Previdência ameaçada no futuro com mortes de jovens no trânsito

 

Eduardo Biavati - Foto - Bernardo Dantas DP/D.A.PressFoi no início da década de 1990 que o sociólogo Eduardo Biavati foi chamado para fazer parte de uma pesquisa na rede hospitalar Sarah Kubitschek, em Brasília. A missão era identificar as causas dos atendimentos de pacientes vítimas de lesão medular e cerebral.

Identificar e desenvolver ações de prevenção. O trânsito era o vilão da maior parte dos atendimentos. Desde então, o sociólogo tem atuado na área de educação do trânsito e hoje é um dos mais requisitados profissionais do país na defesa do tema. Atualmente, é consultor de trânsito do Detran no Rio Grande dos Sul.

Recentemente, esteve no Recife para participar da 1ª Conferência Interdisciplinar Universitária de Trânsito, promovida pela UPE/FCAP. Uma de suas preocupações é a educação do adolescente, futuro motorista, mais facilmente influenciado pelo grupo.

Para ele, não bastam as ações voltadas para as crianças. A lacuna educacional está justamente no jovem, as maiores vítimas do trânsito. As mortes prematuras trazem um impacto direto nas contas da previdência. Na entrevista, ele alerta que os idosos de amanhã podem ficar sem a renda da aposentadoria, caso a futura mão de obra continue a morrer no trânsito. Acompanhe a entrevista.

Como o senhor decidiu pela área da educação de trânsito?
Uma das principais patologias atendidas na rede Sarah Kubitschek, onde fui chamado para integrar uma equipe de pesquisa em 1992, era de pacientes jovens com lesões graves e o trânsito estava por trás. As conexões dessa violência no trânsito resultam na ponta do iceberg de uma problemática, onde a raiz da violência no trânsito está diretamente ligada ao comportamento das pessoas.

E qual seria a razão de tantas pessoas morrerem no trânsito?
A sociedade moderna se organizou para dar primazia ao veículo. As pessoas não morrem por azar. Não é uma questão individual, ela é sistemática. As pessoas estão sendo expulsas das cidades. Uma reprodução da forma de ocupar os espaços. O trânsito mata pessoas porque o espaço que vai para o carro sai de algum lugar.

É o canteiro central que tinha árvore, é a calçada que diminui de tamanho ou o pedestre que anda no canto do muro, quando existe calçada. Alguém pode dizer, mas o carro tem que ter o espaço dele. E o pedestre também. O povo brasileiro anda muito a pé. Pelo menos 30% da população das cidades brasileiras se deslocam a pé. Não é um dado para ser ignorado.

O senhor também defende o controle da velocidade para reduzir as mortes?
As pessoas se machucam em função direta da velocidade. Quanto mais alta a velocidade média, mais energia cinética circulando. Nós temos um limite para suportar essa energia. Às vezes o impacto é tão violento que o sapato fica e a pessoa voa. E como a gente baixa a energia cinética? Reduzindo a velocidade. Então, a melhor maneira de compartilhar o espaço na via é reduzindo a velocidade de maneira justa para chegarmos a um ponto de equilíbrio. A verdade é que, no Brasil, a velocidade nas vias urbanas é ainda muito alta.

Garantir o aumento da velocidade nas vias é uma das ferramentas dos órgãos de trânsito para reduzir os engarrafamentos e permitir mais fluidez ao tráfego. É uma lógica inversa?
Sim. A lógica é inversa porque o poder público está atendendo à demanda de uma parcela da população. Isso deveria ser feito exclusivamente para dar prioridade ao transporte público. Os corredores de ônibus do sistema BRT precisam de fluidez. Mas o olhar dos engenheiros, em geral, e dos gestores de trânsito é resolver o congestionamento do veículo particular.

Porque ele é o eleitor que mais reclama, que tem mais informações, que aparece na imprensa…Essa classe média, que hoje é enorme no Brasil, demanda vias para sua circulação. Mas o gestor público deveria pensar o seguinte: os maiores deslocamentos são feitos a pé, então a prioridade deve ser as calçadas e não os viadutos.

