Na coluna Diário Urbano escrevi, no último dia 30 de outubro, sobre um grave problema que tem tido pouca atenção das autoridades: animais na pista. Os números impressionam. Confira.
De 2010 até outubro de 2011, morreram 27 pessoas nas rodovias federais que cortam o estado, após colisões com animais soltos na pista. Nesse período, foram registrados 556 acidentes que resultaram em 250 pessoas feridas. Mesmo com o recolhimento, por parte da PRF, de 828 animais.
Ou seja, com quase mil animais a menos nas pistas, 27 pessoas perderam a vida porque o dono do animal não teve o mínimo cuidado em prendê-lo ou cercá-lo. Os números por si só já são alarmantes, mas o descaso dos proprietários e a certeza de que dificilmente serão punidos está transformando esses incidentes em uma verdadeira epidemia.
Identificar os responsáveis é uma das dificuldades apontadas pela PRF. Quando o animal é apreendido, o proprietário prefere abandoná-lo a assumir o risco de ser responsabilizado por algum acidente. Segundo o inspetor da PRF, Eder Rommel, a criação de animais soltos à sua própria sorte é um costume antigo principalmente no interior do estado. Uma das alternativas que estão sendo estudadas é a instalação de chips nos animais com as informações do animal e do proprietário.
A experiência já foi iniciada em São Paulo por meio de uma parceria com uma Ong. A parceria, no entanto, só tem condições de funcionar com a participação dos municípios. Aliás, já está mais do que na hora de os municípios assumirem a sua parcela de responsabilidade.
A Polícia Federal apenas recolhe os animais, mas o destino deles é outro problema. Uma sugestão do inspetor é a realização de leilão, pelos municípios, dos animais que não forem resgatados pelos donos. Que tal a criação de um fundo que possa ser usado em campanhas de conscientização para reduzir o número de acidentes? A epidemia tem controle, só precisa ser combatida.
Mesmo sem fazer teste do bafômetro ou exame de sangue para comprovar a embriaguez, os motoristas que dirigirem após consumir bebida alcoólica podem responder criminalmente pelo ato.
Isso porque a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou ontem o Projeto de Lei do Senado (PLS) nº 48, que impõe tolerância zero e punição a todos os condutores que guiarem sob o efeito de qualquer concentração de álcool no organismo — a lei atual prevê que a pessoa flagrada com até 0,29 miligrama de álcool por litro de ar expelido pelos pulmões seja punida apenas administrativamente.
O PLS foi apreciado pela comissão em caráter terminativo, ou seja, sem necessidade de ir ao plenário, e segue agora para avaliação na Câmara dos Deputados.A adição de novos parágrafos ao artigo 306 da Lei Federal nº 9.503/1997 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) aumenta também o rigor para motoristas que, ao dirigirem sob o efeito de álcool, causarem mortes no trânsito.
A penalidade pode chegar a 16 anos, conforme emenda do senador Demóstenes Torres (DEM-GO). Na redação original, de autoria de Ricardo Ferraço (PMDB-ES), a punição em caso de morte chegava a 12 anos de reclusão.
Se o acidente provocar lesão gravíssima, os condutores estarão sujeitos a penas de seis anos a 12 anos, enquanto para lesão corporal grave, a sanção varia de três anos a oito anos. Já as consideradas leves, de um ano a quatros anos de detenção.
A proposta ainda sugere que a comprovação da embriaguez seja feita não apenas por meio do teste do bafômetro ou de exame de sangue, mas também por “meios que permitam certificar o estado do condutor, inclusive prova testemunhal, imagens, vídeos ou outras provas em direito admitidas”.
Para o senador Ricardo Ferraço, o projeto vai penalizar com rigor os motoristas que insistirem em dirigir embriagados. “É tolerância zero. A pessoa tem que ser punida gerando, ou não, qualquer tipo de lesão no trânsito. Beber e dirigir é como andar com uma arma sem ter porte. Não precisa utilizá-la para ser criminoso”, ressalta o autor da proposta.
Durante a leitura do relatório, na manhã de ontem, o senador Pedro Taques (PDT-MT) acatou a emenda do senador Demóstenes Torres (DEM-GO) que propôs aumentar as penalidades para 12 e 16 anos de reclusão em casos de lesões gravíssimas ou morte, consecutivamente. O texto inicial previa a pena máxima de 12 anos.
