“Foi como se eu tivesse sido enterrada viva.” O desabafo da comerciante Lúcia Silvania Bezerra, 38 anos, resume o período de um ano, um mês e 17 dias que ela ficou presa injustamente. Casos como o dela, infelizmente, são comuns no Judiciário. Pessoas com nomes iguais aos de criminosos procurados, erros em investigações policiais e até acusações falsas levam inocentes a viver um pesadelo atrás das grades.
Em Pernambuco, existem atualmente 31.350 presos, em 22 unidades prisionais e 58 cadeias públicas. Dentro desse universo, deve existir uma parcela de inocentes. Gente que jamais deveria ter sido presa. Pessoas que tiveram suas vidas destruídas. Outras que lutaram para provar inocência e esperam até hoje para receber indenizações por danos morais.
Segundo o Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE), 4,5 mil pessoas foram condenadas por tráfico de drogas de janeiro de 2014 até o dia 13 deste mês, apenas nas varas de 1º grau. Nesse mesmo período, houve 4,2 mil condenações por crimes do sistema nacional de armas, onde estão inclusos o porte e a posse ilegal de armas, disparo de arma de fogo, comércio ilegal e tráfico internacional de armas. Já pelo crime de roubo majorado, com uso de arma de fogo, foram condenadas 3,5 mil pessoas também do início de 2014 até o último dia 31.
Prisões injustas causam revolta não só em quem é acusado indevidamente, mas também nas pessoas que assistem às arbitrariedades. O enredo da minissérie Justiça, que está sendo exibida pela Rede Globo, mostra alguns exemplos disso. “Precisamos de um sistema de Justiça mais eficaz e de uma polícia investigativa mais técnica. A política do encarceramento pode trazer prejuízos e enganos. A prisão deixa as pessoas em situação de vulnerabilidade social. Nada e ninguém consegue apagar isso”, apontou Wilma Melo, do Serviço Ecumênico de Militância das Prisões (Sempri) e do Movimento de Segurança Humana e Carcerária.
Aos 27 anos, Lúcia Silvania Bezerra foi presa em casa, no dia 30 de agosto de 2005, sob a acusação de ter participado de um sequestro. Mesmo sem nunca ter mantido nenhum contato com os criminosos, foi indiciada pela Polícia Civil e levada para a Colônia Penal Feminina do Recife. Lúcia teve o telefone celular roubado num assalto a ônibus. Ela prestou queixa do roubo mas não conseguiu bloquear a linha telefônica, que passou a ser usada pelos sequestradores para acertar o pagamento do resgate da vítima.
“A prisão dela foi um grande erro. A própria polícia reconheceu o erro depois. Os verdadeiros criminosos utilizaram o número do telefone dela. Agora estamos na luta para que o Estado seja condenado e pague uma indenização por danos morais. Lúcia foi presa na frente do filho pequeno e dos vizinhos mesmo sendo inocente”, apontou o advogado Afonso Bragança.
Lúcia conta que foi levada para a delegacia sem ao menos saber porque estava sendo presa. Somente à noite, quando já estava no presídio, sua irmã lhe contou do que ela estava sendo acusada depois de ir ao Fórum de Jaboatão. “Foi um pesadelo esse tempo que fiquei na cadeia. Não existe coisa pior do que você ser presa e pagar por uma coisa que não fez. Eu dormia no chão e a comida servida na prisão era muito ruim. Quando consegui minha liberdade, depois que o erro foi esclarecido, foi uma alegria muito grande. A primeira coisa que eu fiz quando saí da prisão foi tomar um banho de mar. Fui para a Praia de Boa Viagem e entrei no mar à noite”, recordou Lúcia.
Para o diretor executivo do Instituto Sou da Paz, Ivan Marques, a implantação das audiências de custódia ajudou a diminuir o número de pessoas presas injustamente. “A Justiça Criminal precisa dar mais agilidade aos processos. O sistema prisional pode até ter falhas, mas não pode demorar tanto tempo para corrigi-las. As audiências de custódia são um caminho para evitar que pessoas inocentes sejam mandadas para a prisão. Casos de injustiça, além de causar danos às pessoas presas injustamente passam descrença à sociedade”, ressaltou Marques.
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