais disponíveis na Europa, terminam tendo autonomia pior por justamente não terem um afinamento capaz de tirar proveito dos dois combustíveis. Sendo assim, o que se vê é um crescente uso do diesel na Europa, fora os motores downsizing, ambos capazes em diferentes produtos, de gerarem médias de consumo na casa dos 20km/l e emitindo bem menos poluentes que o nossos supostamente ecológicos motores e se gastam menos combustíveis, menos se retira da natureza.
    Ainda há as boas práticas de uso do veículo particular como verificar na empresa aqueles que moram próximo criando rotas para que a cada dia um passe a pegar os outros evitando vários carros nas ruas com um só usuário; o governo que promete corredores rápidos e confortáveis ligando os eixos da cidade, se tivessem visão, fariam como há lá fora estacionamentos para autos próximos as estações/TIs fazendo com que os usuários de carro só fossem até este e o resto do caminho fosse feito pelo transporte público, como já fazem com os bicicletários, afinal nem todo mundo tem disposição ou o trajeto é seguro para se andar de bike.
    Por fim, soluções há e não é sugerindo deixar de vender carros, pois todos tem o direito de ter e usar. Infelizmente vemos é uma enorme falta de planejamento em vários pontos, inclusive na segurança e civilidade, pois andar a pé até a parada e desta para o trabalho ou residência é se expor, e muitos motoristas não respeitam ciclistas, o que é até irônico já que um dia você pode ser forçado a usar uma bike, mas enquanto condutor não respeitava os ciclistas.