De uma grande derrota no Mundial até a CPI. Mas sem dúvidas sobre a escalação

Ronaldo sendo interrogado na CPI CBF/Nike em 10 de janeiro de 2001

A acachapante derrota brasileira na final da Copa do Mundo de 1998, com Zinedine Zidane comandando a França no 3 x 0, deflagrou uma crise administrativa na CBF, chegando a uma investigação através de uma comissão parlamentar de inquérito (CPI). Duas, na verdade, com uma no Senado e outra na Câmara. A investigação foi até junho de 2001.

A diligência focou o milionário contrato entre a CBF e a Nike, assinado em 1996 e que renderia US$ 160 milhões durante uma década. Contudo, os interrogatórios se estenderam aos integrantes do Mundial. Foram chamados Zagallo, Edmundo e Ronaldo, com a suspeita de que a fabricante, patrocinadora do Fenômeno, tivesse pressionado na escalação no Stade de France.

Quatro edições depois, a Seleção voltou a sofrer um golpe duríssimo em campo. A humilhante derrota na semifinal, em casa, deixará marcas na história da paixão nacional. O 7 x 1 aplicado pela Alemanha pode ser o recomeço organizacional da Confederação Brasileira de Futebol.

Talvez não chegue a tanto, com uma nova CPI – uma ameaça constante à entidade. Mas, sobretudo, que os deputados não façam perguntas pertinentes como essas abaixo, em 10 de janeiro de 2001…

O sr. deputado Eduardo Campos – O Zagallo tinha… No esquema tático da Seleção, você tinha um papel… É fato, foi noticiado à época em alguns jornais, você tinha um papel na marcação do Zidane ou… ou isso é conversa do…

O sr. Ronaldo Luís Nazário de Lima – Quem tinha? Eu tinha um papel?

O sr. deputado Eduardo Campos – Sim, na… no esquema tático, na marcação do Zidane?

O sr. Ronaldo Luís Nazário de Lima – Isso vai ajudar muito na… na… na CPI?

O sr. deputado Eduardo Campos – Vai. Eu acho que vai. Senão, não teria perguntado.

O sr. Ronaldo Luís Nazário de Lima – Tudo bem. Eu não me recordo da marcação no Zidane, quem tinha que marcar.

O sr. deputado Eduardo Campos – Não recorda.

O sr. Ronaldo Luís Nazário de Lima – Tu diz na hora do gol do… do…

O sr. deputado Eduardo Campos – Não. Na hora do gol, não.

O sr. Ronaldo Luís Nazário de Lima – … ou durante o jogo?

O sr. deputado Eduardo Campos – Durante o jogo.

O sr. Ronaldo Luís Nazário de Lima– Ah, eu não me recordo quem deveria marcar o Dunga… o… o Zidane. Acho que quem deveria não marcou muito bem, também, não é?

O sr. deputado Eduardo Campos – Porque foram dois, né? (Risos.)

O sr. Ronaldo Luís Nazário de Lima – Pois é.

O sr. presidente (deputado Nelo Rodolfo) – Satisfeito, Deputado?

O sr. deputado Eduardo Campos – Satisfeito.

Pois é, acredite. Antes dos dois mandatos de governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB) cumpriu três mandatos na câmara dos deputados, de 1995 a 2007, e foi um dos componentes da CPI CBF/Nike.

Sobre o relatório final, que acabou reprovado – sem surpresa alguma, como fica claro -, confira a íntegra do documento de 220 páginas aqui.

“E se o Brasil for a sede da Copa daqui a vinte anos?” A conversa real de meninos olindenses no tetra

Brasil tetracampeão mundial de futebol em 1994, nos Estados Unidos. Foto: Fifa/divulgação

Acredito que todo mundo, quando criança sobretudo, já teve conversas com amigos imaginando o futuro, mas daqueles bem utópicos.

“Já pensasse… Uma Copa do Mundo aqui no Brasil?”