Foto - Késia Souza DP/D.A.Press

Como o senhor percebe a transição da bicicleta para as motos?
É preocupante. No interior muita gente se desloca de bicicleta. A gente esquece que o veículo mais popular no Brasl, tirando as pernas, são as bicicletas. Só que essa cultura da bicicleta, vem morrendo há décadas. As pessoas nas cidades do interior, na primeira oportunidade, abandonam a bicicleta ou jegue pela moto. A tendência é de uma total motorização no interior. E nas cidades maiores, as bicicletas estão completamente sem espaço. Se andar a pé já é difícil, de bicicleta beira o impossível. A não ser que você corra riscos. E novamente porque a velocidade é alta.

Então, não é possível compartilhar a mesma via com veículos tão grandes e rápidos. Eu sou ciclista e pedalo desde criança, mas não sou louco de andar ao lado de um ônibus ou caminhão a 40km/h ou 60 km/h. Então, essa batalha que a gente vem tendo de incentivar e resgatar a bicicleta, vai desembocar numa outra batalha. Nós temos que baixar a velocidade e criar ciclovias ou ciclofaixas. Não que seja necessário separar a cidade do resto, mas é um processo de transição para resguardar a segurança do ciclista.

Aqui no Recife, o órgão de trânsito baixou a velocidade nas vias, onde há ciclofaixas aos domingos para 40km/h. Já é um caminho?
É um caminho, mas 40km/h é uma velocidade que mata pessoas. Para se ter uma ideia, a cada 10 pedestres atropelados em um veículo a 40km/h, quase metade morre. Com 30km/h, a cada 10 atropelados, três morrem. É uma diferença muito grande. De 30 para 40km/h quase dobra o número de mortes, no caso de adultos. Porque se forem crianças, ai mata mesmo. É uma forma talvez, muito simbolicamente, de conscientizar os motoristas. Olha, ao lado de uma bicicleta, a velocidade tem que ser baixa. O problema que eu vejo é que as ciclofaixas cumprem esse papel de educação simbólica. De mostrar que nós podemos conviver. Isso é um aprendizado útil. Por outro lado, gera um questionamento: e se a gente pudesse ter ciclofaixa todos os dias?

Os acidentes com moto sáo considerados uma verdadeira epidemia em todo o país. Como o senhor enxerga esse fenômeno?
Eu diria que não se pode atribuir a uma questão meramente comportamental. Em São Paulo, grande parte dos acidentes de moto acontece na madrugada. E não são de pessoas que estavam em festas. O perfil é de trabalhadores. O que está por trás dessas mortes é o cansaço. Na verdade, a moto é mais do que um meio de locomoção, ela é principalmente uma ferramenta de trabalho para muitos profissionais autônomos.

Mas as nossas estatísticas não mostram isso. Os europeus investiram 15 milhões de euros em uma pesquisa denominada MAIDS, para identificar como acontecem os acidentes com moto. São informações importantes para serem aplicadas nas políticas públicas.

Uma questão que o senhor levantou foi da relação dos acidentes de trânsito com a previdência. Como isso acontece?
A pergunta é: o que cada um de nós tem a ver com o fulaninho que tomba no trânsito? E eu digo: Tudo. Porque a tragédia do trânsito tem uma idade para acontecer e ela acontece justo na entrada da adolescência e início da vida adulta. Só que esse adulto jovem vai fazer falta lá na frente. Porque nascem cada vez menos crianças.

Então, todos nós, hoje, adultos, quando chegarmos aos 85 anos, quem estará atrás de nós trabalhando para sustentar a previdência? A previdência social no Brasil caminha para uma falência a longo prazo e a gente vai estar vivo para ver. Então, o que cada um vai fazer chegando aos 85 anos com uma bengala na mão e descobrindo que não tem mais aposentadoria? De modo que a cada vítima que se fere no trânsito, todos nós nos machucamos.

Detran promove curso de Educação de Trânsito

 

Nesta sexta-feira(9 de março), o Departamento Estadual de Trânsito de Pernambuco (DETRAN-PE) promove a segunda fase de capacitação de 50 socioeducadores da Secretaria Executiva de Educação Profissional do Estado (SEEP) no curso de Educação de Trânsito. O curso, com duração de 8 horas de aulas, acontecerá no auditório da Secretaria de Educação do Estado a partir das 10h.