“O entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre ninguém ser obrigado a produzir provas contra si, desmoralizou o bafômetro e deixou de comprovar a embriaguez dos motoristas. Se o projeto for aprovado, vamos resgatar essência da lei seca, que produziu resultados importantes e registrou redução no número de acidentes fatais no Brasil”, afirma Ferraço.
Na Câmara, a proposta vai passar por comissões e seguir para votação em plenário. Se a redação for alterada, volta para o Senado, onde as sugestões serão analisadas e corrigidas, caso seja esse o entendimento dos senadores.
Para o advogado criminalista Antônio Alberto do Vale, o projeto é bom no que diz respeito a punir criminalmente a embriaguez ao volante. Entretanto, ele diz que os critérios usados pelos agentes de fiscalização para determinar se a pessoa consumiu ou não álcool podem ser alvo de contestação. (Kelly Almeida e Mara Puljiz)
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Mais rigor
O Projeto de Lei nº 48 acrescenta parágrafos ao art. 306 da Lei Federal nº 9.503/1997, do (CTB) e torna mais rigorosa a punição aos motoristas que dirigem sob o efeito de qualquer concentração de álcool. Veja as mudanças:
Lei atual:
É considerado crime dirigir estando com concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a seis decigramas, ou sob a influência de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência. Atualmente, a pena para quem dirige embriagado é de seis meses a três anos de detenção, além de multa. O motorista pode ainda ter suspenso o direito de dirigir.
Como pode ficar:
É crime conduzir veículo automotor sob influência de qualquer concentração de álcool ou substância psicoativa que determine dependência. Se aprovado, o projeto prevê pena de até 16 anos de reclusão ao motorista que, alcoolizado, provocar acidente que resulte em morte. As penalidades para envolvimento em colisões leves, graves e gravíssimas também serão mais rigorosa, com variação de um a 12 anos de prisão ou detenção. Em caso de recusa à realização do teste do bafômetro, a proposta também permite a comprovação da embriaguez por meio de provas testemunhais, imagens ou vídeos.
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Um levantamento divulgado recentemente pelo Ministério da Saúde, com base em dados do Sistema de Informações de Mortalidade (SIM), mostra que o Brasil registrou no ano passado 40.610 vítimas de trânsito. Acredita-se que, deste total, 70% estejam relacionados ao consumo ou abuso de bebidas alcoólicas. Nos Estados Unidos, as principais causas dos acidentes de trânsito são pais tentando acabar com brigas dos filhos no banco traseiro e o uso de laptops.
O acesso ao transporte coletivo é uma das reivindicações mais presentes no mundo de hoje. Além das tarifas caras e serviços de pouca qualidade, convivemos com a falta de veículos adaptados e profissionais preparados para o transporte de pessoas com diferenças significativas.
Esse vídeo mostra uma campanha da TV Vermelho que produziu dois vídeos para a campanha “Por um transporte acessível para todos”. Os vídeos também concorrem ao 11º Prêmio de Educação no Trânsito do Denatran.
Na coluna Diario Urbano escrevi, no último dia 25 de outubro, sobre o plano de carga e descarga apresentado pela Prefeitura do Recife. Uma reflexão que vale a pena ver de novo.
Um dos maiores obstáculos à mobilidade urbana nas ruas do Recife tem origem nos estacionamentos realizados em vias públicas. Sendo eles regulares ou não, atrapalham o trânsito. É ruim com carro pequeno, imagine então com caminhões de carga. Talvez por isso, havia uma grande expectativa em relação às novas normas apresentadas pela Companhia de Trânsito e Transporte Urbano (CTTU) referentes à operacionalização do sistema de carga e descarga.
O modelo tem pequenos avanços em relação à limitação dos horários, das 23h às 5h, e da inclusão de 21 corredores de tráfego, a exemplo da Avenida Conselheiro Aguiar, onde o desmando é diário. Mas peca em outros aspectos, a começar pelo valor de uma multa comum de estacionamento prevista no Código de Trânsito Brasileiro de apenas R$ 53,20 e três pontos na carteira. Só para lembrar, a proibição da circulação das kombis que faziam transporte alternativo só funcionou porque o valor da multa era de R$ 2 mil e o prejuízo seria grande para os kombeiros.