“Peraê, né véi… Já teve aquela de 1950. Duvido que a Fifa faça outra aqui.”

“Danosse.”

“Mas e se fizesse? Será que colocariam o Recife de novo? E seria muito maior, com 24 países. Seria arretado, vá por mim.”

“Seria, né velho. Mas tás viajando na maionese. A gente teria que construir um bocado de estádio. O Brasil tá liso.”

“Era só reformar o Arruda. Ano passado deu quase 100 mil lá com a Seleção. Como é que tu vai dizer que não serve? Ainda tem o Maracanã, o Morumbi, a Fonte Nova, o Serra Dourada…”

“Bote fé, po. Mas a turma ia roubar tão pouquinho mesmo…”

“Vixe, nem fale. Mas daqui a 20 anos a gente vê então.”

Não exatamente com essas palavras, mas algo bem próximo disso aconteceu em 1994, na época do tetra, em Rio Doce, Olinda. Na rodinha de conversa furada, eu e meus amigos, entre 11 e 12 anos de idade.

Após um tempão com cada um querendo falar mais alto que o outro, o consenso foi de que, se tivéssemos uma chance, seria com no mínimo vinte anos.

Com boa vontade e ainda achando impossível. A arenga logo tomou outro rumo, sobre sobre quem seria o Romário do futuro…

Quanto à Copa do Mundo, o maior evento com o esporte mais popular que existe, era algo realmente distante da gente, sempre alvo de admiração.

Tinha sido assim em 1990, na Itália. Foi, e como, em 1994, nos Estados Unidos. Dos 24 países imaginados, a competição evoluiu para 32. Cada vez mais agigantada.

Veio a beleza da França em 1998, a tecnologia de japoneses e sul-coreanos em 2002 e a plena organização germânica em 2006. Aquela mesma emoção guardada a cada quatro anos sempre voltava bem viva durante o Mundial.

Até que em 30 de outubro de 2007, direto da sede da Fifa, em Zurique, Joseph Blatter tirou de um envelope um papel branco com o seguinte texto na cor azul:

2014 Fifa World Cup Brazil

Era fato. O país seria novamente a sede de uma Copa do Mundo. O momento econômico em expansão, os índices sociais enfim melhorando.

A história havia, sim, virado a nosso favor.

Joseph Blatter confirma o Brasil como país-sede da Copa do Mundo de 2014, em 30 de outubro de 2007. Foto: Fifa/divulgação

Na ocasião, a escolha veio com a seguinte mensagem. Curta e direta.

“O Comitê Executivo decidiu, unanimamente, dar a responsabilidade, não apenas o direito, mas a responsabilidade de organizar a Copa de 2014 ao Brasil.”

Teríamos sete anos para nos prepararmos. Nunca um país havia tido tanto tempo para fomentar a infraestrutura e logística necessária.

Estádios, aeroportos, mobilidade urbana, telecomunicações, serviços etc. Bilhões seriam investidos. E foram, na verdade… Mais de R$ 25 bi.

A aplicação desses recursos e a forma é que corroboraram com as indagações dos meninos de duas décadas atrás.

A incompetência na gestão pública em todas as esferas – municipal, estadual e federal – acabou deixando o sonho parcialmente embaçado.

É da índole do brasileiro se contagiar com a Copa, quanto mais com uma Copa aqui. Ao mesmo tempo, soa errado – para alguns – aproveitar o momento sabendo a forma na qual ela foi executada.

Daí, uma mistura histórica de entusiasmo e protesto.

A contagem regressiva acabou. Infelizmente, antes de parte das obras.

A Copa do Mundo começa neste 12 de junho de 2014.

Não foi como eu imaginei há 20 anos – e muito menos esperava participar da cobertura como jornalista, pois eu queria ser piloto de avião. Ainda assim, me sinto prestigiado de ver o sonho se tornando real.

