Nem só de repressão e fiscalização é feito o cotidiano de um policial militar. Uma turma de crianças carentes da comunidade do Iraque, no bairro da Estância, Recife, está descobrindo um mundo novo através da música. Conheça um pouco do trabalho realizado por esses militares na matéria abaixo.
Por Marcionila Teixeira
Do Diario de Pernambuco
São 54 pares de olhos vidrados no quadro verde repleto de notas musicais escritas à giz. Na sala de aula montada nos fundos da Igreja Santa Luzia, na Estância, Zona Oeste do Recife, crianças e adolescentes aprendem muito mais que música. Descobrem, pouco a pouco, que qualquer que seja a história, ela nunca tem apenas uma versão. Foi assim que um dia meninos e meninas da Favela do Iraque, no mesmo bairro, perceberam que polícia não é sinônimo de violência, armas ou prisão. No imaginário infantil dos alunos, homens fardados também são capazes de fazer brotar emoção em meio a uma aula de música para iniciantes.
No começo eram 60 pessoas, com idades variando entre 7 e 16 anos. Restaram 54. Na insistência para dominar a flauta, eles já conseguem tocar afinado Asa Branca, de Luiz Gonzaga. E isso é só o começo. O projeto Polícia Militar de Pernambuco policiar, musicalizar e proporcionar expectativas nasceu no Morro do Bom Jesus, Caruaru, deu frutos e agora aportou no Iraque. O lugar que as crianças aprenderam a amar, mas onde faltam coleta de lixo e calçamento, começa a revelar talentos da música. As aulas começaram em 27 de setembro e acontecem nas segundas, quartas e sextas-feiras, nos horários da manhã e da tarde. Somente são possíveis porque músicos da Banda da PM aceitaram repassar de forma voluntária a arte que dominam para os meninos e meninas nos momentos em que estão de folga da corporação.
Uma outra participação essencial foi a do pessoal da Academia de Música de Pernambuco, que mantêm o espaço na igreja e cedeu parte dele para a iniciativa da PM. “Música mexe com a emoção e com a sensibilidade. Além disso, se não cursarem a faculdade um dia, poderão trabalhar com a música que aprenderam aqui”, elogia Valquíria de Alcântara, 46 anos, mãe de dois alunos da escola. O projeto foi idealizado pelo coronel Gilmar de Oliveira, coordenador de Polícia Militar Comunitária, que trabalhou como comandante de batalhão na região englobada pelo Iraque entre os anos de 2009 e 2010. “Imagine que cuidávamos de uma área formada por 54 comunidades distribuídas em 24 bairros. Prendi muita gente, principalmente com envolvimento em tráfico de drogas”, lembra o oficial. Ele conta que desde o início da iniciativa, não há registro de violência na área.
A diferença dessa ação para outras que também tentam levar cidadania às pessoas através da música é que as crianças não passam por uma seleção. “Não fazemos escolha entre os que estudam e os que não estudam. Qualquer um que esteja nessa idade pode participar. Na verdade, nossa intenção é atrair exatamente os que não mostram interesse pelos estudos para resgatá-los”, diz Gilmar.