Além disso, a penalidade irá apenas para o dono do caminhão e não para o proprietário do estabelecimento. E mesmo na hipótese da multa vir a ser aplicada, uma vez que não há fiscalização suficiente, para o empresário valerá a pena correr o risco, que, aliás, não é dele. Não era bem isso que a presidente da CTTU, Maria de Pompéia, tinha em mente. Ela já havia sinalizado que a penalidade deveria se estender para o dono do estabelecimento e para o fornecedor e que o valor da multa deveria pesar no bolso, mas pelo jeito não vai nem fazer cosquinha.
A medida também não se estendeu aos bairros da periferia que hoje têm comércio e onde esse tipo de operação trava as vias estreitas. A Prefeitura do Recife talvez tenha perdido uma ótima oportunidade de fazer um marco na moralização da carga e descarga que traz impactos diretos na mobilidade. No lugar disso, criou 139 vagas de Zona Azul e travestiu de legalidade um tipo de serviço que, embora importante, não tem, até agora, nenhum respeito à livre circulação. Se os próprios técnicos da companhia defendem mais rigor na legislação para não ficarem de mãos atadas, quem sabe o plano, que só entrará em vigor em janeiro de 2012, possa ser aperfeiçoado e não passe de um engodo.
As avenidas Sul e Mascarenhas de Moraes são geograficamente paralelas às avenidas Conselheiro Aguiar e Boa Viagem, mas estão longe de ter o mesmo tratamento. As duas vias têm tráfego intenso, que vão de 26 mil, na Sul, a 56 mil carros por dia, na Mascarenhas.
O trânsito poderia fluir melhor se houvesse uma ação de mobilidade para esses dois corredores que fazem ligação da Zona Sul com o centro da cidade. As duas vias apresentam sérios problemas nas condições do pavimento, drenagem e principalmente sinalização de pista. No caso da Avenida Sul não há nenhum tipo de sinalização.
A ausência das faixas de disciplinamento do tráfego contribui ainda mais para os congestionamentos. O gargalo principal, no entanto, está na Ponte Motocolombó quando as quatro faixas da Mascarenhas de Moraes são reduzidas pela metade na passagem da ponte, que recebe o mesmo fluxo.
As duas vias vão receber ações do Plano de Ação para o Trânsito 2011 e 2012, mas são, por enquanto, intervenções pontuais e insuficientes para apresentar um resultado significativo. Uma das medidas previstas é a eliminação do giro à esquerda nas proximidades do viaduto Tancredo Neves, que dá acesso à Avenida Recife.
A eliminação do giro vai acabar com um problema histórico de formação de até três filas paralelas para acessar o giro. A ousadia dos motoristas acaba reduzindo a quantidade de faixas para o tráfego na Mascarenhas de Moraes. “Eliminando esse giro, que dá acesso à Avenida Recife, nós acreditamos que a velocidade nesse trecho irá aumentar”, argumentou o diretor de projetos da CTTU, Manoel Damaceno.
Dentro das ações do plano houve ainda a modernização dos semáforos das duas vias.
Na melhoria das condições do pavimento as intervenções também são tímidas. De acordo com o diretor de manutenção da Emlurb, Fernando Melo houve a troca de 12 placas na Mascarenhas de Moraes e 20 na Avenida Sul. O trabalho, no entanto, não consegue melhorar o aspecto de degradação.
No corredor exclusivo da Avenida Sul, o acúmulo de água e terra na pista formam um verdadeiro lamaçal. O canteiro central e as paradas de ônibus da via completam o cenário de abandono. “Esse lamaçal ocorre devido ao problema de drenagem. Nós vamos também fazer uma ação de limpeza nessas áreas”, afirmou Fernando Melo.
Ainda segundo ele, as ações executadas foram de caráter emergencial. “Nós iniciamos a recuperação das placas de concreto nos trechos mais críticos. As próximas ações serão executadas após o mês de setembro para que as obras sejam iniciadas e concluídas sem interrupção das chuvas”, informou.
De acordo com o diretor de trânsito da CTTU, Agostinho Maia o trabalho de sinalização só poderá ser feito após a melhoria do pavimento. “Essas duas vias que são importantes corredores de ligação da zona Sul com o centro irão receber melhorias antes da Copa. Do jeito que está não vale a pena fazer a pintura”, revelou.