A responsabilidade de organizar uma Copa nos foi dada pela segunda vez, com a expectativa de três milhões de pessoas assistindo aos 64 jogos nos estádios e três bilhões acompanhando na televisão.

Em junho de 2014, de minha parte, em campo, irei curtir bastante o Mundial.

Em outubro de 2014, de minha parte, nas urnas, cobrarei tudo o que não foi cumprido nesse sonho tão antigo… desde menino.

Maracanã na Copa das Confederações. Foto: Fifa

Para uma arena de R$ 532 milhões, uma engenharia financeira de quase R$ 1 bi

Arena Pernambuco decorada para da Copa do Mundo de 2014. Crédito: twitter.com/jeromevalcke A verba liberada para a construção do moderno estádio em São Lourenço da Mata se aproximou de um bilhão de reais. Não é exagero. Entre financiamentos do estado para pagar o custo da construtora, que por sua vez também adquiriu um empréstimo, o estádio da Copa do Mundo de 2014 teve uma verba na ordem de R$ 890 milhões, segundo o Portal da Transparência.

Inicialmente, com base de cálculo maio de 2009, o orçamento, entre projeto, construção e início da operação, era de R$ 532.615.000. Tal valor estava sob contrato, para entregar o estádio no máximo em dezembro de 2013, segundo a parceria público-privada entre governo do estado e Odebrecht. Como se sabe, o empreendimento foi antecipado em oito meses para que o estado fosse subsede da Copa das Confederações de 2013, o que encareceu a obra substancialmente.

Era um tanto óbvio que a despesa extra seria grande. Do pico de trabalhadores imaginado, com 1.800 homens, o número saltou para 5.000 operários dia e noite no canteiro. O estádio foi erguido à tempo do evento-teste da Fifa. Contudo, o custo final nunca foi revelado. Nem pelo governo do estado e nem pelo consórcio. E não foram poucos os questionamentos para obter o dado…

Agora, o Portal da Transparência traz um número impressionante. Num valor repassado através de três financiamentos – para o contrato original -, sendo dois pelo BNDES e um pelo BNB, o montante foi de R$ 890.835.424,65, ou um acréscimo de 67,25%. De forma bruta, foram injetados mais R$ 358.220.424,65 na engenharia financeira – com empréstimo pagando empréstimo entre estado e concessionária. Todas as verbas foram liberadas em 2013, a última delas em 23 de dezembro. E não necessariamente foram utilizadas para a conclusão do estádio.

Um último detalhe. Nota-se que pela verba cedida poderia ter sido de 930 milhões…Custo da Arena Pernambuco. Fonte: Portalda Transparência

Atualização (1): a Odebrecht entrou em contato com o blog e enviou uma nota explicando o modelo financeiro. Segundo a construtora, o texto do Portal da Transparência foi redigido de forma confusa – e ainda segue assim.

“A construção e a operação da Itaipava Arena Pernambuco seguem o modelo de Parceria Público Privada (PPP) com o Estado de Pernambuco. Para executar a obra, a concessionária Arena Pernambuco Negócios e Investimentos S.A. (Itaipava Arena Pernambuco) contratou financiamentos do BNB (R$ 250 milhões), do BNDES (R$ 280 milhões) e de um banco privado (R$ 70 milhões), além de investimentos próprios. Após a conclusão da arena e do início das operações, o Estado de Pernambuco pagou à Arena Pernambuco parte deste investimento.

A linha de financiamento da Arena Pernambuco com o BNDES (ProCopa Arenas) foi a mesma que aprovou o financiamento de R$ 400 milhões ao Estado de Pernambuco, recurso que assumiu um papel de garantia de pagamento ao BNDES. Assim, os dois financiamentos obtidos no BNDES (do Estado e da Arena Pernambuco) não devem ser somados para obtenção do custo da obra do estádio ou dos financiamentos. A concessionária quitou sua dívida com o BNDES no momento em que recebeu o recurso do Estado de Pernambuco.” 

