Calçadas esburacadas, piso desnivelado, ocupação irregular. Está cada vez mais difícil circular a pé e com segurança no Recife. Os pedestres somam hoje quase 30% de todos os deslocamentos feitos no Brasil por dia, segundo o IBGE. A qualidade do passeio, porém, segue na contramão, a reboque da demanda. Um projeto de lei em tramitação na Câmara de Vereadores do Recife reacendeu a discussão sobre a construção e conservação desta área. Afinal, esse é um papel do morador do imóvel ou do poder público? O projeto pretende transferir a competência do usuário para a prefeitura, em grande parte das situações. Em maio, a calçada recifense foi eleita a quarta pior do país pela ONG Mobilize Brasil, dentre 12 cidades visitadas neste ano.
Se tudo correr como o planejado, a prefeitura será obrigada a construir as calçadas, livrando o morador. E não é só isso. Do Executivo também seriam exigidos os reparos, caso alguma irregularidade seja flagrada pela Dircon e o dono ou inquilino não tenham condições de arcar com a obra. Hoje, quando isso acontece, o poder público pode, mas não é obrigado a fazer os serviços. A meta é substituir, na lei, a palavra “pode” pela “deve”, fechando o cerco. Outra alteração é que o passeio tenha, no mínimo, 1,5 metro de largura. O espaço reservado aos postes de iluminação pública e placas ficaria de fora desse trecho.
O projeto de lei passou pelas comissões de Finanças, Obras e Transporte e Meio Ambiente, porém estancou na de Legislação por “estar invadindo a competência do Poder Executivo”. “A ideia não foi finalizada, mas abre a discussão”, disse a vereadora Priscila Krause (DEM), autora da ideia. A previsão é de que o projeto modificado seja votado em plenário até dezembro. A assessora executiva da Secretaria de Controle e Desenvolvimento Urbano, Glória Brandão, comentou as mudanças. “Pode ser que o projeto não encontre amparo na legislação federal. Ele seria injusto em alguns aspectos. Vamos analisá-lo”, resumiu.
Francisco Cunha, do Observatório do Recife, defende a criação da uma secretaria específica para as calçadas. “Elas estão em péssimo estado, privatizadas”. Para o diretor-geral do Instituto de Arquitetos do Brasil, Ricardo Pessoa de Melo, as alterações são boas. “A iniciativa é louvável. O atual modelo da cidade não funciona”, acrescentou o diretor. O professor do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da Unicap, Arthur Baptista, chama a atenção para a acessibilidade. “Para quem tem dificuldade de locomoção é quase inviável usar as áreas, porque elas são estreitas”, acrescentou. Ontem, o Diario percorreu algumas vias do Recife para analisar a situação das calçadas. Segundo moradores e passantes, a lista de problemas só faz aumentar. Em maio, o comerciante Paulo Farias, 47 anos, caiu em um buraco na Rua do Príncipe. Ele usou as mãos para livrar a perna. “Quase quebro a perna direita por pouco”, disse.