Saiba Mais
Avenida Mascarenhas de Moraes
6,5 km de extensão
56 mil carros trafegam por dia nos dois sentidos
29 semáforos
Avenida Sul
3,5 km de extensão
26 mil veículos trafegam por dia
6 semáforos
Começaram a circular na manhã desta segunda-feira (7) as duas linhas de ônibus que vão substituir os bondes de Santa Teresa, no Rio. Os coletivos têm capacidade para 35 passageiros e a passagem custa R$ 0,60.
As duas linhas circulares, a SE 006 (Silvestre-Castelo) e SE 014 (Paula Matos-Castelo) (circular), vão atender aos moradores do bairro, que não contam mais com os trens desde o acidente de agosto, em que seis pessoas morreram e mais de 50 se feriram.
A medida que criou as linhas de ônibus foi decretada pelo prefeito Eduardo Paes, no Diário Oficial do município, no início de outubro. O serviço terá duração de um ano e seis meses. Atualmente o bairro de Santa Teresa é atendido por outras duas linhas de ônibus e um serviço noturno.
Bondes serão recuperados até 2013
Na semana passada, o governador Sérgio Cabral esteve em Lisboa e afirmou que o governo do estado entregará o sistema de bondes de Santa Teresa recuperado até 2013.
Cabral assinou com José Manuel Silva Rodrigues, presidente da empresa Carris, que administra os bondes da capital portuguesa, um termo de cooperação técnica para a recuperação do sistema, que está parado desde o acidente em agosto.
A Avenida Sul, que se une à Mascarenhas de Moraes e chega ao bairro São José passando ao longo das torres gêmeas, no Cais de Santa Rita, sofre outro gargalo quando seu fluxo se encontra com os veículos que descem do Viaduto das Cinco Pontas.
A busca por um espaço acaba gerando uma terceira faixa falsa, por cima dos trilhos da linha ferroviária. O improviso forçado dos motoristas é facilitado pela ausência de sinalização de pista. Outro problema é ausência de faixas de pedestres.
O local que antes não dispunha de moradia recebeu as duas torres . “Atravessar aqui é uma dificuldade muito grande e a passagem de um lado para outro é muito arriscada”, revelou uma empregada doméstica, que trabalha no local.
Nesse trecho da Avenida Sul as informações não são muito animadoras. De acordo com o diretor de trânsito da CTTU, Agostinho Maia no local não há como instalar um sinal de pedestre devido aos trilhos.
“É uma situação mais complicada. Se a gente colocar um sinal e alguém for atropelado por um trem de quem vai ser a culpa?”, questionou. Segundo ele, o mais apropriado teria sido a construção de uma passarela quando o empreendimento foi planejado.
Na última reportagem da série sobre acessibilidade não acessível, mostramos as dificuldades dos surdos e descobrimos que são os que mais sofrem com a falta de investimentos na comunicação visual nos equipamentos urbanos. Matéria publicada no dia o4 de agosto de 2009.
Tânia Passos
taniapassos.pe@dabr.com.br
A linguagem aproxima, rompe barreiras, revoluciona. Línguas diferentes são barreiras em qualquer lugar. Pior ainda no mesmo lugar, na mesma cidade, no bairro, na rua, na própria casa.
Os surdos alfabetizados têm uma língua própria e são perfeitamente capazes de se comunicar com quem conhece a linguagem dos sinais.
Não admitem o estigma da mudez. Falam com as mãos e em geral entre eles mesmos. Por isso, é comum saírem em grupos. Como minoria linguística, não têm acessibilidade plena aos serviços que exigem a condição da audição e da voz.
A falta de comunicação visual, por exemplo, é um dos obstáculos que trazem problemas no acesso ao transporte público, bancos, hospitais e até no comércio. Se não há a informação visual ou alguém capaz de interagir, a comunicação não ocorre e ele se isola, se limita, se marginaliza todos os dias.
Os surdos, aliás, são os menos favorecidos nas intervenções de acessibilidade para a pessoa com deficiência realizadas pelos gestores públicos. Uma das razões apontadas é o desconhecimento da realidade dessas pessoas.
O fato de se locomoverem com as próprias pernas e enxergarem acaba deixando-os de fora das ações voltadas, em geral, para as obras físicas. Quem nos convida a revelar nas ruas as dificuldades enfrentadas por eles é a presidente da Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos (Feneis) em Pernambuco, Patrícia Cardoso, 38 anos.