Atualização (2): em entrevista ao repórter João de Andrade Neto, do Superesportes, o secretário de planejamento do estado, Fred Amâncio, diz que o custo final, ainda em análise, não ultrapassará R$ 630,5 milhões. Em 2013, o secretário extraordinário da Copa, Ricardo Leitão, havia estimado em R$ 650 milhões.

Entre projeções e explicações, há o fato: com um ano de operação, a Arena Pernambuco ainda não teve o seu custo oficialmente divulgado. Aí não há desculpa.

O retrato turbulento da Copa no Recife aos Estados Unidos, na maior revista esportiva dos States

Sports Illustrated em 26/05/2014, falando do Recife sobre a Copa do Mundo de 2014

Com 60 anos de história, a revista Sports Illustrated é a publicação esportiva de maior circulação nos Estados Unidos, com três milhões de exemplares semanais. Até hoje foram mais de três mil capas (veja a primeira aqui).

No ranking histórica de manchetes, o baseball lidera com mais 600 capas.

O futebol, ou “soccer” para os norte-americanos, não figura sequer entre as dez modalidades mais comentadas na história. Contudo, esse dado vem mudando, com o crescente interesse no país.

Na Copa do Mundo de 2014, os States serão a nação com mais torcedores após o anfitrião, claro. Cerca de 187 mil ingressos estão em suas mãos.

Não por acaso, a própria Sports Illustrated está focando suas pautas no Mundial.

Nesta segunda, o site oficial da magazine publicou uma reportagem sobre o Recife, que abrigará um jogo da seleção (EUA x Alemanha), com o histórico de já ter recebido uma partida em 1950 (EUA 2 x 5 Chile).

O texto foi de uma realidade crua, justa. Com a beleza da cidade e sua cultura diferenciada, mas também com os nossos problemas crônicos, sobretudo a violência, explicada pelos números assustadores e conjecturas pontuais, como a consequência da greve da polícia militar, com arrastões, assaltos e assassinatos.

Segue na violência através das uniformizadas dos grandes clubes da capital e as dificuldades estruturais para organizar a Copa. Por fim, as mudanças políticas.

A produção é assinada pelo norte-irlandês James Armour Young, radicado no Brasil há uma década. O título, traduzido, é o seguinte:

“Cidade-sede especial, o Recife, palco de EUA x Alemanha, está repleta de confusão”

Eis o início do texto:

Maio não foi um bom mês para o Recfe, cidade-sede da Copa do Mundo, onde a seleção dos EUA vai jogar contra a Alemanha o seu último e, possivelmente decisivo , jogo do grupo em 26 de junho. Há três semanas, após o jogo Santa Cruz x Paraná, pela Serie B, três pessoas ligadas à uma torcida organizada do Santa (fã clube organizado ou gang de hooligans, dependendo do seu ponto de vista), a Inferno Coral, jogaram um vaso sanitário da arquibancada superior do estádio do Arruda para a rua abaixo, onde ele atingiu e matou um torcedor do rival Sport.

Foi o último de uma série de incidentes violentos envolvendo as organizadas dos três clubes profissionais da cidade, Santa Cruz, Sport e Náutico, resultando em manchetes negativas ao redor do mundo. Então, há duas semanas, a polícia militar da cidade entrou em greve, em busca de um aumento salarial de 50%.

Grande parte do Recife desceu na ilegalidade, com saques generalizados nos subúrbios e um total de 27 assassinatos em 48 horas. O governo brasileiro enviou o exército para restaurar a calma, e logo havia tanques e carros blindados patrulham as ruas. A greve foi agora cancelada, e algum tipo de paz voltou para a cidade.

O blog foi uma das fontes ouvidas pelo jornalista. Eis o trecho:

A arena atraiu um público médio de 12.500 pessoas sem 2013, e dos 200 mil bilhetes disponíveis para os cinco jogos da Copa do Mundo na cidade, apenas 20% foram comprados por moradores da região metropolitana,  de acordo com Cassio Zirpoli, jornalista do Diario de Pernambuco, o jornal mais antigo em circulação da da América do Sul.

