Automóvel, o cigarro do futuro

Metade dos domicílios brasileiros já dispõe de pelo menos um veículo - Foto - reprodução/internet
Metade dos domicílios brasileiros já dispõe de pelo menos um veículo – Foto – reprodução/internet

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Isaac Edington

A questão real é esta: motorista, você não está no congestionamento, você é o congestionamento. Os carros são responsáveis por congestionamentos, essa é a conclusão do estudo Indicadores de Mobilidade Urbana, da Pnad, divulgado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

Isso parece óbvio para você? E, de fato, é. Segundo o Ipea, mais da metade dos domicílios brasileiros já dispõe de pelo menos um veículo para atender os deslocamentos de seus moradores, com forte tendência de crescimento da posse desse bem verificada nos últimos anos, principalmente depois que o governo passou a incentivar a compra de automóveis.

Se, por um lado, isso indica que a população está tendo acesso a carros, por outro significa grandes desafios para as cidades e seus sistemas de mobilidade, com reflexos diretos sobre a degradação das condições de mobilidade de todos. Viu? É óbvio.

Se continuarmos incentivando a compra de veículos, cada vez mais domicílios terão acesso ao veículo privado, já que quase metade deles ainda não possui automóvel. Um dos grandes desafios das metrópoles brasileiras é atuar fortemente para reverter essa situação. E, para tanto, é necessário inicialmente reconhecermos o óbvio. Não dá para continuar simplesmente colocando mais carros nas ruas e achar que tudo se resume a novas obras de infraestrutura como a única solução.

Do contrário, novos viadutos serão apenas caminhos mais rápidos de se chegar a novos congestionamentos, deixando os motoristas e passageiros cada vez mais estressados. Transporte público de qualidade e eficiente, políticas públicas e ações de estímulo a pedestres e ciclistas, implantação de sistemas públicos de bicicletas compartilhadas, hoje já presentes em mais de 500 cidades ao redor do mundo, de Dubai ao Havaí, e, agora, em Salvador, também são apontados como importantes para tornar as cidades lugares melhores, como relatou a conceituada revista britânica The Economist:

“As comunidades que têm investido em projetos para pedestres e para bicicletas têm se beneficiado com a melhoria da qualidade de vida, população saudável, maiores valores imobiliários locais e redução da poluição atmosférica. Assim, como o transporte público de massa modificou o desenvolvimento dos subúrbios das cidades, o aluguel de bicicletas está moldando os centros urbanos de maneira sutil.”

No entanto, no Brasil, o governo tributa mais as bicicletas do que os carros. Estudo divulgado pela Tendências Consultoria, realizado para a Associação Brasileira do Setor de Bicicletas (Aliança Bike), mostra que o imposto que incide sobre as bicicletas no país é de 40,5%, em média, contra 32% dos tributos no preço final dos carros. A falta de incentivo fica clara na comparação do IPI: a alíquota do tributo federal é de 3,5% para carros populares, ante 10% para as bicicletas produzidas fora da Zona Franca de Manaus.

Com isso, o Brasil tem umas das bicicletas mais caras do mundo. Caso a situação atual não encontre novos rumos, estaremos muito perto de concretizar a profecia do urbanista Jaime Lerner, ex-prefeito de Curitiba: “O carro é o cigarro do futuro”. Levando-se em conta a poluição proveniente dos veículos movidos a gasolina, óleo diesel e outros combustíveis, é inevitável a necessidade que países precisem adotar em futuro próximo medidas em favor da sustentabilidade também nessa área. Não há outra alternativa.

Assim como cigarros, os carros serão gradativamente proibidos nos locais públicos. Isto já acontece em várias cidades da Europa, Estados Unidos e Ásia, onde circular de carro pelo centro é um privilégio de poucos. O deslocamento diário será feito em um transporte público otimizado, seguro, e de qualidade. O automóvel será usado em viagens e para o lazer e não para ir e voltar todo o dia do trabalho.

Qualquer movimento diferente desse significa cidades caóticas, poluídas e cidadãos estressados e doentes. Mobilidade urbana no século 21 baseia-se no tripé infraestrutura, planejamento urbano e mudanças comportamentais, tanto dos gestores como dos usuários. É um esforço que depende do avanço dos “três pés” ao mesmo tempo.

Fonte: A Tarde (Via Portal Mobilize)

Compartilhamento de automóveis para uso urbano

 

 

Artigo do professor José Alex Sant´Anna, publicado no “Informativo Perkons – Notícias em Trânsito”.

Nas grandes cidades, os veículos particulares ficam mais tempo parados nas garagens e estacionamentos do que efetivamente sendo utilizados, durante todo o dia.

As pessoas que se deslocam para compras ou para o trabalho, que não tem uma rotina fixa e bem estabelecida dependem do veículo particular para seus deslocamentos, pois o transporte público é planejado e operado com o foco principal nas pessoas que se destinam a trabalho e escola em viagens rotineiras e pendulares (do tipo vai e volta).

Nas grandes cidades, qualquer pessoa que tenha alguma atividade que saia um pouco da rotina passa a depender do automóvel para seus deslocamentos e a vida moderna tem na variedade de atividades das pessoas uma de suas características.

