Do Diario de Pernambuco, por Alice de Souza e Raphael Guerra
O crescimento dos atos infracionais praticados por adolescentes desafia a polícia. Nos primeiros sete meses do ano, 1.280 foram apreendidos em flagrante, 8% a mais que em 2013. Ontem, dois meninos por pouco não provocaram uma tragédia na Zona Oeste do Recife. Um garoto de 12 anos e outro de 11 furtaram um carro. O mais velho dirigiu em alta velocidade por San Martin e Torrões e acabou batendo em um ônibus no cruzamento da Caxangá com a BR-101.
Tráfico de drogas, roubo e furto estão no topo dos atos infracionais. Segundo PMs, o furto de carros também tem sido comum entre adolescentes como forma de ostentação. Uma testemunha relatou que o Renault Sandero dirigido pelo garoto, de 1,55 metro, realizou manobras perigosas no Engenho do Meio.
“Eu já estava esperando a tragédia. Um motoqueiro chegou a ser derrubado”, contou. Uma perícia preliminar apontou que o carro estava a cerca de 100km/h. “Creio que o menino freou para evitar impacto maior”, disse o delegado Eraldo Alves, do Departamento de Polícia da Criança e do Adolescente.
O proprietário, Josenilson Paz, contou que o carro estava na frente de casa. Ele percebeu o furto às 5h30, quando o acidente já havia acontecido. Os suspeitos teriam arrombado uma grade para entrar no imóvel e roubado as chaves.
Agressivos, eles não quiseram detalhar a ação à polícia. Com ferimentos na cabeça e arranhões pelo corpo, os dois foram encaminhados ao Hospital da Restauração, onde passaram por exames e foram liberados. O de 12 anos foi levado para a Funase. Ele vai responder pelo ato equivalente a furto qualificado e direção perigosa. O de 11 está sob responsabilidade do Conselho Tutelar.
O diretor de polícia especializada, delegado Joselito Kehrle, avalia que as ocorrências são reflexo da inimputabilidade dos menores de 18 anos garantida pela lei. “Quando são apreendidos, a depender da Justiça, podem receber medidas socioeducativas por 45 dias e depois estão livres.” Já especialistas analisam que a falta de programas sociais para jovens em situação de vulnerabilidade é um dos principais fatores que levam às infrações.
Questão social na raiz do problema
O envolvimento de adolescentes em situações de violência não acontece por acaso. Especialistas entrevistados pelo Diario associam o fenômeno às mudanças comportamentais das últimas décadas, que permitiram maior protagonismo juvenil, mas que não foram acompanhadas pelo fortalecimento dos programas sociais nem evitaram o enfraquecimento da autoridade paternal.
“Os traços da personalidade influenciam, mas não são determinantes. Estão aliados ao meio onde a criança vive e à maneira como a mãe e o pai impõem limites e lidam com a violência”, explicou a mestre em neuropsiquiatria e ciências do comportamento Laila Kurtinaitis.
A idade de 12 anos, segundo o juiz Élio Braz, sempre foi o momento em que os limites são entendidos pela transgressão. A diferença agora é o acesso à informação e o nível de proteção familiar. “Há uma terceirização dos cuidados domésticos, que enfraquece a autoridade paternal e torna a transgressão mais fácil.”
Para ele, a família está desassistida pelos programas sociais. O integrante e ex-coordenador do Fórum de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente de Pernambuco, Silvino Neto, diz que a rede de atendimento está comprometida. “Se existissem programas de recuperação com condições de trabalhar, atos infracionais não voltariam a ser cometidos”, afirma ele, que exemplifica com o Sertão.
“No Sertão do Pajeú praticamente não tem ato infracional. Nessa localidade, não por acaso, os índices do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) são altos.”