Ela ficou surda quando criança, vítima de sarampo. Graças à família, teve acesso desde cedo à educação voltada para surdos. Hoje é professora de Libras, a língua brasileira dos sinais.
Os problemas revelados por Patrícia começam no transporte público. Muitas das paradas de ônibus do Recife ainda não dispõem de informações básicas sobre o destinos dos coletivos. Na frente da estação do metrô do Recife, um dos exemplos. A parada de ônibus não tem o painel indicando as linhas que passam no local.
Se o surdo decidir aguardar um transporte, terá que esperar para saber se algum deles coincide com a sua opção de viagem. Paradas sem placas informativas das viagens são barreiras contra a acessibilidade.
Um simples passeio pelas ruas do centro da cidade também exige um esforço do surdo para tentar se localizar. De acordo com Patrícia Cardoso, as placas de sinalização do tráfego nem sempre são claras.
A professora explica que a linguagem dos surdos não tem a tradução literal do português escrito, por isso é importante o uso de símbolos para facilitar a comunicação até para o surdo não-alfabetizado.
Na Rua da Concórdia, ela apontou como exemplo uma placa que indica a estação do metrô do Recife e a Casa da Cultura. Em sua opinião, os sinais não são claros e o surdo que não for capaz de ler não tem como compreender o que está sendo dito.
Mas é na estação do metrô onde aponta dificuldades que passam despercebidas pela maioria das pessoas. Quem iria imaginar que o surdo teria dificuldade de saber o destino dos trens? Ele tem.
Patrícia explica uma situação bastante recorrente: ao chegar à estação de embarque, se o trem já estiver no local com as portas abertas prestes a sair, o surdo só tem um jeito de saber o destino dele: precisa correr até a frente para ler o letreiro.
Com esse deslocamento, corre o risco de perder a condução. Mesmo assim, ela conta que é mais seguro esperar o próximo transporte (se não for possível correr e voltar a tempo de entrar no trem) do que pegar o destino errado.
Situações enfrentadas no dia a dia
– Um surdo passa mal e é levado para uma emergência de um hospital público do Recife. Não há profissionais preparados para atendê-lo e ele não consegue dizer o que está sentindo
– Em um caixa eletrônico, o cartão é engolido pela máquina e há apenas um telefone para o cliente informar a situação ao banco. O surdo não tem como fazê-lo
– Um surdo tem os seus cartões roubados e não consegue fazer o bloqueio ou desbloqueio por telefone
– Um surdo é acusado de um crime e não tem como se defender. As delegacias também não dispõem de profissionais para ajudar em casos desse tipo
– A campainha toca informando um incêndio em um prédio. O surdo ignora o aviso. A campainha do surdo é a luz e a maioria dos prédios não adota o procedimento
– O surdo também não pode pedir comida ou remédio por telefone
Fonte: Feneis
Saiba Mais
9.725 são pessoas com deficiência auditiva no estado
9.941 alunos com deficiência estão matriculados na rede estadual de ensino
4.488 alunos estão emsalas destinadas apenas a alunos com deficiência
5.453 alunos estão matriculados em salas inclusivas
775 empresas no estado estão sujeitas ao sistema de cotas pelo regime celetista
19.749 postos de trabalho estão previstos no sistema de cotas das empresas
2.920 pessoas com deficiência estão devidamente empregadas
16.829 é o déficit de vagas nas empresas
Fonte: Secretaria Estadual de Educação e Superintendência Estadual de Apoio à Pessoa com Deficiência
Segunda matéria sobre a série acessibilidade não acessível. Aqui o deficiente visual Júlio Tabosa mostra as dificuldades de circulação em um trecho “tecnicamente” acessível. Matéria publicada no dia 03 de agosto de 2009.
Tânia Passos
taniapassos.pe@dabr.com.br
Um teste simples de equilíbrio. Ficar de pé com uma perna só e abrir os braços. Tente fazer o mesmo de olhos fechados e irá perceber o grau maior de dificuldade, mesmo sem sair do lugar. Imagine então andar pelas ruas da cidade sem ter a mínima ideia de onde está pisando e o que vai encontrar pela frente.
