Os descaminhos de quem anda a pé na Região Metropolitana do Recife

 

Vegetação invade área vegetação invade área do passeio na PE-15 - Foto - Jo Calazans pedestre
Vegetação invade área do passeio na PE-15 – Na foto a jornalista Eva Duarte – Foto – Jo Calazans – DP/D.A.Press

O mundo real de quem precisa caminhar todos os dias pelas calçadas da Região Metropolitana do Recife está a anos-luz do mínimo de razoabilidade. Isso significa ignorar um universo de cerca de 1,5 milhão de pessoas que precisam se deslocar a pé todos os dias.

Lixo na calçada também atrapalha a mobilidade do pedestre Foto Jo  Calazans DP/D.A.Press
Lixo na calçada também atrapalha a mobilidade do pedestre – Foto Jo Calazans DP/D.A.Press

Um público que permanece à margem das políticas públicas e nem é conhecido dentro de sua totalidade, já que a última pesquisa de origem e destino da RMR é de 1997, sendo atualizada em 2008 sem pesquisa de campo. O pedestre sequer é lembrado como elemento primário do sistema viário e é obrigado a andar por calçadas precárias, por vezes inexistentes, ou ainda obstruídas e sem conexão entre os caminhos.

Pedestre se equilibra no meio fio por falta de espaço
Pedestre se equilibra no meio- fio por falta de espaço na PE-15, por onde irá passar o corredor do BRT – Foto- Jo Calazans DP/D.A.Press

Não se vislumbra o que deveria ser um dever de casa básico para a ocupação dos espaços urbanos. E muito menos do que deveria ser um caminhar seguro e confortável.

Nós acompanhamos a saga da jornalista Eva Duarte, 43 anos, que se desloca a pé de duas a três vezes por semana pelas calçadas quase inexistentes da PE-15, em Olinda, um dos principais trechos do futuro corredor Norte/Sul do BRT (Bus Rapid Transit). Enquanto viadutos e estações se descortinam ao longo do corredor, as calçadas ainda não receberam nenhum tipo de tratamento para atender com o mínimo de dignidade o pedestre.

Quando há  calçada, o espaço serve de extensão de serviços - Foto - Jo Calazans DP/D.A.Press
Quando há calçada, o espaço serve de extensão de serviços – Foto – Jo Calazans DP/D.A.Press

Não é preciso percorrer grandes distâncias para se descobrir tudo o que não deveria acontecer na área do passeio. O trecho de 500 metros entre a Rua Romeu Jacobina de Figueiredo, em Ouro Preto, Olinda, onde ela mora, até a parada de ônibus, é um exemplo. Mesmo percorrendo o trecho mais de uma vez por semana, ela não deixa de se indignar uma única vez. E chega a interpelar os outros pedestres no meio do caminho, provocando reações. A vontade, que não é só dela, é de criar um movimento de conscientização pelos direitos do pedestre. “Somos a minhoca da cadeia alimentar do trânsito”, desabafa.

Eva fala com conhecimento de causa. No percurso que costuma fazer, passa por buracos de obras onde deveria haver calçada, se equilibra no meio-fio por ausência do passeio, salta para se livrar de trechos alagados e ainda passa por uma área coberta de vegetação, que mais parece uma trilha.

Depois de enfrentar esse trecho, Eva finalmente chega a um quarteirão com calçada. Deveria ser melhor, mas não é. Em trecho curto, ela passa por um lixão em plena área do passeio e se esquiva de duas oficinas que usam o espaço como extensão dos seus negócios.

Dificuldade de travessia na via. Não há espaço seguro para o pedestre. Foto Jo Calazans DP/DF.A.Press
Dificuldade de travessia na via. Não há espaço seguro para o pedestre. Foto Jo Calazans DP/DF.A.Press

Para chegar à parada de ônibus, ela ainda atravessa a pista sem faixa de pedestre. À noite, a situação se agrava. “A iluminação é péssima e se torna mais perigoso fazer esse percurso”, diz. Sem muita esperança de que a situação mude a curto prazo, ela decidiu adotar um esquema que a permite sair o menos possível. “Trabalho em casa, faço faculdade à distância, vou para o bar da esquina e namoro em casa. Mas isso tudo é, na verdade, imobilidade”, criticou.