Com a crescente dificuldade de estacionamento, principalmente nas áreas centrais das grandes cidades, uma nova modalidade de “propriedade” de veículos parece ser o próximo passo para facilitar os deslocamentos de grande parte das pessoas que atualmente utilizam o carro próprio, nas cidades.

Se o transporte coletivo atualmente é operado por empresas privadas sob o controle do poder público, o transporte individual poderá ser otimizado com a formação de “sociedades” que disponibilizem uma quantidade de veículos em áreas de estacionamento privado, estrategicamente distribuídas pela cidade, de forma a se tornarem acessíveis aos “sócios” para pronta utilização mediante identificação previamente preparada (carteira de sócio) e reembolso das despesas de uso (pagamento debitado em cartão de crédito em função do tempo e quilometragem de cada utilização).

Dessa forma os sócios terão acesso a veículos para seus deslocamentos, sem ter que procurar estacionamentos e sem a preocupação com a manutenção e guarda dos veículos que estaria transferida para a Empresa operadora (poderia ser uma Sociedade por Cotas, onde cada sócio seria um cotista).

Isso não é novidade. Ainda nos anos 70 do século passado, as primeiras iniciativas de utilização compartilhada de automóveis apareceram em Santa Mônica, nos Estados Unidos, com o nome de “car pool”. Pessoas que residiam em um mesmo bairro e trabalhavam em um mesmo local se associavam para compartilhar o mesmo automóvel com o objetivo principal de usufruir das facilidades das “faixas exclusivas” para veículos com duas pessoas ou mais. Como conseqüência imediata, as empresas que incentivaram o “car pool” reduziram significativamente o número de veículos estacionados em seus pátios, abrindo espaço para os clientes.

Em algumas cidades da Europa, a utilização de bicicletas “públicas” ou de empresas locadoras, mediante uma garantia monetária e, às vezes, pequeno pagamento para manutenção dos serviços, surgiu no último quarto do século XX, permitindo considerável melhoria da qualidade de vida dos cidadãos.

No caso dos automóveis, ainda não é comum locar veículos, no Brasil, embora tal atividade esteja aumentando consideravelmente, mas essa atividade se concentra em atender às demandas de longos períodos, principalmente semanas ou meses, e eventualmente um período de no mínimo 24 horas, mediante contrato específico.

O que se coloca agora para discussão não se trata de locação, nesses moldes, mas de propriedade compartilhada de veículos, disponibilizada para os sócios e gerenciada por uma empresa eventualmente formada pelos próprios proprietários (ou por empreendedores interessados). Em algumas cidades da Europa já começam a surgir iniciativas nesse sentido.

Os veículos seriam disponibilizados em garagens distribuídas pela cidade, para utilização imediata por parte do grupo de pessoas associadas na propriedade dos veículos com pagamento pelo uso e nos encargos de gerenciamento. Os veículos seriam utilizados por períodos curtos de tempo para um único deslocamento entre dois pontos da cidade e ao ser deixado em uma das garagens do “pool” seria disponibilizado para outro usuário.

Em outro segmento do setor de transportes, a propriedade compartilhada de aviões executivos e helicópteros é uma atividade bem sucedida no Brasil. Investidores adquirem esses veículos e os entregam a uma empresa gerenciadora que se encarrega da manutenção e operação com a garantia de disponibilidade por um número programado de horas mensais e eventual lucro resultante do aluguel da aeronave nos períodos que se encontra disponível.

A maior resistência a esse tipo de compartilhamento ainda é relacionada ao veículo automotor terrestre, tanto o automóvel como o veículo de carga; mas o que se espera ao colocar essa discussão é que as mudanças que vêm ocorrendo na sociedade contemporânea, levem à assimilação desse conceito de utilização compartilhada para o transporte individual urbano.

A dificuldade de estacionamento nas áreas centrais das grandes cidades e a modificação das atividades urbanas deste início de século, sugerem que o transporte individualizado sem rotas fixas e sem horários estabelecidos seja popularizado e o compartilhamento pode ser um caminho.

José Alex Sant´Anna
Professor da Universidade Federal do ABC
Dedica-se a pesquisas de Transporte e Trânsito Regional e Urbano

Vale transporte vitalício em VLT no centro, que tal?

 

 

Trem elétrico no centro de Murcia, na Espanha

 

 

Claro que aqui não temos mais os bondes operando no centro do Recife. Mas nunca é tarde para sonhar que os velhos trilhos possam ser reativados no sentido de reduzir o volume de carros na área central da cidade.

Na cidade de Murcia, na Espanha, a proposta do governo foi bastante tentadora e assimilada pela população. Lá, o dono de um automóvel pode fazer a troca do veículo por um passe vitalício para transitar na linhas de trens elétricos da cidade.

Bastava aos interessados ter um veículo em boas condições, com todos os tributos pagos, e fazer uma inscrição online no site da Tranvía Essa iniciativa marcou a primeira fase de uma campanha com o objetivo de diminuir a circulação de carros em suas ruas. Já pensou se essa ideia pega aqui?