“Recife deveria estar animada em relação ao Mundial, mas o contexto político afetou as coisas”, afirma Zirpoli, referindo-se a decisão do ex-governador do estado, Eduardo Campos para concorrer à presidência do Brasil, estrategicamente se distanciando do torneio. O fato de que o Recife é a única cidade da Copa a se recusar a receber um Fan Fest também tem diminuído o entusiasmo, de acordo com Zirpoli.

“A Fan Fest é a única oportunidade para as pessoas sem ingressos para participar nas festividades oficiais da Copa do Mundo”, diz ele.

Apesar da divulgação de uma cidade em transe, os gringos virão. Muitos. E com isso o ranking de modalidades em destaque tende a mudar na SI…

Confira a versão original completa clicando aqui.

Um ano da Arena Pernambuco com 24% de ocupação e ainda sem o custo final

Arena Pernambuco em 2013. Crédito: Consórcio Arena Pernambuco

A partida entre Náutico e Portuguesa, pela Série B, foi a 38ª e última no primeiro ano de operação da Arena Pernambuco, administrada através de parceria público-privada.

O estádio foi inaugurado oficialmente em 22 de maio de 2013, com o empate em 1 x 1 entre Náutico e Sporting, com 26.803 torcedores em São Lourenço. Na ocasião, uma renda de R$ 1.040.104, a maior do local até hoje, descontando a Copa das Confederações, com três jogos, cuja arrecadação sequer foi divulgada pela Fifa.

O faturamento no período foi bem abaixo da estimativa anual de R$ 73,2 milhões, que considera na verdade o prazo de janeiro a dezembro. Contudo, neste recorte específico, a bilheteria foi de R$ 11,1 milhões, com uma média de R$ 294 mil. Dado um pouco maior que o contrato de naming rights com a cervejaria Itaipava, com R$ 10 milhões anuais por uma década.

As arquibancadas vermelhas em boa parte dos jogos são justificadas pela baixa taxa de ocupação de 24,57% do 46.214 assentos. Colaborou bastante o mau rendimento do Náutico, o único clube de contrato assinado com o consórcio e que mandou 33 dos 38 jogos realizados. E possivelmente a mobilidade inacabada.

Eis os números sob administração do consórcio:

Público absoluto: 431.492 pessoas
Público médio: 11.355 pessoas
Renda absoluta: R$ 11.199.636
Renda média: R$ 294.727
Gols: 95 (índice de 2,5)

Maior público: 30.061 (Náutico 0 x 1 Sport, 23/04/2014)
Menor público: 354 (Náutico 2 x 0 América-RN, 13/05/2014)

Divisão através dos mandos de campo:

Náutico (33 jogos)
Público absoluto: 353.013 pessoas
Público médio: 10.697 pessoas
Renda absoluta: R$ 9.226.046
Renda média: R$ 279.577
Gols: 81 (índice de 2,4)

Sport (2 jogos)
Público absoluto: 41.134 pessoas
Público médio: 20.567 pessoas
Renda absoluta: R$ 958.425
Renda média: R$ 479.212
Gols: 9 (índice de 4,5)

Santa Cruz (2 jogos)
Público absoluto: 27.676 pessoas
Público médio: 13.838 pessoas
Renda absoluta: R$ 646.615
Renda média: R$ 323.307
Gols: 4 (índice de 2)

Botafogo (1 jogo)
Público absoluto: 9.669 pessoas
Renda absoluta: R$ 368.550
Gol: 1

Ainda falta um número neste balanço geral…

Com um ano de operação oficial, ainda não se sabe quanto realmente custou a construção da Arena Pernambuco.

