Internação compulsória de dependentes criticada por especialistas e governo

Especialistas e representantes do governo criticaram nessa terça-feira (15), em debate na Câmara, o uso da internação compulsória para dependentes químicos como política pública. A representante da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, Eliana Addad, condenou o que chamou de “judicialização da saúde”. “Por que determinar a internação compulsória pelo simples fato de usar droga? Por que a privação de liberdade se não houve descumprimento da lei?”, indagou ela, que participou de audiência promovida pelo grupo de trabalho de saúde mental da Comissão de Seguridade Social e Família.

Ruas do Recife já têm muitos dependentes de crack. Foto: Blenda Souto Maior/DP/D.A Press
Ruas do Recife já têm muitos dependentes de crack. Foto: Blenda Souto Maior/DP/D.A Press

Representante da Associação Brasileira de Saúde Mental (Abrasme), Márcia Caldas afirmou que a lógica de punir o usuário, em vez de tratá-lo, é equivocada, e que as alas psiquiátricas dos presídios estão lotadas de pessoas que fizeram uso abusivo de drogas.

“A política pública, como está sendo empregada hoje, conta com o apoio do clamor popular e simplesmente recolhe e segrega o usuário de droga, com a nítida postura de punir. E punir não é uma forma de resolver, pois primeiro a pessoa precisa querer ser tratada”, afirmou.

Para o Assessor Técnico de Saúde Mental, Álcool e outras Drogas do Ministério da Saúde, Daniel Daltin, a discussão sobre a criminalização do usuário é fundamental. “O usuário deve continuar sendo visto e tratado como criminoso?”, questionou.

Em relação à política do governo de atendimento aos dependentes químicos, ele destacou que os hospitais psiquiátricos, vulgarmente conhecidos como manicômios, são estruturas em extinção e não integram a Rede de Atenção Psicossocial (RAP) do Ministério da Saúde.

Maus-tratos
A audiência foi proposta pela coordenadora do grupo de trabalho, deputada Erika Kokay (PT-DF), para discutir casos de maus-tratos envolvendo dependentes de drogas em hospitais psiquiátricos e em comunidades terapêuticas.

Gabriela Korossy / Câmara dos Deputados
Audiência pública do Grupo de Trabalho Saúde Mental para discutir as políticas de atenção aos usuários de drogas como uma questão de saúde pública. Dep. Erika Kokay (PT-DF)
Para Erika Kokay, internação compulsória é política de “limpeza social”.

Segundo Kokay, 26% da população carcerária nacional teve algum envolvimento com drogas. “Como você não diferencia tráfico de usurário, todo usuário é um criminoso e pode ser encarcerado. O poder discricionário do Judiciário é que vai dizer quem é traficante e quem é usuário”, afirmou.

A deputada citou casos de comunidades terapêuticas que praticaram tortura física e psicológica com internos dependentes químicos. “Há casos de pessoas sendo enterradas até o pescoço e outros de pessoas obrigadas a beber água de vaso sanitário”, alertou.

A parlamentar vai propor uma nova reunião para discutir especificamente a regulamentação da internação compulsória de dependentes químicos no País. Para ela, essa prática se configura como política de “limpeza social”, simplesmente retirando as pessoas dos espaços públicos e as realojando em presídios e instituições sem o devido tratamento.

Da Agência Câmara.