A segunda fase do programa, iniciado em outubro de 2011, visa monitorar e implementar os projetos já desenvolvidos para aferir o aprendizado obtido na primeira fase, além de lançar uma pesquisa de campo para levantar o perfil de motociclistas dos municípios onde os pedagogos residem, reunindo subsídios para viabilizar estratégias efetivas que reduzam os acidentes de motos nestas localidades. O principal objetivo do programa é formar agentes multiplicadores a fim de que estes profissionais se tornem aptos a orientar pedagogicamente os educadores, alunos e pais e alunos de suas respectivas cidades.

Na primeira fase deste projeto os socioeducadores da SEEP participaram de cinco aulas focalizando o trânsito e suas interfaces nos aspectos legal, social e ético, através de oficinas que possibilitaram a produção de 36 projetos educativos de trânsito a serem desenvolvidos pelas unidades escolares ali representadas. Na sexta, os pedagogos serão divididos em quatro turmas e poderão apresentar o resultado de seus projetos desenvolvidos no primeiro dos encontros

Educação para combate aos acidentes – a capacitação promovida pelo DETRAN para os profissionais da Secretaria de Educação também visa contribuir com os programas Lei Seca e Comitê de Prevenção aos Acidentes de Motos (CEPAM), ambos capitaneados pela Secretaria de Saúde. “Entendemos que trânsito e educação são fatores indispensáveis para a redução dos índices de acidentes no Estado”, enfatiza Fátima Bezerra, presidente da entidade. Nos últimos anos, o Programa de Educação de Trânsito do Detran já capacitou mais de 8.000 profissionais das instituições e das  redes pública e privada de ensino de todo o Estado que, juntos, atingem mais de 345 mil alunos.

 

Fonte: Detran/PE

 

Educação no trânsito, um princípio de mobilidade

9ª edição do Fórum Desafios para o Trânsito do Amanhã com o tema educação no trânsito

Tânia Passos
Taniapassos.pe@dabr.com.br

Discutir educação de trânsito é discutir o princípio básico da nossa formação enquanto motorista, pedestre, ciclista, motociclista ou qualquer outro tipo de locomoção. E mais do que o “conhecimento” a respeito das normas de trânsito, a compreensão do que significa mobilidade da coletividade e não da individual, faz toda a diferença no trânsito nosso de todos os dias. A nona edição do Fórum Desafios para o Trânsito do Amanhã, promovido pelos Diarios Associados, trouxe, ontem, como tema a educação no trânsito. Entre os palestrantes, a consultora do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), Rita Cunha, a presidente do Detran-PE, Fátima Bezerra Costa e o engenheiro e consultor de trânsito, Carlos Guido Azevedo.

Depois de trazer temas como as condições das rodovidas estaduais e federais, a municipalização do trânsito (em duas edições), os desafios da engenharia de tráfego, a epidemia dos acidentes de motos no estado, a educação no trânsito é o penúltimo tema das 10 edições do Fórum. “Não basta investir apenas na engenharia de tráfego, ou em modernos equipamentos e obras viárias se não houver ações voltadas para a educação no trânsito”, ressaltou o presidente do Fórum, o superintendente comercial da ATP Engenharia, o engenheiro Laédson Bezerra.

Se o aprendizado sobre o trânsito não é doméstico e tampouco nas escolas de onde ele vem então? De certo, que não se pode esperar que seja “intuitivo”. A participação do estado é imprescindível na definição de políticas públicas voltadas para o trânsito. “Nós somos 10 vezes pior do que qualquer outro lugar no mundo em mortes no trânsito. São mais de 40 mil pessoas que morrem todos os anos nas estradas ou em vias urbanas”, ressaltou Carlos Guido.

Aos 14 anos, o Código de Trânsito Brasileiro não conseguiu preencher a lacuna da educação. O Denatran bem que tentou, junto ao Ministério da Educação, para que a atribuição do ensino fizesse parte da grade curricular das escolas. Não conseguiu. “O MEC publicou textualmente no Diario Oficial, que o trânsito não entrará na grade curricular. Na verdade, o Ministério da Educação mandou o recado para que os órgãos de trânsito façam a sua obrigação na questão da educação”, revelou a consultora do Denatran, Rita Cunha.