Do contrato original de R$ 532 milhões, com base em maio de 2009, do reajuste nos três anos de obra através do IPCA e do plano de aceleração que antecipou o empreendimento em oito meses. Uma soma cuja “ordem de grandeza” já seria superior a R$ 650 milhões. O número exato? O governo do estado já deveria ter respondido…

A Cidade da Copa já deveria existir. Por enquanto, só no papel

Projeto da Cidade da Copa em 2014. Crédito: divulgação

A Cidade da Copa foi apresentada pelo governador do estado, Eduardo Campos, em 15 de janeiro de 2009. Um projeto faraônico, orçado em R$ 1,59 bilhão.

A construção de uma nova centralidade urbana na zona oeste da região metropolitana da capital pernambucana, a dezenove quilômetros do Marco Zero, teria um bairro de 40 mil habitantes, estádio de futebol, centro de convenções, hotéis, escolas, faculdade, centro de comando da polícia…

Tudo agregado em 270 hectares num rincão em São Lourenço da Mata.

O gasto, que na prática passaria dos dois bilhões de reais, entre recursos públicos e privados, seria aplicado em quatro fases distintas do projeto: 2014 (imagem acima), 2015-2019, 2020-2024 e 2025 (imagem abaixo).

Naturalmente, já estamos no limite do primeiro módulo. Confira as oito diretrizes e as respectivas subdivisões da primeira etapa, com prazo vencido.

1 – Arena Pernambuco e Arena Indoor
2 – Praça de Celebração e zonas de comércio, entretenimento e alimentação (72.000 m²)
3 – Centro de Convenções (9.500 m²) e hotel com 300 quartos
4 – Melhorias na área norte do Rio Capibaribe
5 – Campus Educacional
6 – Instalação de Segurança (Centro de Comando e Controle Integrado)
7 – Radial da Copa finalizada
8 – Grande loja de varejo ao longo da BR-408

Apenas a Arena Pernambuco e a Radial da Copa foram construídas.

Até o momento, a Cidade da Copa, na prática, não existe.

Projeto da Cidade da Copa em 2025. Crédito: divulgação

Nova redação da lei do Todos com a Nota aplicada ao pé da letra em 2014

Diário Oficial de Pernambuco, 24/11/2011

O futebol pernambucano é subsidiado pelo governo do estado, através de ingressos promocionais, desde 1998. Nesse tempo todo, já vigoraram dois programas, o Todos com a Nota e o Futebol Solidário, sob o comando de três governadores, Miguel Arraes, Jarbas Vasconcelos e Eduardo Campos.

Em todos os anos, até 2014, os três grandes clubes fizeram parte do programa. Pela primeira vez, no 17º ano subsidiado, o cenário começará com uma lacuna.

A temporada para o Santa Cruz saiu do Arruda. Punido com a perda de três mandos de campo, após uma confusão provocada em um jogo em Alagoas por supostos integrantes de uma torcida uniformizada do clube, o Tricolor escolheu Caruaru como sede para as três partidas na primeira fase do Nordestão.

Além da mudança no endereço do estádio, a 130 quilômetros da capital, os corais precisam conviver com uma mudança na estrutura orçamentária.

Em vigor desde 1º de janeiro de 2013, a nova redação da lei que regula os ingressos promocionais aos clubes da capital através do Todos com a Nota passou a ser aplicada ao pé da letra em 2014.

Se no ano passado as conversas ficaram acima do texto, na base da política, agora a “lei”, criada para abastecer a Arena Pernambuco, foi lembrada. Para receber a carga de bilhetes subsidiados, só em caso de acordo com o consórcio operador da arena .

O Náutico tem um contrato para atuar lá até 2043. O Sport deverá atuar cinco anos em São Lourenço, durante a construção de sua arena. Porém, antes mesmo deste acordo, já sinalizou a mudança no mando de algumas partidas no ano.

Já o Santa Cruz segue priorizando o Arruda, onde há tempos vem obtendo uma parcela significativa de sua receita através das catracas – em 27 jogos, no ano passado, a sua média foi de 23.912 pessoas.

