Transporte público órfão de planejamento

Arte/DP.D.,A.Press

Por
Tânia Passos

A insustentável condição do transporte público no país, que se tornou uma das principais bandeiras das manifestações populares, não teve como único vilão o crescimento do transporte individual. Para entender o peso de um sistema de transporte ruim é preciso olhar o desmonte dos órgãos de planejamento nos últimos 20 anos. Em 1992, a Empresa Brasileira de Transportes Urbanos (EBTU), responsável pelo planejamento das políticas de transporte no país, foi extinta no governo do então presidente Fernando Collor. Junto com a EBTU, também se foi o corpo técnico do Grupo Executivo para Implantação de uma Política de Transportes (Geipot), que deu lugar à EBTU.

O órgão foi responsável por importantes contribuições ao setor no campo das pesquisas. Com a sua extinção, a função de planejar as políticas de transporte no país passou a ser dos municípios, mas muitos não fizeram sequer os seus próprios planos diretores urbanos (PDUs). Não por acaso, a Associação Nacional de Transportes Urbanos (NTU) elencou, na semana passada, oito medidas para a melhoria do sistema, e entre elas está a necessidade de os municípios elaborarem os planos de mobilidade.

A falta de técnicos nas prefeituras é um dos entraves. Em Pernambuco, o estado ajudou na elaboração dos planos de 30 dos 184 municípios. A lei que obriga a elaboração do PDU é de 2001, mas ainda há município engatinhando no processo. Já a Lei de Mobilidade Urbana (12.587/12) estabeleceu que até 2015 os municípios com mais de 20 mil habitantes terão que dispor de plano de mobilidade.

De acordo com o Ministério das Cidades, apenas 15 dos mais de cinco mil municípios brasileiros concluíram os seus. O documento do Recife não chegou a ser votado na Câmara de Vereadores e foi retirado pela atual gestão para análise. “O grito das ruas é resultado da ausência de políticas públicas voltadas para o transporte público. Estamos cientes que nosso modelo atual não é o melhor, mas há 20 anos que não se planejava nada, e a extinção da EBTU nos deixou orfãos”, criticou o presidente da NTU, Otávio Cunha.

O esvaziamento dos órgãos de planejamento também se deu na esfera estadual. De acordo com o especialista e doutor em planejamento de transporte público César Cavalcanti, nasceram no estado as duas mais importantes escolas de planejamento governamental do Brasil: o Instituto de Planejamento de Pernambuco – Condepe, fundado em 1952, primeiro órgão de planejamento da América Latina; e a Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene).

“A extinção deles nos deixou sem outra referência. Eles contribuíram não apenas no desenvolvimento de projetos, mas também na capacitação. Eu mesmo fui professor de vários cursos patrocinados pelo Geipot no Recife e em Brasília”, lembrou. A engenheira e ex-integrante do Geipot Regilma Souza também reclama a extinção do órgão. “Lamento a falta de capacitação. O corpo técnico deixou de ser renovado e hoje temos meia dúzia desses profissionais”. Também ex-técnico do Geipot, o engenheiro Erickson Dias não acredita mais que o país voltará a apostar em planejamento. “Os políticos querem improvisar de olho nos prazos eleitorais”, criticou.

A Sudene foi reativada no governo Lula, mas não conseguiu voltar a ser protagonista das políticas urbanas do Nordeste. Já o Condepe, extinto em 2003 no governo de Jarbas Vasconcelos, deu lugar à Agência Estadual Condepe/Fidem. A Fidem já era originária da antiga Fiam. “Para se ter uma ideia, o corpo técnico com os três órgãos juntos era de mais de mil técnicos. Hoje temos 124”, lembrou o presidente da Agência, Maurílio Lima, funcionário de carreira do Condepe há 32 anos.

Com a extinção dos órgãos de planejamento, surgiram as supersecretarias. No estado, o planejamento foi direcionado principalmente para as secretarias de Planejamento e das Cidades. Na esfera federal, a EBTU deu lugar à Secretaria de Desenvolvimento Urbano no governo de Fernando Henrique Cardoso e virou Ministério das Cidades no governo Lula. “Infelizmente os modelos mudam com os gestores e não dão continuidade e muito menos unidades aos projetos”, criticou Otávio Cunha, presidente da NTU.

Orgãos de segurança no trânsito sem integração

 

Os ministérios envolvidos na segurança do trânsito precisam melhorar seus canais de integração, concluíram os participantes da reunião promovida pela Frente Parlamentar em Defesa do Trânsito. Representantes de quatro ministérios (Desenvolvimento, Justiça, Cidades e Saúde), além da Secretaria Nacional do Consumidor, do Inmetro e da Organização Mundial de Saúde (OMS), discutiram as responsabilidades dos entes públicos na segurança dos veículos vendidos no Brasil.

Um exemplo da ausência de canais de comunicação foi citada pelo diretor de Divisão de Multas e Penalidades da Polícia Rodoviária Federal (PRF), inspetor Dias Rodrigues. Segundo Rodrigues, há uma grande quantidade de normas criadas por órgãos distintos. A fabricação de ônibus, por exemplo, é submetida a normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) que não se refletiam no Conselho Nacional de Trânsito (Contran).

“O que acontecia? Havia uma regra que definia como que esse veículo deveria ser fabricado, mas não tinha uma norma que traduzisse isso para os fiscais de trânsito. Consequentemente, ainda que aquele veículo fosse fabricado da forma correta, ele poderia sair dali, ser alterado, e continuar trafegando sem problema algum, já que não há vistoria que verifique se esse veículo respeita as normas de fabricação”, explicou, defendendo a integração dos órgãos que criam as normas e dos que fiscalizam os veículos.

Outro problema citado por Rodrigues é o fato de a legislação brasileira permitir que o veículo passe por alterações após a compra, sem que haja parâmetros para a inspeção veicular em termos de segurança.

O diretor do Departamento de Prevenção de Violência e Lesões da OMS, Etienne Krug, defendeu uma melhor coordenação do governo para que as decisões sobre segurança no trânsito sejam tomadas com mais rapidez. Ele reconheceu que o Brasil já avançou muito na área, citando a Lei Seca (Lei 11.705/08), uma referência no exterior, mas ressaltou que ainda há muito o que melhorar.

“O número de mortos no Brasil, quase 44 mil, continua sendo enorme, então mais esforços são necessários. Um esforço político do alto nível seria um apoio muito importante para estimular todas as partes da sociedade”, afirmou Krug.

O presidente da frente parlamentar, deputado Hugo Leal (PSC-RJ), disse que a reunião serviu para mostrar a necessidade de melhorar os testes veiculares no País. Para ele, um dos caminhos é a ampliação do grupo de trabalho de segurança veicular do Contran e a criação de outro grupo de trabalho no âmbito do Ministério do Desenvolvimento.

“O que você precisa fazer é aliar a política industrial e econômica, que é feita pelos ministérios da Fazenda e do Desenvolvimento, com a indústria de segurança”, defendeu o deputado. “Essas divergências ocorrem por falta de diálogo, por falta de interação.” Segundo a representante do Ministério do Desenvolvimento, Margareth Medine, a criação do grupo de trabalho será discutida.

Hugo Leal acredita ser necessário unir o debate da política industrial com a política de segurança. O próximo passo da frente parlamentar é debater recursos orçamentários para a criação de um laboratório de testes para a segurança veicular, para que a análise de recalls não fique a cargo exclusivamente das informações prestadas pelas fabricantes de veículos.

Com informações da Agência Câmara