Livros contra a violência

O Alto Santa Terezinha, na Zona Norte, será a primeira comunidade do Recife a receber uma biblioteca-parque, formato criado em cidades como Bogotá e Medellín, na Colômbia, que contribuiu no combate à criminalidade. A implantação, que acontecerá até o fim desse ano, foi um dos assuntos discutidos ontem no I Seminário Bibliotecas Vivas e Comunidades: Criando Espaços de Cidadania Ativa, realizado no Centro de Formação Paulo Freire, no bairro da Madalena.

Foto: Ana Claudia Dolores/DP/D.A Press
Bogotá investe no modelo desde 2006.  Foto: Ana Claudia Dolores/DP/D.A Press

A biblioteca funcionará no Centro Comunitário da Paz Governador Eduardo Campos (Compaz). A obra terá 13 mil metros quadrados e está orçada em R$ 1 milhão em recursos do Tesouro Municipal.

No primeiro semestre de 2016, o serviço passará a ser oferecido no Compaz Cordeiro, com investimento de R$ 5 milhões em uma área de 17 mil m2. “As bibliotecas dos Compaz terão videoteca, informática e outras atividades e as reformadas darão acessibilidade às pessoas”, ressaltou Murilo Cavalcanti, secretário de Segurança Pública do Recife.

Na Colômbia, a primeira biblioteca-parque foi inaugurada em 2006. “Através do modelo, as pessoas podem ler, dançar e participar de várias atividades”, comentou Eliana Maldonado, diretora da biblioteca San Javier, em Medellín. A unidade tem um público leitor de cerca de mil pessoas. O seminário também apresentou o modelo das Bibliotecas do Parque de Manguinhos, no Rio de Janeiro, e Villa-Lobos, em São Paulo.

Reformas
No Recife, as obras de recuperação e reforma das Bibliotecas Populares de Casa Amarela e Afogados tiveram início em março deste ano.

Sociólogo Hugo Acero segue dando dicas de segurança para o Recife

O ex-secretário de Segurança Cidadã de Bogotá, Hugo Acero, esteve no Recife, à convite da prefeitura, para debater experiências inovadoras de prevenção à violência urbana, no início deste mês. Acero comandou a pasta de segurança da capital colombiana por nove anos. Atualmente, ele trabalha prestando consultoria na área e já atuou em cidades como Medellín, na Colômbia, Cidade do México e Guaiaquil, no Equador.

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Hugo Acero tem vasta experiência em segurança pública. Foto: Ivanildo Francisco/PCR

Durante a passagem pelo Recife, Acero fez palestra para representantes da Prefeitura do Recife, governo do estado, polícias Civil e Militar, Guarda Municipal, Corpo de Bombeiros e outras instituições. O evento foi no auditório do Banco Central, em Santo Amaro, e contou ainda com a participação do sociólogo José Arlindo Soares.

Acero expôs o trabalho desenvolvido em Bogotá para reduzir os índices de violência, principalmente homicídios. Na década de 90, a cidade chegou a ter 80 casos para cada grupo de 100 mil habitantes. “Intervir em um local que sofre com a delinquência vai além do trabalho da polícia. É preciso que as prefeituras também participem desse processo e trabalhem em conjunto. o Recife está de parabéns por ter tomado essa iniciativa”, apontou o colombiano.

Cúpula da segurança de Pernambuco assistiu à palestra. Foto: Ivanildo Francisco/PCR
Cúpula da segurança de Pernambuco assistiu à palestra. Foto: Ivanildo Francisco/PCR

De acordo com o sociólogo, ações como recuperação de espaços públicos, instalação de bibliotecas e áreas de convivência tem influência direta na redução da criminalidade e na qualidade de vida da população. “A origem da violência não está na pobreza, mas na maneira como as pessoas se relacionam. Se melhorarmos a iluminação pública, as calçadas, as escolas, reduzimos os conflitos”, ensinou Acero.

Para o secretário de Segurança Urbana do Recife, Murilo Cavalcanti, a capital pernambucana caminha para realizar as mudanças que irão gerar essas transformações. “Já lançamos o Pacto Pela Vida do Recife, o programa Eu Amo Meu Bairro, estamos finalizando a instalação de 40 novas câmeras de videomonitoramento e estamos integrados com o Pacto Estadual para reduzir, cada vez mais, a violência na nossa cidade”, afirmou.

Agora nos resta torcer para que a receita de sucesso em Bogotá se repita na capital do frevo e que a população esteja disposta a ajudar nesse ponto.

Sociólogo Hugo Acero Velásquez fala sobre responsabilidades das prefeituras

Por Ana Cláudia Dolores

“Em relação à segurança, se o poder público quer obter resultados, precisa desenhar e executar uma política integral que vai da prevenção (mão amiga) ao uso legítimo da força (mão dura).” Não se pode falar no avanço que Bogotá apresentou na área de segurança pública sem citar o nome de Hugo Acero Velásquez. Atualmente trabalhando como consultor internacional de segurança cidadã, já ocupou cargos importantes na Colômbia, como a subsecretaria de segurança de Bogotá e a assessoria do Conselho de Paz da Presidência da República. Sociólogo e especializado em convivência cidadã, Hugo Acero conduziu a redução das taxas de homicídio na capital colombiana e acredita que só se combate a violência com prefeitos diretamente responsabilizados pela segurança em suas cidades.

Qual o papel que as prefeituras na Colômbia têm em relação à segurança pública?