Sem acordo – a equipe precisa fazer ao menos dois jogos na arena -, a direção tricolor acabou com o veto à carga de ingressos do TCN, de 15.000 torcedores.

Ruim para o Santa, ruim também para o programa estatal.

Os tricolores representam quase 30% dos 367 mil portadores de cartões magnéticos do TCN na região metropolitana. Sem poder solicitar ingressos, a troca por notas fiscais desta parcela significativa pode se tornar nula…

Todos com a Nota nos grandes clubes:

Sport
177.448 usuários cadastrados (48,27%)
8 mil ingressos na Ilha
15 mil ingressos na Arena

Santa Cruz*
109.931 usuários cadastrados (29,90%)
15 mil ingressos no Arruda
15 mil ingressos na Arena

Náutico
80.240 usuários cadastrados (21,83%)
15 mil ingressos na Arena

* Se entrar em acordo com o consórcio

Conclusão da Arena “consumada” reforça discurso de Eduardo focando 2014

Eduardo Campos, governador de Pernambuco, em evento da Fifa sobre operação da Copa das Confederações 2013. Foto: Cassio Zirpoli/DP/D.A Press

Pavimentação da candidatura, dissociação da atual gestão federal, articulação política, sondagens nacionais etc.

São muitas as expressões e caminhos apontados para o governador Eduardo Campos e seu futuro político, sobretudo a curto prazo, em 2014, no Planalto.

Em uma semana foi do almoço com o senador Jarbas Vasconcelos, com direito à frase “O novo não nasce sem dor”, passando ao encontro com a presidente Dilma Rousseff em Serra Talhada, repleto de recados indiretos de ambas as partes, ao foco na Arena Pernambuco como exemplo de superação.

Há tempos o governador apostava as suas fichas no estádio em São Lourenço.

Primeiro em 2009, quando rechaçou qualquer possibilidade de reforma nos três estádios do Recife e bancou um projeto bilionário numa nova centralidade urbana, a dezone quilômetros do Marco Zero.

Depois, com as seguidas desconfianças em torno do andamento da obra. Se reuniu com autoridades, federais, da CBF e da Fifa, e projetou a aceleração.

Foi até o limite do prazo, com cobranças quinzenais de Zurique, mas conseguiu. Sim, a conclusão da Arena Pernambuco já é tratada como consumada.

Questionado no evento da Fifa sobre as operações da Copa das Confederações em relação à prioridade do estado, o governador levantou a própria bola.

“Não há uma preocupação específica. Era o estádio, se ficaria pronto, mas hoje isso é matéria vencida”.

Oficialmente, o empreendimento alcançou 94%.

Faltam vinte dias até a entrega do estádio. Ou seja, vinte dias com o discurso. Eduardo iIrá repetir o quanto puder. Hora de focar no resultado deste esforço.

Vai ajudá-lo nas sondagens nacionais, articulação política, dissociação da gestão federal, pavimentação da candidatura. Seja lá o que Eduardo pretende.

Eduardo Campos, governador de Pernambuco, em evento da Fifa sobre operação da Copa das Confederações 2013. Foto: Cassio Zirpoli/DP/D.A Press

Pernambuco e Fifa falando a mesma língua, por caminhos diferentes

Visita de Jérôme Valcke na Arena Pernambuco em 5 de março de 2013. Foto: Teresa Maia/DP/D.A.Press

O sol forte colaborou para a visita de Jérôme Valcke à Arena Pernambuco. O secretário-geral da Fifa chegou no canteiro de obras por volta de 12h desta terça. Veio de carro, com o caminho aberto por batedores, naturalmente.

Do Aeroporto Internacional dos Guararapes, encarou as Avenidas Mascarenhas de Morais e Abdias de Carvalho e as rododvias BR-232 e BR-408. Na segunda a cidade havia tido um dia de caos, com vias travadas apás a volta da chuva, relembrando pela enésima vez a precária condição viária da metrópole.