Foi em 2009 que o Denatran parece ter dado os primeiros passos, nesse sentido, 12 anos após a edição no novo código. O órgão de trânsito nacional criou campanhas educativas e material para distribuir nas escolas. “A gente não tem como fiscalizar de que forma esse material foi aproveitado ou se está indo para o lixo. As escolas não são obrigadas a usar. Nós teríamos que convencer as secretarias de educação. Nem sempre há essa compreensão”, ressaltou Rita Cunha.

O descompasso entre o que diz a legislação, a estrutura dos órgãos de trânsito dos estados e dos municípios, explica, em parte, o tamanho da lacuna educacional e talvez seja a principal razão das campanhas se tornarem apenas eventuais e nunca sistemáticas. Para o educador Eduardo Biavati, não há órgão de trânsito capaz de ter penetração suficiente em todas as camadas sociais e em todas as comunidadades. “Não há recursos nem gente suficiente. Já as escolas têm naturalmente essa penetração nos bairros, nas vilas e até na Zona Rural. Negar o papel das escolas nesse tipo de formação só faz perpetuar a lacuna que temos nessa área”, apontou Biavati.

Educação de Trânsito tem que ser nas escolas

 

Sempre achei que a educação de trânsito fosse uma função diretamente ligada aos órgãos de trânsito. Defendi, inclusive, que a futura escola municipal de trânsito do Recife  fosse vinculada à Companhia de Trânsito e Transporte Urbano (CTTU), da mesma forma que o Centro de Treinamento de São Paulo é ligado à Companhia de Engenharia de Tráfego (CET). Pois é, mas mudei de ideia depois de ouvir o consultor em educação de trânsito Eduardo Biavati.

Biavati defende, com razão, que nenhum órgão de trânsito tem estrutura suficiente para uma educação sistemática do trânsito em todos os bairros da cidade. É impossível para qualquer órgão se manter presente no dia a dia das pessoas. Por causa disso, as campanhas acabam sendo pontuais como é o caso da Semana do Trânsito. “As campanhas não trazem um efeito duradouro e não há gente suficiente para trabalhar em todas as escolas. As escolas já contam com a estrututura do professor. É mais fácil capacitar o professor e fornecer estrutura às escolas para que, dessa forma,  o trânsito passe a fazer parte deum  estudo contínuo, em todos os níveis escolares”, explicou.

Ele explica que somente as escolas podem ter esse grau de penetração.Mas para isso, os professores precisam se engajar nessa tarefa. Outro engano, segundo ele, é apostar apenas nas crianças. “Por mais que a criança seja educada na sua infância, na adolescência, em algum momento, ela chuta o balde. A força do grupo a que ela pertence é maior. Ou seja é preciso trabalhar o jovem. E ninguém faz nada hoje para o ensino médio justamente quando o jovem se inicia no trânsito”. Concordo com ele.

Plano de educação para o trânsito

 

Um plano municipal de educação para o trânsito. A Semana Nacional do Trânsito no Recife, que terá sua programação lançada nesta terça-feira, 20, será voltada para a educação. A proposta do município é focar em campanhas junto às escolas municipais, comércio e apostar em uma ferramenta que tem se tornado decisiva na multiplicação de formadores de opinião: as redes sociais.

A ideia é oferecer a um universo de 18 mil seguidores orientações e curiosidade sobre o trânsito nos perfis da Prefeitura do Recife (@recifeweb )e da CTTU (@cttu_recife). O plano terá suas metas definidas em um decreto municipal, que será assinado na terça pelo prefeito João da Costa.

Dentro das ações do município será criado um corpo técnico da Vigilância Sanitária com 120 servidores do órgão. Eles  irão receber uma capacitação nos dias 27 e 29 deste mês com noções sobre os equipamentos e segurança para os ciclistas. O objetivo é orientar os estabelecimentos que têm funcionários que utilizam bicicleta em serviços de entrega.