Os prefeitos são os responsáveis legais pela segurança. Na Colômbia, entende-se que eles têm a maior probabilidade de obter êxito nessa matéria pelo fato de estarem mais perto dos problemas e das necessidades dos cidadãos e por conhecerem melhor seus municípios. Por outro lado, o crime comum e organizado manifesta-se nas ruas, nos espaços públicos das cidades, e é aí onde ele deve ser enfrentado com a participação dos prefeitos e de todas as autoridades de segurança e justiça nacionais e locais. Sem essa liderança, o trabalho em equipe das instituições responsáveis por esse assunto e um plano integral é muito difícil enfrentar os criminosos que estão organizados e, em muitos casos, trabalham em equipe.

É um recado para que o Brasil reveja a participação dos prefeitos no assunto da segurança?

O Brasil deve avançar e dar maiores responsabilidades aos prefeitos em matéria de segurança. Se não for dessa forma, será muito difícil enfrentar a violência e a delinquência.

Como funciona, na prática, a política da mão dura e da mão amiga empregada em Bogotá?

Em matéria de política de segurança cidadã, se o poder público quer obter resultados, precisa desenhar e executar uma política integral que vai da prevenção (mão amiga) ao uso legítimo da força na repressão do delito (mão dura). As políticas que se fundamentam somente em uma dessas duas ações fracassam ou não têm bons resultados.

Do Diario de Pernambuco

O modelo de segurança de Bogotá e Medellín e os reflexos no Recife

Por Ana Cláudia Dolores

O que uma rua iluminada, calçadas acessíveis, espaços de convivência, parques, centros de serviços para o cidadão, bibliotecas e transporte público de qualidade têm a ver com segurança pública? Em Bogotá e Medellín, a resposta é tudo. Maculadas pelo histórico de violência do país, reduto das Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) e do narcotraficante Pablo Escobar, morto em 1993, em Medellín, as cidades resolveram colocar um ponto final nessa trajetória e mostrar ao mundo que poderiam ser lugares bons para se viver. Para conseguir o feito, os prefeitos decidiram apenas assumir o papel deles: cuidar da cidade integralmente. Bogotá e Medellín não zeraram a conta da violência, mas podem se orgulhar por terem devolvido à população uma paz social e de espírito que não se podia ter quando os criminosos ditavam as regras do jogo.

Polícia está mais próxima da população. Foto: Divulgação
Polícia está mais próxima da população. Foto: Divulgação

No centro de Bogotá, uma intervenção emblemática aconteceu na região do antigo Cartucho, uma espécie de cracolândia onde se podia encontrar de drogas a matadores de aluguel. A prefeitura, que é responsável pela gestão da polícia, comprou a briga com os criminosos, retirou todos os casebres e transformou a área no Parque Tercer Milenio. Em San Javier, que já foi uma das favelas mais perigosas de Medellín, os resultados desse modelo de gerenciamento são reconhecidos pelos moradores. “Sem a reforma do espaço e a presença da polícia, não teria havido diminuição da violência”, admite o técnico de ar-condicionado Jhonny Benjumea, 22 anos. O local sofreu intervenções urbanísticas como um parque-biblioteca, teleféricos e escadas rolantes, mas ainda convive com conflitos internos. “É preciso reconhecer que o bairro está mais seguro, mas ainda temos fronteiras invisíveis”, confirma o professor de dança Andrés Posada, 17.

Nas duas cidades, a estratégia adotada foi a de cuidar da prevenção, mas sem deixar de lado a repressão. Em vez de ampliar o efetivo, os policiais tiveram aumento salarial e foram qualificados para serem parceiros do cidadão e agirem com dureza quando necessário. “É o que eles chamam de segurança cidadã, um conceito diferente que inclui o aparelho repressivo, com a polícia, o judiciário e a prisão, e o preventivo, com bairros de qualidade e centros de mediação de conflitos e acesso à Justiça. Se o prefeito tiver esse entendimento do espaço urbano, já estará contribuindo para a segurança”, analisa o secretário de Segurança Urbana do Recife, Murilo Cavalcanti, estudioso do modelo implantado em Bogotá e Medellín.

A prevenção, na visão dos colombianos, quer dizer não somente cuidar dos espaços públicos, mas aproximar o cidadão da Justiça e da polícia. A dona de casa Luzmary Echavarría, 38, era agredida fisicamente pelo companheiro e só criou coragem para denunciá-lo porque havia uma Casa da Justiça perto de sua residência, em Santo Domingo, Medellín. “Soube que poderia ter ajuda e procurei o serviço. Visitaram a minha casa e pediram para ele nos deixar em paz. Graças a Deus, ele foi embora. Hoje, sinto-me mais tranquila e segura com meus filhos”, comenta.

Já no Recife, a segurança foi, historicamente, tratada como um assunto apenas do estado, o que resultou numa geração de prefeitos omissos em relação ao assunto. Agora, a atual gestão está prometendo assumir sua parte na segurança da cidade a partir do trabalho a ser realizado pela recém-criada Secretaria de Segurança Urbana. Na pauta, a concepção de espaços de convivência cidadã nas áreas mais vulneráveis como arma contra a violência. Para Djanine Oliveira, 36, moradora dos Coelhos, um dos bairros mais perigosos do Recife, o raciocínio faz sentido. “Onde eu moro não tem nada para fazer. A gente vive com os pés na lama e dividindo a comida com os ratos. O que sobra para os jovens é a droga e a violência. Se pelo menos o lugar fosse melhor, acho que dava para pensar em ter um futuro”, acredita.

Do Diario de Pernambuco