Paralelamente a isso, o governador Eduardo Campos e o prefeito da capital pernambucana, Geraldo Julio, realizavam um sobrevoo no canteiro a bordo de um helicóptero, sem qualquer chance de imprevisto ao destino. No solo, o encontro. Aos gestores locais, o tempo bom realmente ajudou na inspeção oficial da Fifa, sobretudo ao “produto” divulgado para o público.

Valcke, aliás, optou por não comentar desta vez sobre mobilidade urbana com a imprensa. Argumentou que não havia tido acesso aos relatórios àquela altura.

Na Suíça, certamente teve. Mas uma reunião posterior acertaria os ponteiros com o governador, que não conseguia esconder a satisfação o grau de avanço da arena, que correu bastante para cumprir os prazos e passar de 90%.

Insistindo novamente na mobilidade urbana, esta aparece como o principal desafio local tanto na Copa das Confederações quanto na Copa do Mundo.

Há a certeza de que teremos feriados, que diminuirão consideravelmente a quantidade de carros nas ruas, até porque a Região Metropolitana do Recife conta com inacreditáveis 1.115.461 veículos registrados.

Contudo, os discursos, tanto no inglês fluente do francês Valcke quanto no português carregado de sotaque de Eduardo, direcionam o legado do estado para a infraestrutura viária, à acessibilidade. Só na Copa das Confederações o investimento em mobilidade chega a R$ 1,2 bilhão. Sem os incrementos.

A Arena Pernambuco já é uma realidade. Dentro de quarenta dias deve acontecer a sua inauguração, apesar do lampejo de cobrança do executivo da Fifa em relação ao gramado. Nesta segunda visita do secretário-geral da entidade que comanda o futebol, o supracitado tema central, notório, ficou nos bastidores. Mas os representantes de Pernambuco e da Fifa se entenderam.

Nesta apressada reta final, o momento aponta um discurso afinado, seja lá qual for a língua, do caminho traçado. O interesse vai do Recife a Zurique.Visita de Jérôme Valcke na Arena Pernambuco em 5 de março de 2013. Foto: Teresa Maia/DP/D.A.Press

Política encravada no concreto das novas arquibancadas

Obra da Arena Pernambuco em setembro de 2012. Foto: Eduardo Martino/Odebrecht

Pela enésima vez, a Arena Pernambuco ficou em xeque em relação à presença na Copa das Confederações de 2013.

Jérôme Valcke, secretário-geral da Fifa, segue dando indiretas sobre a quantidade de subsedes no “festival de campeões” (em vez de seis estádios, cinco ou até quatro) e o governo do estado segue plenamente otimista sobre o desfecho dessa longa história.

Estrutura de concreto à parte, já com 64% de avanço físico, o capítulo final deve respingar no desejo político de Eduardo Campos em 2014, com a possível disputa pela presidência. Inteligente, o socialista sabe muito bem das consequências possíveis.

A realização dos torneios de 2013 e 2014 na arena a transformaria em um dos principais palcos esportivos do país nesta nova geração. Por outro lado, um ponto de corte na Copa das Confederações resultaria numa munição de grosso calibre para futuros adversários, sobretudo com o investimento extra utilizado para acelerar a obra.

Considerando este ponto e o fato de que na Fifa a política caminha (historicamente) à frente dos dados técnicos, a permanência da Arena Pernambuco – cujo anúncio definitivo será em novembro – é uma verdadeira incógnita, ainda mais após as recentes declarações do governador, fazendo uma leve dissociação de antigos aliados, ainda no poder na esfera federal, e trilhando uma aventura solo na próxima eleição.

Que fique claro, isso é apenas a opinião de quem acompanha todo esse processo, ainda que de fora, há mais de dois anos. E que viu a Arena Pernambuco entrar na lista da Copa das Confederações justamente pela força política local, em sintonia com Brasília.