Segundo o censo do IBGE de 2000, em Pernambuco eram mais de 900 mil deficientes visuais, dos quais cerca de 9.340 eram cegos e 146 mil tinham uma grande dificuldade permanente de enxergar. Estes dois últimos grupos estão à mercê das inúmeras barreiras que dificultam a acessibilidade.
Sejam buracos, orelhões, árvores e as temíveis bocas de lobo. Reduzir o abismo que separa a acessibilidade plena da realidade das ruas é um dos desafios dos gestores públicos e de todos nós.
Foi aos 19 anos que Júlio Tabosa, hoje com 52, perdeu a visão. Ele chegou a passar cinco anos trancado dentro de casa com medo do mundo. Mas decidiu ir à luta. Fez um curso de locomoção na Associação Pernambucana dos Cegos (APEC).
Hoje preside a Associação Beneficente dos Cegos de Pernambuco, uma casa de apoio aos cegos do interior do estado, na Estrada dos Remédios, no bairro de Afogados.
Para se deslocar na área urbana, utiliza o transporte público. Sem nenhum tipo de ajuda, Júlio concordou em fazer uma espécie de “ensaio sobre a cegueira” pelas ruas do Recife. E assim como no romance do escritor português José Saramago, ele sabe que é preciso confiar no outro
“Por mais que o cego aprenda a caminhar sozinho pelas calçadas, precisa confiar nas pessoas. Seja para pegar o ônibus certo ou atravessar o semáforo. Sempre aparece alguém para ajudar, mas há também os que dão informação errada. Se possível, é melhor confirmar com mais de uma pessoa e confiar”, ressaltou.
O ensaio pelas ruas teve início no Corredor Leste-Oeste, uma das mais recentes e importantes obras do município no sistema viário da cidade contemplada com acessibilidade.
O mesmo local onde o cadeirante Edvaldo Gonçalves, da primeira matéria da série, já havia apontado dificuldades nas rampas do entorno da Praça do Derby e na falta de continuidade dos acessos. Júlio iniciou sua caminhada no mesmo ponto da praça.
E assim como ensina o manual de locomoção para cegos, procurou a linha do canto esquerdo da calçada e seguiu em frente com a segurança de quem parece enxergar tudo.
Poucos metros à frente, o primeiro obstáculo. Um banco de concreto em um espaço que deveria estar livre. Mesmo com a bengala, quase tropeçou. Um susto para quem observa e só mais uma barreira para Júlio contornar e seguir em frente. Dessa vez, um pouco mais pela direita, pois já não parecia tão certo de que o caminho à sua esquerda estivesse livre.
Encontrou pela frente um orelhão, sem sinalização no piso. A batida foi inevitável. Mais na frente, ao lado de uma parada de ônibus, mais dois orelhões. Um ao lado do outro. Júlio tentou livrar o primeiro, mas esbarrou.
Ele contornou pelo lado contrário e deu de cara com o segundo. Foram três orelhões e três batidas emuma mesma calçada. Um sofrimento desnecessário se a acessibilidade tivesse sido respeitada. E o mais grave, em um espaço que em tese já recebeu ações e investimentos para esse fim.
As barreiras nas calçadas não são o maior temor dos cegos. O principal inimigo deles são as bocas de lobo, verdadeiros precipícios que surgem do “nada” pelo caminho. Uma lição que Edson José de Amorim Oliveira, 18 anos, já aprendeu. “Certa vez eu caminhava pela Avenida Guararapes com uma colega cega e caí em uma boca de lobo. Ela me ajudou a sair. É difícil encontrar um cego que não tenha sido vítima de uma boca de lobo”, revelou.
A preocupação é tanta que Edson faz um apelo desesperado. “Se não fizessem nada em acessibilidade e tapassem todas as bocas de lobo nós nos sentiríamos mais seguros”, desabafou o jovem, que chega ao extremo de exigir tão pouco quando tem o direito legítimo a tudo.
Remoção – Em nota, a Secretaria de Serviços Públicos da Prefeitura do Recife informou que os orelhões da praça vão receber pisos táteis e que os técnicos da Empresa de Manutenção e Limpeza Urbana (Emlurb) vão estudar uma forma de sinalizar os bancos das calçadas.
Especialista em acessibilidade, a arquiteta do Crea Ângela Carneiro tem outra sugestão. “A solução é remover os bancos da calçada. Eles podem ficar no interior da praça, mas não na calçada que deve estar livre de obstáculos”, explicou.