Depois de obter um resultado positivo no mês de junho em relação ao número de Crimes Violentos Letais Intencionais (CVLIs), o governo do estado perdeu o controle da violência em julho. As estatísticas da Secretaria de Defesa Social (SDS) mostram que um total de 297 homicídios foram notificados no estado no último mês, 40 a mais que o mesmo mês do ano passado quando foram contabilizadas 257 mortes em Pernambuco. Os números não foram divulgados pelo governo do estado na tarde desta quarta-feira, mas o blog teve acesso com exclusividade ao resultado na noite dessa terça-feira.
Ainda de acordo com os dados da SDS, as Áreas Integradas de Segurança (AISs) – que incluem várias localidades – mais violentas em relação ao número de assassinatos foram as de Paulista (27), Caruaru (27), Garanhuns (26), Jaboatão dos Guararapes (24), Nazaré da Mata (21) e Cabo de Santo Agostinho (20). Os números vermelhos costumam deixar a cúpula de segurança em sinal de alerta, o que faz aumentar a cobrança em cima dos policiais militares e civis para obter melhores resultados. No entanto, as duas categorias andam par lá de insatisfeitas com o governo do estado. “Temos um dos piores salários do Brasil”, disse um policial civil que pediu reserva no nome.
Como não adianta chorar pelo leite derramado, o desafio agora será atingir a meta do Pacto pela Vida, que prega uma redução de 12% em relação ao número de mortes com o mesmo período do ano anterior, para o mês de agosto. Em 2014, 250 assassinatos foram registrados em Pernambuco em agosto. Isso significa dizer que para este mês, para atingir a meta, o estado não pode ter mais de 220 homicídios.
Desde o início de 2015, apenas em junho o governo do estado obteve êxito no cumprimento da meta do PPV. Em janeiro ocorreram 322 CVLIs, em fevereiro foram 324, no mês de março aconteceram 336 mortes, em abril foram computados 324 homicídios, já no mês de junho foram 264 CVLIs, 45 a menos que junho de 2014.
O massacre do Carandiru ainda paira como uma chaga que exerce repulsa e fascínio, mesmo 22 anos depois de ter acontecido. O dia 2 de outubro de 1992 se tornou um marco na segurança pública e no sistema prisional brasileiros ao levar 111 presos à morte e mostrar uma face do Brasil que poucos querem ver. A partir desse ponto de partida dramático por natureza, o jornalista e dramaturgo Dib Carneiro Neto resolveu adaptar o best-seller Estação Carandiru, de Drauzio Varella, e esse material foi escolhido pela recifense Cênicas Companhia de Repertório como matéria-prima do novo espetáculo, Salmo 91. A estreia é hoje, às 20h, na própria sede do grupo, o Espaço Cênicas.
O ponto de vista adotado para contar a vida no cárcere e as circunstâncias do massacre é o dos próprios presidiários, que afirmam a própria existência a partir de dez monólogos defendidos por cinco atores: Álcio Lins, Gustavo Patriota, Raul Elvis, Rogério Wanderley e Toni Rodrigues, também responsável pela direção. É a primeira vez na qual o Espaço Cênicas recebe uma temporada de espetáculos. A intenção foi transformar o local, que serve para ensaio e aulas de teatro, em um espaço intimista, no qual apenas 65 espectadores serão aceitos por sessão.
A seleção do texto, segundo Toni, veio de uma urgência em discutir questões atuais e fortes na sociedade brasileira. “Já tínhamos contato com o contexto do Salmo 91 a partir de um texto chamado Abre as asas sobre nós, de Sergio Roveri, que, por sua vez, já era a adaptação de um trecho do Estação Carandiru. Escolhemos esse tema – o sistema carcerário brasileiro – porque ele merece uma atenção especial. A peça não defende nada nem quer ser panfletária, mas dá voz aos prisioneiros. O sistema prisional continua falho, e esta é uma situação que pode acontecer hoje em dia. Lançar um olhar sobre toda essa violência talvez gere uma reflexão nas pessoas”.
O nome do espetáculo, Salmo 91, tem a ver com o desenrolar da narrativa. Na peça, Dadá, um sobrevivente do massacre, lembra da passagem da Bíblia que a mãe dele sempre o mandou ler, mas que nunca havia visto. É a partir dessas histórias individuais que ação e espaço se misturam. “A relação de proximidade que queremos estabelecer com o espectador potencializa o discurso. É como se o público entrasse dentro do próprio Carandiru e visse a intimidade das celas”.
Serviço
Salmo 91, da Cênicas Cia de Repertório
Quando: De hoje a 6 de setembro; sábados, às 20h e domingos, às 18h
Onde: Espaço Cênicas – Rua Marquês de Olinda, 2º andar (entrada pela Rua Vigário Tenório), Bairro do Recife
Ingresso: R$ 20 e R$ 10 (meia), com venda antecipada pelo site Eventick
Informações: 9609-3838
A fonte
O livro
Estação Carandiru ajudou a catapultar a reputação de Drauzio Varella. Ele descreve a rotina de dez anos, a partir de 1989, como médico voluntário da Casa de Detenção de São Paulo. A narrativa traz o testemunho do que viu e ouviu na prisão e inclui relato sobre o massacre de 1992. Teve quase 500 mil exemplares vendidos e ganhou o Prêmio Jabuti
de não-ficção.
O presídio
A Casa de Detenção, inaugurada em 1956, no bairro do Carandiru (SP), foi a maior do Brasil. Apresentava crônico problema de superlotação, chegando a ter três vezes mais presos do que a capacidade. O massacre teve como estopim uma rebelião entre presos, o que levou à invasão do presídio pela polícia. Foi desativada e parcialmente demolida em 2002.
Na arte
Cinema e teatro
O diretor Hector Babenco adaptou em filme (Carandiru, 2003) o livro Estação Carandiru. Atraiu mais de 3 milhões de espectadores. A vida na penitenciária foi tema de O prisioneiro da grade de ferro (Autorretratos, em 2003), de Paulo Sacramento, que deu câmeras a detentos do local para que eles mostrassem o próprio cotidiano. O Núcleo Panóptico de Teatro usou o local como palco para a peça Muros, adaptação de obra de Jean-Paul Sartre
Artes visuais e música
Em 2015, Maureen Bisillat abriu a mostra Sobrevivências, sobre vivências: Carandiru (SP), sobre o tema. O artista Nuno Ramos fez instalação na Bienal de São Paulo de 2012, O dia deles – 24 horas 111, repetição ininterrupta, por 24 horas, dos nomes dos 111 presos assassinados. A música Diário de um detento, dos Racionais MCs, narra o massacre. O grupo de rap 509-E alude a cela da cadeia.